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Estado de Minas Coluna

Política de negação da COVID-19 começa a cobrar seu custo no Brasil

Pesquisas de popularidade do presidente Jair Bolsonaro reforçam o discurso negacionista oficial, que deverá pressionar as perdas da economia com a doença


15/10/2020 04:00 - atualizado 15/10/2020 07:23

Enquanto o presidente Jair Bolsonaro insiste na sua política de negacionismo em relação ao coronavírus, a conta que a pandemia cobra já chegou aos desempregados e às empresas(foto: Reprodução da internet)
Enquanto o presidente Jair Bolsonaro insiste na sua política de negacionismo em relação ao coronavírus, a conta que a pandemia cobra já chegou aos desempregados e às empresas (foto: Reprodução da internet)
Desculpe-me o trocadilho, mas tem tudo a ver com a velha frase dos bares norte-americanos que nas décadas de 1930 e 1940 ofereciam a refeição para quem pagasse a bebida. Ficou mundialmente famosa porque intitulou um dos livros do economista liberal Milton Friedman, guru do ministro da Economia, Paulo Guedes.

A lembrança não tem nenhuma relação direta com suas frases de efeito, até porque ele tem evitado declarações polêmicas, mas com o artigo publicado ontem pela economista Mônica de Bolle no jornal O Estado de S. Paulo, a propósito dos custos econômicos do negacionismo de Donald Trump em relação à pandemia. Os custos políticos podem inviabilizar sua reeleição.

Segundo os economistas norte-americanos David Cutler e Lady Summers, citados no artigo, a queda do PIB norte-americano deve chegar a US$ 16 trilhões até outubro do próximo ano. Ou seja, 90% do PIB, se a pandemia for controlada até lá.

Nos cálculos dos dois economistas, foram incluídos os indicadores econômicos, como o aumento dos pedidos de seguro desemprego, mas também estimativas relativas aos prejuízos causados pela liquidação de vidas humanas, ou seja, de força de trabalho geradora de riqueza.

O Brasil não tem indicadores que possibilitem esse tipo de cálculo, mas tem estatísticas que podem servir de referência para um razoável balanço de perdas e danos.

Pesquisadora do Peterson Institute for International Economics e professora da Sais/Johns Hopkins University,  Monica De Bolle destaca que o nosso Sistema Único de Saúde (SUS), que foi posto à prova pela pandemia, pode nos dar uma noção, por exemplo, de quanto será preciso investir na Saúde em razão das sequelas da COVID-19 nas pessoas que se recuperaram da doença.

Como a população está envelhecendo, a pandemia também agrava, por falta de tratamento,  as doenças associadas à idade — diabetes, câncer, cardiopatias —, que se somam àquelas que são consideradas endêmicas, como a tuberculose, a dengue, a hanseníase, a malária e a Aids, que já pressionavam o sistema de saúde.


Crediário


O número de casos graves com longas internações é sete vezes maior do que o de óbitos; 30% dos que sobreviveram apresentam sequelas. Projeta-se 350 mil pessoas nessa situação, a grande maioria dependente do SUS.

Com mais de 150 mil mortos, Monica de Bolle estima que o custo econômico da pandemia no Brasil, por baixo, pode chegar a R$ 9 bilhões, sem considerar as mortes prematuras, ou seja, dos jovens que não faziam parte da população de risco.

Coincidentemente, ontem, num evento da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), o presidente Jair Bolsonaro disse que a pandemia de COVID-19 no Brasil foi superestimada. Bolsonaro insiste que o vírus e o desemprego devem ser tratado de igual maneira, simultaneamente.

O Brasil é o 2º país do mundo com mais mortes por COVID-19. Só os Estados Unidos têm mais vítimas: 220.694. Até o final da tarde de ontem, eram 150.998 mortes de brasileiros por COVID-19.

Segundo o Ministério da Saúde, 5.113.628 pessoas foram infectadas pelo novo coronavírus no país, 10.220 a mais nas últimas 24 horas. O número de mortes, felizmente, está caindo, foram 309.

Aproximadamente 4,5 milhões de pessoas se recuperaram da doença até o momento. Outras 436 mil estão em acompanhamento. São 713 vítimas a cada milhão de habitantes, o que coloca o Brasil na 3ª posição de letalidade da pandemia no ranking mundial.

O Peru é o país onde a COVID-19 mais mata em relação ao número de habitantes (1.008 pessoas para cada milhão), o segundo é a Bélgica (880 pessoas).

As advertências de Mônica de Bolle são importantes porque as pesquisas de popularidade do presidente Jair Bolsonaro, com a recuperação de seu prestígio, reforçam o discurso negacionista oficial, robustecido pelo fato de que o pior já passou e a redução das taxas de contaminação permitem que a política de isolamento social seja flexibilizada, como está sendo, na maioria das cidades.

A conta do vírus chegou primeiro para os desempregados e trabalhadores “por conta própria”, que perderam sua fonte de renda e dependem do auxílio emergencial do governo. A ideia de uma recuperação econômica rápida, acalentada pelo ministro Paulo Guedes, porém, não tem sustentação técnica. A conta está chegando para os demais à prestação.
 

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