Termina maio, mês das mães e de Maria, entra junho, mês de Antônio, João e Pedro – um santo, um profeta e um apóstolo que viveram muitos séculos antes de nós. Originadas nas festas dos santos populares em Portugal, as juninas brasileiras foram mudando, se modernizando, mas ainda hoje revelam a alegria e descontração do Brasil caipira. Como nos tempos do Antigo Testamento, quando os israelitas se reuniam nas festas das colheitas para celebrar os grãos, nós nos reunimos em torno de uma fogueira, atrás de um calor que nos deixe mais perto do chão.
Devido ao tamanho do país, aqui as festas são divididas em dois tipos: as festas do Nordeste e as festas do Brasil caipira, incluindo Minas, São Paulo, Paraná e Goiás. No Nordeste, região árida, as pessoas agradecem principalmente as chuvas nas lavouras, celebrando o milho através da canjica, da pamonha e da broa. Em Minas, o desejo é fazer a cidade virar roça, com os encontros enfeitados de bandeirinhas e muita rapadura, canjica, caldo de feijão. É o tempo da sanfona, do pãozinho de Santo Antônio, da porteira e do oratório, de sonhar ao pé da serra, das brincadeiras no paiol, do leitão assado, da paca tatu, cutia não, dos balões e do chapéu de palha.
Hora de fechar o quarteirão para a festa, onde todo mundo promete escancarar com alegria sua mineirice e fingir que está na roça, forçando uma paisagem que tem mais afinidade com a paz. Trocar o conforto dos carros pela mansidão do carro de bois. Acostumados a olhar para a frente e para o alto, o futuro e a tecnologia, junho nos convida a olhar para dentro, procurando estrelas em nossos próprios céus.
Começa no dia 13, com o santo que chamam de casamenteiro, e que tem outras histórias além das de providenciar casamentos. O talento do pregador, a eloquência, o grande saber e o domínio da Sagrada Escritura tornaram Santo Antônio uma das mais respeitadas figuras da igreja católica.
Uma das lindas passagens dele fala do seu desencanto por ver a igreja onde pregava vazia de fiéis. Naquela manhã, por volta do ano de 1223, na província de Rimini, Itália, Santo Antônio afastou-se do templo em direção à foz do Rio Marecchia e desabafou: “Irmãos peixes, os homens se esquecem de Deus, por isso estou aqui para vos falar”. E os peixes foram surgindo, mantendo a cabeça fora da água, brilhando sob os reflexos do sol.
Estamos ainda nos milagres dos peixes e lá vem São João, o Batista, que nasceu seis meses antes de Jesus e por isso tem a festa em 24 de junho. Embora de vida austera, vestindo roupas de pelo de carneiro e se alimentando de mel silvestre e gafanhotos, o primo de Jesus é homenageado nas festas juninas com a singeleza de um relicário (capelinha) feito de melão, cravo, rosa e manjericão.
Câmara Cascudo diz que capelinha significa um grupo de foliões dos festejos populares, ornados de capelas de folhagens, marchando em grupos, enquanto, em Portugal, capela pode ser uma coroa de flores ou folhas que, como na música, é feita de cravo, de rosa ou de manjericão.
E encerrando junho, temos o dia 29, para lembrar o homem de coração generoso, mas obtuso de caráter, que só concordava com o que entendia, negou o Mestre e fugiu da cruz, dando a entender que era mais habilidoso em usar as mãos para manusear as redes, que era melhor pescador de peixes do que de homens. E que se torna – vejam só – o corajoso apóstolo que pregava e era perseguido, pregava e era perseguido, o grande líder da Igreja primitiva, o São Pedro amado e respeitado mundo afora.
As juninas são mais uma festa popular ligada às tradições da Igreja. Este ano, com o coronavírus, serão celebradas na memória, lembranças felizes de outrora. O chapéu de palha, o terno xadrez e o vestido de chita dificilmente rodopiarão entre damas e cavalheiros nas quadrilhas copiadas dos grandes salões dos palácios franceses. Parece que não haverá balancê.
Mas o santo, o profeta e o apóstolo sempre estarão entre nós. Antônio, João e Pedro já se acostumaram com a alegria junina. Por isso, mesmo em casa, balancê.