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Estado de Minas Entre linhas

Vandalismo isola extrema direita, mas sociedade segue polarizada

Òrfãos da terceira via já estão em busca de um candidato para chamar de seu, mas não combinaram com Bolsonaro


17/01/2023 04:00

Por razões culturais e até antropológicas, a liderança carismática e reacionária de Bolsonaro continua enraizada
Por razões culturais e até antropológicas, a liderança carismática e reacionária de Bolsonaro continua enraizada (foto: EVARISTO SÁ/AFP)

Os atos de vandalismo ocorridos em 8 de janeiro isolaram a extrema-direita, porém a sociedade continua polarizada. A pronta resposta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva contra os sediciosos e a dura reação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes contiveram a escalada golpista. A pesquisa divulgada ontem pelo Ipec mostra que 54% dos brasileiros confiam no presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), porém 41% disseram que não confiam e 4% não responderam ou não opinaram.

A maior parte dos que confiam no presidente são homens (59%), com mais de 60 anos (63%), que possuem escolaridade até o ensino fundamental (65%) e que moram na Região Nordeste (77%). O índice dos que não confiam é maior entre as mulheres (45%). Elas são jovens de 25 a 34 anos (46%), com ensino superior (49%) e moradoras da Região Sul (53%). O dado mais positivo foi o fato de que 55% dos entrevistados acreditam que o governo Lula será bom ou ótimo. Já para 21%, será ruim ou péssimo. Os que consideram que a gestão será regular são 18%. Essa expectativa não pode ser frustrada.

Será um erro confundir o isolamento da extrema-direita com o de Bolsonaro. Nas redes sociais, permanece o dispositivo montado para manipular a opinião pública e coordenar as ações bolsonaristas, apesar de todas as medidas tomadas até agora contra os propagadores de fake news e financiadores do que houve no domingo. As narrativas construídas nas redes bolsonaristas atribuem a depredação do Palácio do Planalto, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF) à ação de provocadores, desvinculando-as de Bolsonaro, que foi para Miami exatamente para que isso fosse possível. Insistem na tese da fraude eleitoral.

Entretanto, o presidente Lula saiu fortalecido, as instituições também. Duas variáveis foram decisivas para demover o ex-presidente Jair Bolsonaro de assinar o tal decreto de “estado de emergência” contra o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A primeira, foi a ostensiva atuação dos presidentes dos Estados Unidos, Joe Biden, e da França, Emmanuel Macron, contra qualquer tentativa de golpe. Os militares brasileiros são sensíveis a esse posicionamento, porque são estudiosos da geopolítica e sabem que o governo Bolsonaro se tornara uma ameaça para o mundo, por causa da questão do desmatamento da Amazônia e da aproximação de Bolsonaro com o presidente da Rússia, Vladimir Putin. A segunda, a união dos três Poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – em repúdio ao vandalismo e defesa da democracia.

Do ponto de vista da sua legitimidade, o governo Lula está blindado. Entretanto, a governança e a governabilidade são ainda um dever de casa. A primeira depende da competência dos ministros, de suas iniciativas num cenário de escassez de recursos, que exige criatividade e ações de alto impacto e baixo custo. Os titulares das diferentes pastas, principalmente as recém-criadas, ainda estão arrumando as gavetas; aguardam a demissão dos integrantes das equipes de Bolsonaro, inclusive de 8 mil militares em cargos comissionados, prevista para 24 de janeiro próximo.

Terceira via


É aí que a questão da governabilidade passará pelo primeiro teste, porque uma parte desse pessoal é ligada aos generais que garantiram a posse de Lula, outra, aos partidos que estiveram com Bolsonaro e agora se dispõem a dar sustentação a Lula no Congresso. A reeleição dos atuais presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), são favas contadas, mas o sistema de alianças que se estabelecerá como hegemônico nas duas Casas tende a ser mais conservador. Pelo andar da carruagem, Pacheco será um aliado de Lula; Lira, um adversário ladino e perigoso. O prestígio de Lula na opinião pública terá um peso igual ou superior à capacidade de cooptação da administração federal, que como se sabe é muito grande.

Não se deve invocar o nome do povo em vão. A pesquisa Ipec mostrou que a desconfiança em relação ao governo Lula está na faixa de 41% dos eleitores. Bolsonaro teve 49,1% dos votos no segundo turno. Lula venceu com 50,9%, uma margem muito estreita.  Esses números mostram a resiliência dos opositores de Lula e são uma tentação para os que acham, equivocadamente, que Bolsonaro é um cachorro morto.

Por exemplo, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, que assume o comando do PSDB com o firme propósito de ampliar a federação com o Cidadania em direção ao eleitorado bolsonarista. O novo parceiro seria o Podemos, que se incorporou ao PSC. Isso lhe garantiria uma bancada de 40 deputados na Câmara, que poderia dar muito trabalho ao governo Lula e garantir sustentação à sua candidatura.

O projeto de Leite é açodado, mas vai ao encontro de setores da opinião pública, agentes econômicos e líderes políticos frustrados pelo fato de que Marina Silva (Rede), ministra do Meio Ambiente, Geraldo Alckmin, vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, e Simone Tebet (MDB), ministra do Planejamento, estão no governo e dão a ele um caráter de ampla coalizão democrática. Os órfãos da terceira via estão em busca de um candidato para chamar de seu. Não combinaram com Bolsonaro, cuja resiliência eleitoral é maior do que alguns imaginam. Por razões culturais e até antropológicas, sua liderança carismática e reacionária continua enraizada.
 

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