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Thiago Neves, Villa, Sampaoli e a falta de respeito no futebol

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Vice-líder do Campeonato Brasileiro, um time que cada vez mais cria identidade com seu torcedor, três semanas de um calendário menos apertado – com jogos só aos finais de semana. Tudo indicava que o Atlético iria entrar num período de calmaria. Ledo engano. Desde a segunda-feira que a coisa desandou de tal forma na Cidade do Galo (por responsabilidade do próprio clube, ressalte-se) que, à primeira vista, parece até complicado compreender.



O cenário autodestrutivo começou com a negociação quase fechada com o armador Thiago Neves, passou pela desistência na contratação do colombiano Sebastián Villa e culminou na notícia de que Sampaoli teria dado um ultimato aos dirigentes alvinegros por causa dos dois meses de salários atrasados.

Está equivocado quem pensa que uma coisa nada tem a ver com a outra. Tem muito sim, mas talvez não como muita gente esteja pensando.

Tudo isso converge para uma só palavra: respeito. Se ela fosse de fato exercida (dentro e fora de campo), muitos problemas seriam evitados. Respeito ao próximo, respeito à vida.

Meu amigo Cláudio Guimarães foi quem me trouxe essa reflexão, de como tem faltado respeito no futebol brasileiro de forma geral. Respeito ao torcedor, respeito à instituição, respeito às relações profissionais... Enfim, está tudo interligado.



Muito foi falado sobre o caso Thiago Neves. Além de toda a complexidade de se contratar um jogador que já se mostrou desrespeitoso com o Atlético enquanto rival e com clubes nos quais atuou, sem empatia até com as vítimas de Brumadinho, o armador ainda vem de uma temporada muito ruim técnica e fisicamente.

Quer dizer: não havia argumento que sustentasse a contratação sob nenhum ponto de vista.

A torcida fez barulho – mais motivada pelas provocações dele ao Galo do que por critérios técnicos, é verdade – e a diretoria recuou.

Poucas horas depois, o imbróglio em relação a Villa. O atacante colombiano está afastado do Boca Juniors, acusado de agredir a ex-namorada Daniela Cortés, segundo ela agressões físicas e psicológicas sofridas ao longo de dois anos. 






O caso ganhou maior repercussão após o que teria sido o último episódio de violência, documentado por fotos e laudo médico. Villa será julgado pela Justiça argentina. Ele tem contrato com o Boca até 2023 e cláusula de rescisão de US$ 30 milhões.

Mais uma vez, erro de avaliação do corpo técnico e diretivo do alvinegro, de sequer negociar com um atleta que não está afastado do Boca por um motivo qualquer.

Aqui vale uma reflexão também a torcedores que foram às redes sociais contemporizar: muitos que se indignaram com a possibilidade de vinda de Thiago Neves foram complacentes com a contratação de Villa.

Para desenhar a quem não entende o parâmetro, segue uma declaração do psicólogo Cláudio Paixão, que foi entrevistado pela equipe do Estado de Minas para um vídeo sobre a tentativa de volta ao futebol do goleiro Bruno – condenado pelo assassinato e ocultação do cadáver, em 2010, de Eliza Samudio, mãe de um de seus filhos. 



“Quando estou no lugar do atleta, do artista, que são lugares de espetáculo, a vida é colocada como modelo. Quando uma pessoa que cometeu um crime, de repente, é colocada no lugar de ídolo, você passa a ideia de que é possível conciliar. Não é ideia de redenção. Eu fiz algo extremamente grave, eu desrespeitei, eu violentei uma pessoa, e sou reconduzido ao lugar de fascínio, adoração, admiração, idolatria. É muito ruim porque vem o pacote inteiro, especialmente para quem começa a naturalizar a violência. Começa-se então a copiar um modelo masculino de desrespeitar a mulher.”


Detalhe: o Brasil é um dos países com mais alto índice de feminicídio, e estudos já mostraram que os números aumentaram durante a pandemia de COVID-19.

Nesse cenário bélico totalmente extemporâneo junta-se uma possível irritação de Sampaoli com salários atrasados no clube. Essa sim, compreensível. Justificável. Esperada até. Pois uma das condicionantes do treinador ao assumir qualquer clube é salários em dia, uma exigência que nem deveria ser necessária, por ser premissa de qualquer relação de trabalho.

O que nos devolve à seara do respeito.

No fim das contas, resta a constatação de que toda essa autofagia súbita no Atlético poderia ter sido evitada com um pouco de discernimento. Respeito. Mas aconteceu, e ficam as lições para todo mundo: do torcedor ao presidente, passando por treinador e diretoria.

audima