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Aline Pellegrino na CBF: a notícia do ano para o futebol brasileiro

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Talvez nem todo mundo tenha se dado conta da importância do que aconteceu nesse 2 de setembro de 2020 para o futebol brasileiro. A data pode ser definida como um marco, aqueles com potencial para mudar o rumo de uma história.



Ao anunciar a ex-zagueira e ex-capitã da Seleção Brasileira Aline Pellegrino para o comando do futebol feminino do país – ela será a coordenadora de competições –, a CBF finalmente ouviu os anseios de quem acompanha a modalidade de perto. Além dela, chega Duda Luizelli, que estava no Internacional, para ser coordenadora de seleções.

No mesmo dia (e talvez não seja mera coincidência), a CBF anunciou a equiparação de diárias e premiações das seleções femininas e masculinas do Brasil. Um abismo se desfez com essa medida – extraoficialmente, dizem que isso representará um ganho de 70% nos recebimentos das meninas.

Foi um sopro de esperança de dias melhores – não apenas por ter entregue o comando nas mãos de mulheres, mas por ter entregue o comando a mulheres que entendem do riscado.

A questão vai muito além da representatividade, porém é essa representatividade o ponto de partida. Em junho do ano passado, esse assunto foi tratado em Tiro Livre assim que a Seleção Brasileira foi eliminada na Copa do Mundo da França.



Um dos questionamentos foi o fato de a comissão técnica e os cargos diretivos na Seleção serem ocupados, majoritariamente, por homens. Direta e indiretamente, isso ajudava a reafirmar o quão machista o esporte ainda é no Brasil.

Vieram as perguntas: “Quem são os homens escolhidos para estar lá? Não haveria mulheres qualificadas? Ou até mesmo homens, mas com maior identificação e folha de bons serviços prestados especificamente ao futebol feminino – e, por consequência, mais bem preparados para a função?”.

Na época, o futebol feminino da CBF era chefiado por Marco Aurélio Cunha. O treinador da equipe era o Vadão, que cairia dias depois. Uma das citadas na coluna como candidata para a gestão era Aline Pellegrino, que estava à frente do futebol feminino na Federação Paulista e já tinha uma trajetória consolidada na área.



Em agosto, começou um movimento de mudança com a chegada da técnica Pia Sundhage. A sueca foi contratada com a proposta de ajudar numa reestruturação da modalidade a partir da Seleção. Ela trazia prestígio e conhecimento.

Fiz uma matéria para o jornal Estado de Minas sobre o que Pia encontraria no país. E uma das entrevistadas foi justamente a Pellegrino. Conversamos por pouco mais de uma hora, e nem tudo entrou na reportagem por absoluta falta de espaço. Agora fui atrás daquela entrevista, para observar com outro olhar o que ela falou.

Pellegrino estava otimista e acreditava que os primeiros resultados seriam vistos em dois anos – certamente, não poderia imaginar que passaria a fazer parte da missão. A experiência de Pia no futebol feminino era um grande trunfo, mas a ex-jogadora fazia uma ressalva: era preciso ter paciência para colher os frutos.



“A gente precisa aproveitar muito tudo o que ela viveu, tudo o que sabe. Estou bem confiante, animada, mas é preciso ter paciência, dar crédito, é uma reestruturação. Não é começar do zero. Já sabemos que temos talentos, é trabalhar esses talentos melhor. Poderíamos estar mais evoluídos, mas já existe um caminho. O que temos é de dar uma condição melhor para o desenvolvimento do trabalho”, afirmou.

Aline defendia que era importante entender e respeitar as particularidades do futebol feminino no Brasil. Que a receita do sucesso dele poderia não estar na mesma fórmula adotada no masculino.

Em outras palavrras: comparar as duas realidades e se mirar apenas nisso poderia ser perda de tempo: “Temos de trilhar o nosso caminho, melhorar o que é importante para a gente. No feminino, por exemplo, é muito mais importante ter competições do que brigar para jogar no estádio principal do clube”.

Também falamos sobre a pouca presença feminina na Seleção e o que ela pensava sobre isso: “Acredito na competência. Não é porque é futebol feminino que só mulher que tem de trabalhar nele, da mesma forma que não é só porque é futebol masculino que deve haver só homem no meio. Gostaria de ver uma mulher dirigindo time masculino, por exemplo. A modalidade é uma só, futebol. O importante é todos estarem capacitados para desenvolvê-la”.



Por fim, perguntei a ela por onde passava a evolução do futebol feminino brasileiro. Aline foi enfática: “A maior diferença da última Copa do Mundo para as outras foi a grande mídia e os patrocinadores. Daí vem a massificação, todo o restante da cadeia vai se mobilizando, vai vendo a necessidade de se organizar melhor. As meninas veem o futebol feminino na TV, vão querer praticar, buscar escolinhas, que vão abrir mais espaço para as meninas, e assim vai. A gente entra num ciclo virtuoso”.

A esperança é de que esse ciclo esteja sendo encaminhado no Brasil. Essa confiança é compartilhada por Nina Abreu, que comanda o futebol feminino do Atlético, e Bárbara Fonseca, que chefia o departamento no Cruzeiro.

“O futebol feminino entrou em um caminho sem volta. Tenho boas expectativas pelo simples fato de termos uma mulher na gestão da categoria dentro da CBF. A nomeação é o exemplo prático que a entidade nos dá de que uma era de preconceitos ficou pra trás. Aline tem uma vasta experiência dentro da categoria, tanto em campo quanto na gestão. Uma unanimidade”, diz Nina.



“A Aline é o nome mais apropriado para assumir qualquer pasta na CBF. A ideia que tínhamos era de que ela fosse assumir a coordenação das seleções, mas o Rogério Caboclo (presidente) acabou criando uma nova, de desenvolvimento das competições nacionais, e o nome da mais alta competência é o dela. Tenho certeza absoluta que o futebol nacional vai ganhar muito e, como consequência, a Seleção acaba ficando mais forte porque tem em suas bases competições de um nível melhor. Eles estão entendendo o processo ideal para a evolução do futebol feminino. A escolha da Duda como coordenadora de seleções também foi muito acertada”, afirmou Bárbara.

Que os deuses do futebol digam amém!

audima