"A morte deveria ser assim:
um céu que pouco a pouco anoitecesse
e a gente nem soubesse que era o fim…"
Mário Quintana
Quando no princípio ainda não sabíamos ao certo como era a pandemia da Covid e o que estava acontecendo, eu atendi um casal de plantonistas, médicos, que trabalhavam no CTI, e logo soube que eles tinham uma garota, Manoela, que veio a óbito.
Neste problema da luta pelo luto, fiquei perguntando como a vida pode ser breve, nada está sob nosso controle, pessoas que vivem longos anos, enquanto outros vivem tão pouco. E o número de mortes aumentando a cada dia e chegando mais perto das vítimas.
Neste problema da luta pelo luto, fiquei perguntando como a vida pode ser breve, nada está sob nosso controle, pessoas que vivem longos anos, enquanto outros vivem tão pouco. E o número de mortes aumentando a cada dia e chegando mais perto das vítimas.
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O lado amargo da vida Naqueles santos diasRogai por nósPalavras ao céuHistória que não se apagaDaqui de longeA fé deve estar presente todo santo diaE fomos permitindo que estávamos todos numa sala de espera. A cura, a vacina, a certeza, a garantia de que nada vai acontecer de novo, esperando uma dose de milagre.
Parecia que a pandemia lhes roubara a terra encantada e não havia mais rios correndo chocolate em seus dias. Foi assim que acabei compondo a letra de uma canção com o nome de “Saudade”, falando sobre a morte que nos diz que a saudade é o amor que fica: “E se dependesse de mim/como deixar ir?/Ver um filho amado partir e não mais voltar/Ver partir aquele que me ensinou a caminhar./Ah, se dependesse de mim, peço um tempo a mais/Só mais um dia/Mais dez minutos/Só um segundo/Tua promessa: O meu lugar é o céu. O amor que se foi, um pedaço de mim/Deus está lá no céu cuidando desse amor que partiu/A saudade é o amor que fica”.
O tempo foi passando, cada vez era maior o número de vítimas, crianças que nem imaginávamos passando pelo hospital, doentes ricos de saúde e de repente partindo sem saber por que, adultos avisando que chegava a hora de ir. Quando explicamos a morte para uma criança, dizemos que a pessoa virou uma estrelinha. E a conversa de todo dia era a morte avisando mais uma casa chorando a dor.
Acho que o céu trouxe também alguns anjos para lhes fazer companhia. Fazia o Sol se pôr, mas deixava um pouco do calor. Levava a Lua embora, mas ficava o luar. E fazia o vento virar brisa. Gente que não ficava sem céu nem quando se ligava aos aparelhos. Um lugar de céu azul, onde havia sempre um céu a orar por nós.
Olhe hoje para o céu à noite e teu coração enxergará uma nova estrela brilhando no alto. Olhe para as plantas pela manhã e verás uma nova gota de orvalho na folha do jardim. Olhe para o horizonte ao entardecer do dia e verás um novo raio no pôr do sol. Olhe! Logo aprenderás que existem outros modos de olhar que não apenas o de ver até onde a vista alcança.
Não com os olhos do teu rosto humano. Olhe com o coração. E verás tudo que ama perto de ti. O coração não deixa ir, e logo aprenderás que se o tempo é veloz, a memória é eterna, dura para sempre enquanto existir um de nós. E sempre haverá de existir.
A memória tem seu próprio passo, ritmo e compasso. Estamos cheios de eternidade dentro de nós. A vida vai ficando para trás, mas as lembranças são fiéis, não fogem.
A memória tem seu próprio passo, ritmo e compasso. Estamos cheios de eternidade dentro de nós. A vida vai ficando para trás, mas as lembranças são fiéis, não fogem.
Olhe! A vida é passageira e fugaz, tudo um dia se desfaz, mesmo que a gente queira ou não queira. Mas os afetos vividos ficam no coração. Atravessa o silêncio do teu deserto para ouvir os sons que vêm de dentro.
Olhe não para a felicidade que se foi, não para o laço que se desfez, não para o abraço que não abraça, ou para as mãos que não se tocam, ou para a voz que não se ouve.
Olhe não para a felicidade que se foi, não para o laço que se desfez, não para o abraço que não abraça, ou para as mãos que não se tocam, ou para a voz que não se ouve.
Olhe para a tua alma e para a calma que nela habita, porque é ali que está a fé que te sustenta, a esperança que te mantém de pé. É dentro de cada um de nós que está a imensidão maior que o céu e mais profunda que o mar.
Não te perturbes pela tristeza nem te acanhes com as lágrimas. Não te culpes por não querer deixar ir o ente querido. Reconforta-se. Deixa o Sol se pôr, a Lua se esconder – tudo o que foi será. Guarde do Sol o calor, da Lua o luar, da brisa o frescor.
Não te perturbes pela tristeza nem te acanhes com as lágrimas. Não te culpes por não querer deixar ir o ente querido. Reconforta-se. Deixa o Sol se pôr, a Lua se esconder – tudo o que foi será. Guarde do Sol o calor, da Lua o luar, da brisa o frescor.