Prevenir que os consumidores se endividem além do que têm condições de pagar e criar alternativas para quem já chegou a essa situação. Esses são os principais objetivos da chamada Lei do Superendividamento, sancionada pelo governo federal na última sexta-feira, dia 2 de julho, que altera o Código de Defesa do Consumidor.
De forma geral, a nova legislação prevê e estabelece diretrizes para audiências de negociação entre credor e devedor e cria instrumentos para conter abusos na oferta de crédito pelo mercado.
No artigo de hoje, vamos falar sobre as alterações que entraram em vigor na última semana e explicar de que forma elas impactam a vida dos brasileiros. Acompanhe!
O conceito de “superendividamento”
De acordo com a legislação, “entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação”.
Na prática, trata-se das situações em que o consumidor não pode arcar com as dívidas que assumiu sem comprometer o básico que precisa para sobreviver. E o trecho “de boa fé” não é por acaso! As diretrizes não se aplicam ao consumidor que tenha contraído dívidas com a intenção de não pagar ou a partir da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo e de alto valor.
Outro ponto importante é que as dívidas contempladas nas alterações podem ser originadas de qualquer compromisso financeiro assumido pelo consumidor, incluindo operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada.
Mudanças em relação à negociação de dívidas
Um dos pontos mais importantes da nova legislação diz respeito ao processo de negociação de dívidas. De acordo com o capítulo V do Código de Defesa do Consumidor alterado, o consumidor superendividado pode solicitar à justiça um processo de repactuação de dívidas com a presença de todos os credores — caso ele tenha contraído dívidas com mais de uma instituição.
Na audiência de conciliação, o consumidor apresenta um plano de pagamento de até cinco anos, com o qual ele pode arcar sem comprometer a quantia básica da qual ele precisa para viver. Esse valor, que diz respeito ao “mínimo existencial”, será definido posteriormente pelo governo federal, e é de extrema importância para garantir que o consumidor não precise contrair novas dívidas para pagar despesas mínimas como água e luz.
Se o acordo for fechado, o juiz responsável pela audiência deve homologar o trato, elaborando um plano de acordo que contenha informações relacionadas à suspensão de ações judiciais em andamento e prazo para retirada do nome do consumidor da lista de negativados dos órgãos de proteção ao crédito, entre outras.
Um ponto importante é que dívidas com garantia real (como um carro, por exemplo), financiamentos imobiliários e contratos de crédito rural não estão contempladas nessa possibilidade de negociação judicial prevista pela legislação.
Por fim, é válido ressaltar que a negociação judicial é uma das últimas alternativas a serem buscadas pelo
consumidor em caso de endividamento.
Segundo o cofundador da startup Meu Acerto, plataforma de negociação digital de dívidas, medidas como as previstas pela nova legislação são fundamentais para preservar a integridade financeira dos consumidores e garantir que as dívidas possam ser negociadas sem que as contas básicas do dia a dia sejam comprometidas.
“De toda forma, é importante deixar claro que a negociação prevista no novo Código de Defesa do Consumidor diz respeito ao superendividamento e que, sempre que possível, os consumidores inadimplentes devem buscar alternativas para negociar seu débito antes de chegar a essa situação mais extrema”, destaca ele.
A negociação digital de dívidas, por exemplo, pode oferecer condições atrativas para o consumidor, que têm condições de montar uma proposta que caiba no seu bolso e de revisar todos os dados da negociação antes de efetivamente fechar um acordo e assumir o compromisso de quitar a dívida.
Transparência na oferta de crédito
Uma das questões contempladas pela nova legislação com o objetivo de prevenir o superendividamento é a exigência da clareza das informações prestadas ao consumidor no momento da concessão de crédito ou venda a prazo.
De acordo com a lei, a instituição fornecedora do crédito deve informar:
- o custo efetivo total da dívida e a que exatamente ela se refere;
- a taxa mensal de juros, bem como todas as taxas envolvidas em caso de atraso de pagamento;
- o montante das prestações e o prazo de validade da oferta, que deve ser de, no mínimo, dois dias;
- o nome e o endereço, inclusive o eletrônico, da instituição;
- o direito do consumidor de liquidar o débito antecipadamente.
As mudanças na legislação visam aumentar a transparência dos processos de concessão de crédito, garantindo que o consumidor tenha conhecimento e clareza de todos os fatores envolvidos antes de contrair uma dívida.
A proibição de propagandas abusivas
E as mudanças no Código de Defesa do Consumidor não param por aí. Outras alterações importantes na legislação dizem respeito à proibição de propagandas abusivas, como anúncios que oferecem crédito “sem consulta a serviços de proteção ao crédito ou sem avaliação financeira do consumidor”.
Publicidades que ocultam ou dificultam “a compreensão do consumidor sobre os ônus e os riscos da contratação do crédito ou da venda a prazo” também são expressamente vedadas pela lei. O artigo reforça, mais uma vez, a necessidade de dar transparência a todas as questões envolvidas na transação.
Outra proibição prevista pela lei diz respeito ao assédio ou à pressão sobre o consumidor para a contratação de produto, serviço ou crédito, especialmente se o consumidor em questão for idoso, analfabeto, doente ou estiver em estado de vulnerabilidade agravada.
Educação financeira como direito do consumidor
Por fim, vale ressaltar que a legislação também fala, ainda que de maneira superficial, sobre a importância da educação financeira para a prevenção e o tratamento do superendividamento.
O fomento de ações direcionadas à educação financeira dos consumidores passa a integrar o texto do Código de Defesa do Consumidor, especificamente no artigo 4º, como princípio para “atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo”.
É em um cenário como esse que iniciativas voltadas para esse fim ganham ainda mais relevância. O
Pago
Quando Puder
, por exemplo, é uma plataforma de conteúdo que busca tornar a educação financeira mais acessível, a partir de uma linguagem simples e da abordagem de temas que fazem parte do dia a dia das pessoas que precisam fazer malabarismos para manter as contas em dia.