Autor da Proposta de Emenda à Constituição 005-a, de 2021, que trata da composição do Conselho Nacional do Ministério Público, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) atravessou a rua para escorregar numa casca de banana. O pior é que pode arrastar na queda o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apesar da zona de conforto em que se encontra nas pesquisas de opinião. Se tem uma coisa que ainda pode atrapalhar a volta do PT ao poder, na garupa de Lula, é a pauta ética, um cavalo encilhado para levar ao segundo turno um candidato de centro, uma vez que essa bandeira saiu das mãos do presidente Jair Bolsonaro e está ao léu.
O CNMP é o órgão responsável por julgar procuradores e promotores. Nos últimos anos, por causa da Operação Lava-Jato, foi cenário de embates entre os procuradores da força-tarefa de Curitiba e os “garantistas” do mundo jurídico, uma ampla frente de advogados, juristas, magistrados e até procuradores preocupados com os dribles a mais dos chamados “tenentes de toga”, na expressão do cientista político Luiz Werneck Vianna. Chefe da força-tarefa de Curitiba e líder lava-jatista, ao lado do então juiz federal Sérgio Moro, Deltan Dallagnol chegou a ser punido com pena de censura por ter feito um post dizendo, antes das eleições para a presidência do Senado em 2019, que, se Renan Calheiros vencesse a disputa, dificilmente o Brasil veria a aprovação de uma reforma contra a corrupção.
"Muitos senadores podem votar nele escondido, mas não tem (sic) coragem de votar na luz do dia", afirmou, no auge do apoio popular à Lava-Jato. Deltan também foi condenado a indenizar o senador alagoano, que hoje é o relator da CPI da Saúde, em R$ 40 mil. Antes disso, já havia sido punido com uma advertência por ter criticado ministros do Supremo Tribunal Federal. Entretanto, o processo administrativo disciplinar de Deltan, pelo controverso PowerPoint de apresentação de denúncia que colocava o ex-presidente Lula no centro de uma organização criminosa, foi adiado 42 vezes antes de ser julgado e acabou prescrevendo.
A proposta aprovada pela comissão especial da Câmara propõe a redistribuição de vagas do CNMP. A Câmara e o Senado passarão a indicar quatro conselheiros, sendo um deles o vice-presidente e outro, o corregedor. Outro ponto polêmico do texto permite que membros do CNMP revisem atos funcionais de procuradores e promotores. Hoje, os membros do MP podem ser punidos pelo órgão, mas seus atos só podem ser modificados por decisão judicial. Na composição atual, o MP tem 8 de 14 membros na corte — três membros do Ministério Público dos Estados, quatro do Ministério Público da União, e o procurador-geral da República, que preside o Conselho.
Pacto perverso
O projeto pôs em pé de guerra os “tenentes de toga”. Na sexta-feira, oito subprocuradores gerais da República divulgaram manifesto contra a PEC, caracterizada como um “sombrio instrumento de opressão e intimidação de seus membros”. Ontem, foram realizadas manifestações em todo o país. Mais de 3.000 integrantes do Ministério Público assinaram documento que pede a rejeição integral da Emenda à Constituição.
“A proposta de assento aos próprios ministros dos tribunais superiores no Conselho Nacional do Ministério Público desvirtua as funções dos ministros de tais tribunais, pois a ele s confere 'superpoderes' (de atuação natural jurisdicional nas cortes em que atuam, de conselheiros no CNJ e também no CNMP, em evidente desequilíbrio do sistema de justiça, com violação do sistema de freios e contrapesos (checks and balances) previsto pelo Poder Originário Constituinte”, afirmam.
“A proposta de assento aos próprios ministros dos tribunais superiores no Conselho Nacional do Ministério Público desvirtua as funções dos ministros de tais tribunais, pois a ele s confere 'superpoderes' (de atuação natural jurisdicional nas cortes em que atuam, de conselheiros no CNJ e também no CNMP, em evidente desequilíbrio do sistema de justiça, com violação do sistema de freios e contrapesos (checks and balances) previsto pelo Poder Originário Constituinte”, afirmam.
Reduzir o poder dos procuradores e contingenciar a autonomia do Ministério Público é um sonho de consumo dos políticos enrolados na Justiça. Está em linha com as recentes mudanças na legislação sobre improbidade administrativa, patrocinada pelo Centrão, sob a liderança do presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL). Sua aliança com o PT na agenda contra a Lava-Jato foi uma jogada de mestre. Eleitoralmente, porém, com o perdão do trocadilho, esse pacto perverso pode ser uma roubada.