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Estado de Minas COLUNA DO JAECI

Os meus encontros com o imortal Rei Pelé

Edson Arantes do Nascimento nos deixou nesse dia 29 de dezembro de 2022, aos 82 anos, mas o Pelé é mesmo eterno e não nos deixará nunca


29/12/2022 18:00 - atualizado 29/12/2022 18:21

Pelé aos 51 anos, em abril de 1992
Pelé aos 51 anos, em abril de 1992 (foto: Maria R. BASTONE / AFP)
Quando criança eu imaginava que o Rei Pelé era eterno e não morreria nunca. E eu não estava enganado. Edson Arantes do Nascimento nos deixou nesse dia 29 de dezembro de 2022, aos 82 anos, mas o Pelé é mesmo eterno e não nos deixará nunca. Lembro-me da primeira vez que o vi, ao vivo. Foi num amistoso da Seleção Brasileira, na Gávea, não me lembro se em 1969 ou 1970, não importa. O que importa mesmo é que vi aquela "entidade", sua majestade, pela primeira vez. Foi uma excursão organizada pela Escola Floriano Peixoto, em São Cristóvão, onde estudei na minha infância. Com a bandeirinha do Brasil nas mãos, eu e meus colegas fomos ver de perto aquela seleção que se tornaria tricampeã do mundo. Lembro também na minha casa, na Copa de 1970, em uma televisão pequena em preto e branco, das jogadas, dos dribles, dos passes e dos gols de Pelé. Apaixonado pelo futebol, eu jogava bola na rua de parelelepípedo e a cada gol gritava o nome do Rei. Todo mundo queria ser o Pelé na nossa pelada.

O tempo passou, e eu escolhi fazer jornalismo na Universidade Gama Filho. Meu sonho era estar nas grandes coberturas, entrevistando os gênios da bola - e, é claro, entrevistar Pelé. Lembro-me também do "jogo das enchentes", no Maracanã, em 1979, com 150 mil pessoas. Era um clássico entre Flamengo e Atlético para arrecadar dinheiro para as vítimas das enchentes em Minas Gerais. E foi a primeira e única vez em que Pelé vestiu a camisa do rubro-negro, atuando ao lado de Zico. Eu, ainda estudante, me espremia na multidão para ver Pelé jogar. Sim, não o vi muito em campo, pois naquela época os jogos não eram transmitidos como acontece hoje. Ao vivo, foi a única vez.

Fui para a cobertura da minha primeira Copa do Mundo, nos Estados Unidos, em 1994. Minha missão no jogo de abertura do Brasil era esperar Pelé chegar. Ele era comentarista da TV Globo. Fiquei de plantão, esperando a limousine. Foram três angustiantes horas até que o carro branco encostou. Quando a porta se abriu, Pelé desceu. Corri até ele, e os seguranças nos cercaram. Amável, o Rei me abraçou, foi caminhando e eu fazendo as perguntas. Não me largou até chegarmos na cabine da Globo, onde estavam Galvão Bueno, Arnaldo Cézar Coelho e Ciro José. Somente ali, Pelé tirou a mão do meu ombro e eu fui para o centro de imprensa, todo feliz, escrever minha matéria. O Rei me tocou, me abraçou e ainda me deu uma entrevista. O sonho do garoto de São Cristóvão estava realizado.

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Rodando o mundo com a Seleção Brasileira, encontrei com Pelé em algumas situações. A mais marcante aconteceu no Kwait, se não me engano em 2005. Naquela época, além do nosso Estado de Minas, eu fazia a cobertura para a Jovem Pan de São Paulo. Quase morri quando vi que Pelé era meu vizinho de quarto. Abri a porta para pegar o corredor, e lá estava o Rei. Fui em sua direção e ele me deu um abraço. Meu amigo Galvão me convidou para jantar no restaurante do hotel. Assim que cheguei lá, estava Pelé, sentado ao lado dele. Sentei-me, cumprimentei o Rei, e começamos a jantar. De repente, uma fila de jovens se formou para pedir foto e autógrafo com Pelé. Humildemente, ele se levantou, e atendeu um a um, gastando uns 20 minutos. Sua comida esfriou, mas ele não se importou.

