Além do bem que a produção mais limpa vai fazer sobretudo às futuras gerações, o programa cria um mercado inédito no Brasil dos certificados de gás carbônico retirado da natureza, os CBIOs, unidades de crédito de descarbonização. Emitidos pelos produtores de biocombustíveis – etanol, biogás, biometano, bioquerosene e biodiesel, entre outros – esses certificados devem se transformar em moeda muito bem-vinda ao estado e ao Brasil, e que vai ditar o ritmo de cumprimento das metas de mitigação das emissões de gás carbônico. As distribuidoras de combustíveis ficarão obrigadas a comprar os CBIOs.
Como segundo mercado consumidor de etanol no Brasil, e dono do terceiro lugar no ranking nacional da produção, o estado deve ser protagonista no mercado dos CBIOs, na avaliação de Mário Campos, presidente-executivo da Associação da Indústria Sucroenergética de Minas (Siamig). “Temos produção em crescimento e com duas usinas para entrar em operação no ano que vem. É um desempenho considerável”, diz à coluna. Uma usina-padrão vende açúcar, etanol e bioeletricidade. Os CBIOs serão mais um produto para gerar receita e competição por processos cada vez mais limpos.
O balanço da produção de etanol em Minas, nesta safra, passa de 3,3 bilhões de litros, aumento de 4,4% frente a 2018. Os números são resultado de safra também recorde de cana-de-açúcar em Minas, uma safra mais alcooleira, tendo em vista que 62% dela tiveram o etanol como objetivo. “O Renovabio abre a possibilidade para as usinas saírem da commodity para um mercado diferenciado, que passará a mostrar os atributos desse combustível”, diz Mário Campos.
Outro ganho especialmente importante em Minas, devido à produção expressiva de combustíveis renováveis, será o crescimento da participação deles na matriz de transporte, deslocando os combustíveis fósseis. A competição entre as usinas, à qual se refere o presidente-executivo da Siamig, será resultado de uma esperada corrida pela emissão dos CBIOs.
Voluntário para a indústria sucroenergética, o Renovabio começa a sair do papel a partir de um processo de certificação das usinas para que elas possam emitir os certificados. Cada empresa receberá uma nota, considerando-se a capacidade dela de reduzir a emissão de gases do efeito estufa. Quanto mais limpa for a produção, maior será a nota e a chance de obter receita com a emissão dos CBIOs. Se as usinas usam óleo diesel no transporte, nas colhedoras e no transbordo dentro da usina e esse combustível gasto for substituído por biometano, por exemplo, as empresas melhoram a nota dada pelas certificadoras.
A troca capaz de tornar os processos de produção mais limpos pode também envolver o uso dos subprodutos da cana-de-açúcar, como o bagaço, e o corte no consumo de nitrogenados. Resta saber se o benefício transformado em ar mais puro e receita reforçada da indústria resultará em queda de preços nas bombas do varejo de combustíveis, algo no que Campos acredita. É esperar para ver como se comportará a dinâmica do novo mercado dos CBIOs. Com base no que já foi visto no mundo, cada certificado pode valer US$ 10. No caso do etanol, um CBIO equivale a uma tonelada de carbono mitigada por cerca de 750 litros de etanol produzidos.
MUNDO AFORA
195 É o número de países que se comprometeram durante a 21ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP-21), em 2015, a reduzir as emissões de poluentes em 37%
QUEM COMANDA
O próprio mercado, quer dizer, as negociações entre os produtores de biocombustíveis e as distribuidoras, é que vai definir o preço do CBIO. Uma vez avaliadas, as usinas vão apresentar os seus certificados à ANP, que dará o lastro à comercialização. As empresas, então, levarão essas unidades aos bancos, que vão escriturá-las como espécie de registro e aí partir para um mercado, digamos, de balcão. As distribuidoras têm metas de redução de emissões de poluentes definidas junto à agência reguladora, com base em sua participação de mercado.
DEMANDA
A empresa de consultoria e auditoria PwC Brasil está trabalhando na certificação de várias usinas de biocombustíveis em Minas Gerais interessadas no mercado de créditos de descarbonização. Assim como outras consultorias, a PwC foi credenciada pela ANP como inspetora no âmbito da Política Nacional de Biocombustíveis, o Renovabio. O trabalho consiste em analisar quanto gás carbônico é retirado da natureza com a produção gerada nessas empresas.