Caio Gouveia é um adolescente trans. Ele tem 17 anos e se sente privilegiado pela mãe que o apoia, acompanha e compreende as demandas que surgem a cada dia. Ele se identificou com o sexo masculino quando tinha 12 anos.
“Primeiro ele se identificou como uma menina lésbica, depois pensou que fosse uma menina bissexual, e posteriormente ele entendeu que era um menino trans”. Segundo Cristina, na escola onde Caio estudava havia muitas pessoas trans, e não binários, e a identidade de gênero era muito trabalhada. Foi assim que um dia ela ouviu do próprio filho que ele havia entendido que era um menino trans.
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Caio acredita que vai ficar tudo bem. “Aparentemente é uma turma muito aberta, muito politizada. Mas eu sempre tenho um receio em todas as instituições onde vou. Eu tenho receio da segurança, mas preciso ser forte e lutar por estes espaços, porque sou uma pessoa de direitos que merece estar e ocupar os espaços que são públicos”, afirma.
Para Cristina, não foi difícil entender a identidade de gênero do filho. Segundo ela, o respeito já era prática na família. Apesar disso, sabe que ele ainda tem uma longa jornada até conseguir alcançar os direitos que toda a comunidade LGBTQIA%2b busca, e poder andar nas ruas sem o medo da violência que atinge essa população no Brasil e no mundo.
“Eu afirmo que a transfobia é tão violenta e o requinte de crueldade, principalmente contra as travestis que vivem na prostituicão, é extrema. E a maioria é de pessoas negras”, diz Cristina.
“Meu filho é um trans branco, mas ele precisa entender que outras pessoas passam por problemas ainda maiores que os dele”, reflete.
As palavras de Cristina são ditas ao lado do filho, que ouve atento a mãe, e parece refletir, enquanto ela analisa a situação.
Cristina afirma que, além da violência estrutural, a população LGBTQIA enfrenta situações de constrangimento diariamente, como quando precisa ir ao médico ou entrar num banheiro público. “Toda vez que vou ao banheiro num lugar público penso: eu posso entrar com tranquilidade. Ele, não”.
O adolescente tem um sorriso franco no rosto, que desaparece, quando pergunto sobre a situação mais difícil que já enfrentou após a sua identificação de gênero.
Ele conta que foi alvo de cyberbulling no colégio. O ataque pelas redes sociais mexeu muito com o estado emocional de Caio, principalmente por ter partido de pessoas conhecidas.
“ Foi muito desagradável. São coisas que acontecem muito. Ataques constantes nas redes sociais e nas tvs, mas quando acontece com gente muito próximo de você, é muito desagradável”.
Na entrevista dada ao O Fato em Foco, mãe e filho falam sobre a importância das organizações não governamentais e associações, que apoiam e amparam a população LGBTQIA .
E destacam que a participação das famílias nos grupos é fundamental para ajudar a compreender os processos pelos quais cada pessoa passa. “ A gente acha que entende mas depois vê que tem muito a aprender”, diz Cristina.
Ela é uma das fundadoras do Coletivo Diversidade Arco – Íris, composto por pais, mães e pessoas que se identificam com a causa LGBTQIA . O objetivo do coletivo é estimular a conscientização da sociedade e das famílias de pessoas LGBTQIA sobre a situação que vivem, para que busquem a conquista de direitos, entre outra demandas.
Cristina também já participou da ONG nacional Mães pela Diversidade e da ONG Mães pela Liberdade, uma dissidência do anterior, que deu origem a este grupo de Minas. O motivo é que o Mães pela Diversidade não aceitava a participação dos pais e nem dos filhos. Hoje, os pais foram inseridos. A maior preocupação de Cristina é de que as ONGs sejam lugares de acolhimento.
“Nao é fácil... mas procurem os coletivos que podem escutar e orientar antes que tomem essa medida cruel que é expulsar quem precisa de acolhimento”, reflete sobre o número de integrantes da comunidade LGBTQIA que são colocados para fora de casa ainda na adolescência. E completa: "Acredito na máxima: nada sobre nós sem nós", diz Cristina.
“É um medo constante. Eu tenho a clara noção de que muita coisa vai acontecer ainda. Eu vou sofrer muito preconceito. Não só eu, como outras pessoas vão sofrer por causa dessas pessoas que não entendem que somos pessoas também e merecemos respeito”, diz Caio Gouveia, que, após a entrevista, também declama poema escrito para o Projeto Janelas da Escuta, da UFMG.