Jair Bolsonaro continua atacando as instituições. É um adversário – quase um inimigo – da Constituição de 1988. Faz questão de demonstrar desprezo pelos poderes Legislativo e Judiciário. Sonha com o poder absoluto. Transformou a Presidência da República em uma fonte inesgotável de sandices. O Brasil virou motivo de chacota mundial. E nada indica que isso vá terminar. Pelo contrário, a cada semana foi aumentando o tom e o número de declarações infelizes que irão criar sérios problemas comerciais, diplomáticos e políticos ao nosso país.
É inexplicável o ataque ao virtual presidente argentino Alberto Fernández. A Argentina é o nosso terceiro parceiro comercial. É uma nação amiga. E conosco foi a propulsora do Mercosul. Bolsonaro resolveu se transformar no grande eleitor das primárias argentinas. Foi derrotado, óbvio. Sua impopularidade no país platino é de conhecimento geral. Acabou prejudicando a tentativa de reeleição de Maurício Macri. A cada declaração desqualificando o candidato peronista, Fernández ganhava pontos nas pesquisas. E será eleito em 27 de outubro, no primeiro turno, com uma votação próxima a 60% dos votos. Chamou o virtual presidente de bandido, disse que a Argentina vai virar uma Venezuela, que os argentinos vão emigrar como os venezuelanos, que o Rio Grande do Sul vai se transformar em Roraima, que haverá saques em grande escala nos bancos e que o caos político vai tomar conta da Argentina. Tudo isso caminha para, no mínimo, um esfriamento nas relações diplomáticas e políticas e com sérias consequências econômicas. Vale lembrar que, no momento, a presidência rotativa do Mercosul é exercida pelo Brasil. Haverá clima para que Fernández participe sequer de uma reunião? Bolsonaro irá à posse do novo presidente, em dezembro? E os setores da nossa economia que comerciam ativamente com a Argentina, como ficarão? E o Mercosul, qual será o seu destino?
Não satisfeito, resolveu investir contra as duas principais economias da Europa, a Alemanha e a França. A primeira, em especial, virou alvo constante. Aproveitou também para desqualificar a Noruega e a política de defesa do meio ambiente. Chegou, ingenuamente, a postar um vídeo sobre pesca da baleia atribuindo a ação aos noruegueses, quando o fato ocorreu na Dinamarca. Dificilmente o acordo Mercosul-União Europeia será aprovado. Vale recordar que será necessária a chancela pelo Parlamento Europeu e por 27 Parlamentos nacionais. E uma provável negativa deverá ser creditada a Bolsonaro e seus ataques irresponsáveis – sem provas, registre-se – aos dirigentes europeus. Ainda no campo do meio ambiente, são constantes suas críticas às ONGs sem qualquer respaldo científico. Chegou, inclusive, a exumar um vídeo do patético Dr. Enéas tratando da Amazônia, dando estatuto científico a um falastrão. Ao mesmo tempo, humilhou o responsável pelo INPE, entidade respeitada no mundo científico internacional.
O Itamaraty virou um mero puxadinho do Departamento de Estado americano. Suas diretrizes são provenientes de Washington. Internamente, a Casa de Rio Branco vive uma grave crise hierárquica. Os mais antigos diplomatas são chefiados por colegas mais jovens, incompetentes e a serviço – mesmo sem saber? – de uma potência estrangeira. É inaceitável o que lá está ocorrendo. Está sendo colocada em risco a nossa soberania, a nossa segurança nacional. O Brasil, em órgãos internacionais, está votando juntamente com os países muçulmanos quando o assunto é direitos humanos. E a tendência é cada vez mais ser subserviente aos interesses norte-americanos e sinalizar simpatia à extrema-direita europeia, aos movimentos neofascistas da França, Itália, Polônia e Hungria, violando os princípios da nossa Constituição (vide artigo 4º).
Enquanto isso, o Brasil passa por uma grave crise econômica. E o cenário internacional emite sinais preocupantes. Manter (e até ampliar) nossas exportações é uma tarefa fundamental. Contudo, Bolsonaro não se preocupa com os milhões de desempregados. Para ele é essencial o foco na cruzada reacionária que assumiu como sua. Poderemos perder mercados importantes e com tenebrosos efeitos internos.
Caminhamos para uma crise política e econômica de grandes proporções. Nos próximos meses Bolsonaro vai aprofundar o processo de privatização das empresas e bancos estatais. Deverá contar com o apoio oportunista do grande capital, sequioso com os ganhos que poderá obter. Continuará fechando os olhos para o desastre representado por uma política externa antinacional, entreguista. E uma possível turbulência social está à vista.
A sorte de Bolsonaro é que não há oposição. A elite política democrática assiste a tudo passivamente. Não consegue construir ao menos ideias – já que não podemos chamar de projetos nacionais – que possam servir como referências para um amplo acordo político. O tempo passa, diria o narrador esportivo. E quem perde é o Brasil.
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