Na ida para o campo, no dia seguinte, peguei uma carona com ele, seu advogado e o assessor Pepe. Entramos no estádio, antes de o jogo começar, e Pelé me deu uma exclusiva para a Jovem Pan. Fiquei uns 10 minutos com ele no ar, e o Wanderley Nogueira, comandando lá do estúdio, em São Paulo. Falei com ele que precisava de uma entrevista exclusiva para o jornal Estado de Minas, pois ele era mineiro, de Três Corações, e há tempos não falava pra gente. O Rei me perguntou qual era o meu voo para Londres. Eu falei, e ele então disse: "É o mesmo que o meu. O Pepe vai te buscar na classe em que vocês está, e fazemos a entrevista no voo". Combinado.

Pelé estava na primeira classe e eu na classe executiva. Depois de duas horas da decolagem, Pepe e a aeromoça do Britsh vieram ao meu encontro, e a comissária disse: "Não é normal isso na Britsh, mas, em homenagem ao Pelé, o senhor pode vir para a primeira classe". Fiquei radiante. Cheguei, e Pelé me mandou sentar onde ele apoiava seu pé. Fiquei de frente para ele. Pediu para eu ouvir seu cd. Ouvi durante uns 10 minutos. Aí ele perguntou: gostou?". Claro que sim, respondi. Aí começamos a entrevista.

Lembro-me que o filho dele, Edinho, estava preso, e o que mais me marcou foi quando ele disse: "O Edinho está preso porque é filho do Pelé. Não há nenhuma prova contra ele. O único lugar do mundo em que entro e abrem a minha mala é no Brasil. Entro em qualquer lugar até sem passaporte". Pelé estava magoado pela prisão do filho. O título da matéria foi: "O Brasil não valoriza seus ídolos". Nos despedimos em Londres, pois eu seguiria para a Suécia, onde a Seleção faria outro amistoso. Pelé desceu com um casaco enorme, óculos e boné para não ser reconhecido naquele terminal lotado de gente em Heatrow.

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A última entrevista com ele foi ao lado do meu amigo e cinegrafista da Alterosa, Leandro Neves. Pelé iria ao Jockey Clube para o lançamento do projeto de Vanderlei Luxemburgo. Nos posicionamos na escada, enquanto a imprensa o aguardava lá dentro. Pelé chegou, e eu disse: "Pelé fale com a TV Alterosa". Pepe, seu assessor, então disse: "Ele vai falar em coletiva lá dentro". Aí eu falei: "Pelé, você me tirou da classe executiva, me pôs na primeira classe de um voo e não vai falar comigo aqui". Ele veio em nossa direção e nos concedeu a entrevista exclusiva, bem curta, mas o suficiente para ficarmos radiantes. Foi a última vez em que estive cara a cara com o Rei. Entrevistas marcantes com o maior de todos os tempos, o "Atleta do Século". Só posso agradecer a Deus por ter conhecido o Rei e por tê-lo entrevistado em situações que marcaram a minha vida e a minha carreira.

Pelé levou o Brasil aos quatro cantos do mundo, parou uma guerra no antigo Zaire, esteve com as maiores autoridades e personalidades. Reis e rainhas se curvaram ao Rei Pelé. Infelizmente, o estado de saúde dele já nos antecipava o pior. Eu estava deitado, descansando, quando meus filhos entraram no quarto e me falaram que o Rei tinha morrido. Comecei a chorar, compulsivamente. Pelé é nosso, é eterno, é imortal. Morreu o Édson Arantes do Nascimento, esse sim era mortal. O mundo está triste, mas Pelé escreveu uma linda história de vida, de amor, de fé, de religiosidade.

Só posso agradecer pelo encontros que tivemos. Eu, apenas um súdito, diante de sua Majestade. Obrigado Rei Pelé. Pelo carinho com que sempre me recebeu. Pela paciência e pela belíssima entrevista a bordo de um avião. O Brasil deveria ter uma estátua do Rei em todos os estados da federação. Prefiro continuar pensando, como eu pensava quando era criança: Pelé é eterno e nunca morrerá.

Para fechar, vou parafrasear o mestre Armando Nogueira, meu chefe na TV Globo no começo da minha carreira: "Se Pelé não tivesse nascido homem, teria nascido bola". Vá em paz, Rei! Que Deus conforte o coração de sua família e de todos nós, simples mortais. Obrigado por tudo!

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