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Estado de Minas ENTRE LINHAS

Cargo de vice-presidente da República requer confiança e cálculo político

Escolha é decisão estratégica. Lula prefere ex-adversário liberal e conciliador, Bolsonaro quer trocar um general por outro


22/03/2022 04:00 - atualizado 22/03/2022 07:14

Bolsonaro e Braga Netto
Bolsonaro quer trocar Hamilton Mourão por Braga Netto na sua nova chapa presidencial (foto: ALAN SANTOS/PR)
A montagem de chapas presidenciais no Brasil republicano é uma engenharia que mira dois cenários: o das eleições, na qual o companheiro de chapa pode atrair ou tirar votos; e o da governabilidade, por causa do histórico de presidentes destituídos. A lista de vice-presidentes que assumiram o poder é grande. Começou logo após a proclamação da República (1889), com Floriano Peixoto, um marechal, eleito em 25 de fevereiro de 1891, pelo Congresso Constituinte.

Em 3 de novembro de 1891, o marechal Deodoro da Fonseca, presidente da República, dissolveu o Congresso. Como resposta, houve a chamada Revolta da Armada, sob comando do almirante Custódio de Melo, que ameaçou bombardear o Rio de Janeiro, caso Deodoro não renunciasse. Em 23 de novembro, Deodoro renunciou e Floriano assumiu o posto.

Nilo Peçanha foi o segundo a assumir. Fora eleito vice em 1º de março de 1906, na chapa de Afonso Pena, que faleceu em 14 de junho de 1909, cerca de um ano e meio antes de seu mandato terminar, em consequência de uma pneumonia. Vice no segundo mandato de Rodrigues Alves, Delfim Moreira assumiu o poder interinamente em 1º de março de 1918, porque o presidente da República, com febre amarela, estava incapacitado. Com a morte de Rodrigues Alves, em 16 de janeiro de 1919, nova eleição foi realizada, porque não havia completado dois anos de mandato.

Café Filho assumiu a Presidência após o suicídio de Getúlio Vargas, em 24 de agosto de 1954. Sua presença na chapa fora indicação de Adhemar de Barros, líder do PSP (Partido Social Progressista). Vargas nunca confiou no seu vice, que conspirava para derrubá-lo. Em junho de 1954, um pedido de impeachment contra Vargas, da União Democrática Nacional (UDN), fora derrotado no Congresso. Entretanto, em 5 de agosto, o seu principal adversário, Carlos Lacerda, sofreu um atentado a tiros na rua Tonelero, no Rio de Janeiro, cujo autor, Alcino João do Nascimento.

O pistoleiro fora contratado por Climério Euribes de Almeida, membro da guarda pessoal de Vargas, que era chefiada por Gregório Fortunato, o “Anjo Negro”, guarda-costas de Vargas. Lacerda foi ferido no pé, mas seu amigo Rubens Florentino Vaz, major da Força Aérea Brasileira, morreu no atentado. A crise ganhou proporções inimagináveis. Café Filho sugeriu a Vargas a renúncia de ambos, mas Vargas, orientado por Tancredo Neves, rejeitou o proposto. Entretanto, acuado, o presidente matou-se no Palácio do Catete, em 24 de agosto de 1954. Café Filho completou o seu mandato.

Golpe militar

João Goulart, o Jango, foi vice-presidente duas vezes, a primeira na eleição de Juscelino Kubitschek, em 1955, e a segunda na eleição de Jânio Quadros, em 1960. Controverso, capaz de proibir o uso de biquínis e condecorar o guerrilheiro argentino Ernesto “Che” Guevara, um dos líderes da Revolução Cubana, Jânio fora acusado por Carlos Lacerda, seu ex-aliado, de tramar um golpe de Estado. Em resposta, renunciou à Presidência em 25 de agosto de 1961. Jango estava na China e quase foi impedido por ministros militares de assumir o poder. Teve que aceitar o parlamentarismo para tomar posse, tendo como primeiro-ministro Tancredo Neves. Foi deposto em 31 de março de 1964. Uma das causas foi a volta do presidencialismo, aprovado em plebiscito, em 1963. Generais se revezam na Presidência por 20 anos.

José Sarney assumiu o poder como vice de Tancredo Neves, que morreu antes de tomar posse, vítima de um leiomioma abdominal benigno. Tancredo não quis se submeter a tratamento antes de assumir, mas foi internado em 14 de março, um dia antes da posse. Submetido a uma cirurgia, faleceu em 21 do mês seguinte. Sarney cumpriu todo o mandato. Itamar Franco, eleito em 1989, na chapa de Fernando Collor de Mello, também assumiu a Presidência. Com três anos de governo, Collor sofreu um processo de impeachment. Em 29 de dezembro de 1992, renunciou ao cargo e Itamar Franco foi imediatamente empossado.

Michel Temer foi eleito vice-presidente por duas vezes, em 2010 e em 2014, na chapa da petista Dilma Rousseff, que teve um processo de impeachment aberto contra ela em 2016, acusada de crime de responsabilidade, no caso, as chamadas “pedaladas fiscais”. Seu julgamento ocorreu em 31 de agosto de 2016. Dilma foi destituída do cargo, mas continuou com seus direitos políticos. Temer tomou posse no mesmo dia 31 e completou o mandato.

Como vimos, a escolha do vice é uma decisão estratégica. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por exemplo, anunciou que seu vice será o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin, que foi seu adversário no primeiro e segundo turnos das eleições de 2006. É um político democrata e conciliador, que amplia em direção aos setores empresariais e conservadores. Já o presidente Jair Bolsonaro tem a intenção de trocar o general Hamilton Mourão por outro quatro estrelas, o ministro da Defesa, Braga Netto, mais afinado com suas ideias sobre a democracia, as urnas eletrônicas e o Supremo Tribunal Federal (STF), mirando setores militares e de extrema-direita. São perfis radicalmente opostos.



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