A desconstrução em curso da Operação Lava-Jato é o principal trunfo do procurador-geral da República, Augusto Aras, para permanecer no cargo. Embora essa possibilidade seja remota, o ajuste de contas com a força-tarefa da Lava-Jato é música para os ouvidos do presidente Luiz Inácio da Silva e o Senado, responsáveis pela escolha do chefe da Procuradoria-Geral da República (PGR). Uma conjugação de astros opera contra os principais responsáveis pela sua condenação, que foi anulada pelo STF, o então procurador-chefe da força-tarefa, o ex-deputado Deltan Dellagnol (Republicanos-PR), cujo mandato foi cassado pela Mesa da Câmara, e o senador e ex-juiz Sergio Moro (União Brasil-PR), à época o titular da 8ª Vara Criminal de Curitiba, que agora também está ameaçado de cassação no Senado.
Leia Mais
Condenação de procuradores da Lava-Jato pelo TCU pode virar bumerangueEnvolvimento do ex-presidente Lula na Operação Lava-Jato virou calúniaPresidente Bolsonaro explica por que acabou a Operação Lava-JatoOrçamento de 2024 traduz conflito distributivo no governo LulaMarco temporal é a ''lei do arame farpado'' nas terras indígenasFrança na OTCA consolidará internacionalização da AmazôniaO principal caso investigado é a proposta de criação de uma fundação para gerenciar os recursos provenientes dos acordos com as empresas envolvidas no escândalo, proposta que naufragou porque não teve apoio do Supremo. O acordo com a Petrobras previa que R$ 2,5 bilhões seriam depositados em conta vinculada à 13ª Vara Federal de Curitiba, destinados ao empreendimento. Uma das cláusulas previa o fornecimento de informações ao governo dos Estados Unidos sobre os negócios da Petrobras, para que o dinheiro viesse para o fundo.
A
própria Procuradoria-Geral da República recorreu ao Supremo Tribunal Federal pedindo que fosse declarada a nulidade do acordo; no mesmo dia, o MPF anunciou a suspensão da criação do fundo. A proposta era de que fundo fosse criado com US$ 75 mil e gerenciado por um consórcio entre a Transparência Internacional e a Fundação Getulio Vargas, cujos principais dirigentes à época eram Bruno Brandão e Joaquim Falcão, respectivamente, que participaram da elaboração do projeto.
A fundação da Lava-Jato seria criada com um caixa bilionário: R$ 2,5 bilhões da Petrobras, R$ 2,3 bilhões oriundos do acordo de leniência do grupo J&F e R$ 1,4 bilhão do acordo de leniência com a Camargo Corrêa. R$ 625 milhões da multa deveriam ser pagos à Força-Tarefa. O plano ruiu porque, em 2019, a Advocacia-Geral da União (AGU) e a Controladoria-Geral da União (CGU) detonaram o projeto. Ocorre que antes disso, Moro havia determinado o depósito em conta da 13ª Vara Criminal Federal de US$ 100 milhões do ex-presidente da Sete Brasil Pedro Barusco e outros recursos de alguns acordos de leniência.
Correições
Segundo a AGU e a CGU, Moro não poderia homologar acordos de leniência nem contratos com órgãos dos Estados Unidos e da Suíça, à revelia do Ministério da Justiça, do Itamaraty e o governo brasileiro. Num dos acordos, previa-se que dos R$ 3,1 bilhões do acordo da Braskem, R$ 2,3 bilhões iriam para o MPF; R$ 310 milhões, para o Departamento de Justiça americano; R$ 212 milhões, para a CVM dos EUA; e mais R$ 310 milhões, para a Procuradoria-Geral da Suíça. O acordo com a Odebrecht previa que, dos R$ 3,8 bilhões que seriam pagos na leniência, 82,1% iriam para o MPF; 10%, para as autoridades suíças; e 7,9%, para o Departamento de Justiça dos EUA. Cerca de R$ 10 milhões foram destinados à vara do juiz federal Marcelo Bretas, do Rio de Janeiro, afastado do cargo pelo CNJ.
Correições existem para identificar e corrigir erros, eventuais excessos e abusos cometidos por magistrados. No caso do CNJ, o corregedor Luís Felipe Salomão conta com o auxílio de um desembargador e dois juízes, para checar todas as fases e informações dos processos. Uma das primeiras medidas tomadas, no final de maio, foi afastar o juiz Eduardo Appio do comando da 13ª Vara Federal, em Curitiba.
O advogado João Eduardo Malucelli, filho do desembargador Marcelo Malucelli, da 8ª Turma, recebeu uma ligação telefônica suspeita. Perícia da Polícia Federal afirmou que a voz do interlocutor poderia ser do próprio Eduardo Appio. O juiz recorreu ao CNJ para voltar ao cargo, mas o ministro Salomão decidiu mantê-lo afastado da 13ª Vara Federal de Curitiba, até que seja concluída a investigação sobre supostas ameaças ao filho do desembargador Marcelo Malucelli, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).
A 13ª Vara também já foi comandada pelo juiz Luiz Bonat e pela juíza substituta Gabriela Hardt. No TRF-4, entre os gabinetes a serem auditados, está o do desembargador Malucelli, cujo filho é sócio no escritório de advocacia do senador Moro e da mulher dele, a deputada federal Rosângela Moro, ambos do União Brasil, Malucelli declarou-se suspeito para julgar o caso.