De tudo o que foi falado sobre o Cruzeiro, após a derrota por 2 a 1 para o Sampaio Corrêa, na noite dessa quinta-feira (8), no Mineirão, fica uma conclusão bem clara. Chegou a hora de a Raposa, como instituição e como time, tirar o verniz da realidade. Baixar a bola e entender o cenário sem filtros, sem terceirizar culpa e fingir que o monstro não é tão feio quanto parece. Ele é, sim senhor.
O Cruzeiro, clube, é grande. Já a equipe é como outra qualquer das que estão na Série B do Campeonato Brasileiro buscando seu lugar ao sol. Como já teve seu lugar muito VIP, de frente para o mar e cercado de benesses e admiradores, talvez o Cruzeiro não queira encarar a sua verdade mais cruel e absoluta.
Não dá mais para entrar em campo acreditando que camisa vai ganhar. Por sete vezes na Segunda Divisão, isso ficou provado. São sete derrotas em 14 partidas. Engana-se quem pensa que sete é conta só de mentiroso.
Sete derrotas que mostraram toda a fragilidade celeste enquanto equipe. Sem coesão, sem sintonia... E repleto de justificativas. Um dia, era por causa do cansaço. No outro, foi o calor. Certa feita, faltou experiência. O dedo sempre pronto a apontar algo externo.
E aí entra a necessidade urgente de um exercício de humildade. A começar pelos mais altos cargos no clube.
Se a campanha por si só não for suficiente para deixar claro quão vital é, a esta altura do campeonato (quando ainda é possível reverter a queda livre), esse choque de realidade, basta ver que a Raposa virou motivo de chacota do Íbis, aquele que se orgulha de ser conhecido como “pior time do mundo”.
O início, o meio e o fim dessa história ajudam bem a mostrar como é imprescindível tomar consciência que os troféus que enfeitam a galeria do clube, na sede, pouco resolvem neste momento.
O caso Íbis começou com um deboche do presidente celeste, Sérgio Santos Rodrigues. Em entrevista, ele afirmou que, apesar da grave crise financeira da Raposa, suas inspirações eram a gestão do Manchester City e do Liverpool. Não o Íbis.
“É crítica falar que a gente mira o Liverpool e o Manchester City. Pô! Vou mirar quem? O Íbis? É claro que eu miro o Manchester City e o Liverpool, é óbvio", disse o cartola cruzeirense.
Foi só a declaração ganhar as redes sociais para o clube pernambucano rebater prontamente: “Avisa pra ele que o nosso time tem menos derrotas que o Cruzeiro em 2020. Se quiser marcar um amistoso valendo o título de Pior Time do Mundo, só chamar”.
Depois do jogo contra o Sampaio Corrêa, o Íbis espezinhou mais um pouquinho: “Meu rival perdeu, foi?”.
Sérgio Santos Rodrigues, o Cruzeiro e seu torcedor poderiam passar sem essa. Ao presidente, fica uma dica. Não é hora de tirar onda com a cara de ninguém. É hora de reconhecer a gravidade da situação, recolher as armas e repensar a estratégia.
Hoje, a distância celeste para o Liverpool e o Manchester City é abissal. Não dá para fazer nenhum tipo de comparação. Nem tampouco menosprezar qualquer time que for. Nem o Íbis, presidente.
Ao torcedor que acha que o problema é só o técnico Ney Franco, as notícias não são muito boas. A complexidade é maior que isso. Quem volta a mira para um treinador que está no clube há seis partidas, não entendeu nada. É mais um a esconder o sol com a peneira.
Que o time está jogando mal não há dúvida, porém, a simples troca de comando agora não será a fórmula mágica para tudo se resolver. Foram do treinador, inclusive, as declarações mais realistas após o jogo contra o Sampaio Corrêa.
Numa serenidade própria de Ney Franco, ele não pôs pano quente em nada. Ouviu as críticas, concordou com algumas até. Revelou que será feito um trabalho psicológico com o grupo, para buscar um respaldo emocional que tem faltado em campo em momentos decisivos.
“Tanto no primeiro tempo como no segundo a gente fez um jogo terrível no Mineirão”, disse, sem meias palavras. “Particularmente, não acho que teve sequer lampejo. Conversamos com os atletas no vestiário. Não tem como justificar. A derrota, tudo bem, você pode perder um jogo dentro de casa, mas a gente não tem como explicar o jogo da forma que perdemos.”
É bem isso que o Cruzeiro precisa fazer. Parar de buscar argumentos vazios para justificar algo muitas vezes injustificável. Que a mea-culpa feita por Ney Franco se estenda a todos na Toca da Raposa. Nas palavras do treinador, é “bater no peito, ajustar, cobrar mais da gente, dos jogadores, para que não se repita uma atuação tão medíocre”.
Uma dose de autocrítica de vez em quando não é demais.