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Estado de Minas COMPORTAMENTO

Entre cães e homens

Desde minha infância até mês passado tive oito cães'


24/10/2021 04:00 - atualizado 25/10/2021 07:59

Cães
Há cerca de um mês, enterrei o meu último cachorro (foto: Pixabay)
Há cerca de um mês, enterrei o meu último cachorro. Digo último porque prometi não ter mais nenhum. Sempre gostei muito de animais. Meus primeiros bichinhos foram pintinhos comprados no mercado. Na época, era comum pais verem neles uma boa distração para seus filhos, pouco importava o fato de que se tratava de vida. De uma maneira geral, sobreviviam por pouco tempo, tamanho os cuidados inadequados de seus donos. Assim foi comigo. Decidia que era hora de eles dormirem e quase que os obrigava a fazê-lo, o mesmo em relação a comer e a se banhar. Afinal, se eu precisava fazer tudo isso, o que os isentaria de seguir as regras? 
 
Tive também dois patinhos que tiveram melhor sorte. Criei-os no galinheiro do sítio de uma tia, com quem passava muitos fins de semana. Me decepcionei com o fato de eles não se lembrarem mais de mim em poucos dias, mas me contentava com a ideia de que eles eram livres. Morreram de velhice, me garantiu meu tio, apesar de provocar minha ira dizendo que os colocaria na panela no Natal.
 
Desde minha infância até mês passado tive oito cães. Dois quando criança e os demais depois que meus filhos nasceram. Cães são ótimas companhias para crianças e quis que os meus experimentassem conviver com eles, mesmo sabendo que sobraria apenas para mim toda a responsabilidade relacionada à sobrevivência dos bichos. Com eles aprendemos a lidar com a vida e com a morte. 
 
Os meus sempre ficaram na área externa das casas onde moramos, na maior parte do tempo soltos, o que nos valeu alguns sérios problemas. Uma golden que tivemos comeu algo envenenado que encontrou no mato, o que acabou matando-a. Uma dachshund quase se foi também depois de comer um pedaço de pão com chumbinho, segundo o veterinário que a salvou. O dálmata precisou ser castrado porque toda vez que tinha uma cadela no cio na região, voltava totalmente depauperado, pois não pensava duas vezes antes de entrar numa briga pela atenção da fêmea. 
 
Além dos cães, tivemos ovelhas, com as quais criamos vínculos afetivos. Elas atendiam pelos nomes e adoravam nos chamar para brincar, ou melhor, para correr. Não era nada fácil brincar de pegador com elas, ou seja, nós sempre perdíamos, mesmo fazendo um esforço sobre- humano. Morreram de velhice na fazenda de um parente, porém até o último momento indicavam se lembrar de quem éramos. 
 
A profissional que tosava e dava banho no meu último cão, um vira-latas muito peludo, acaba de me perguntar se eu poderia adotar um muito parecido com o que se foi. Animais enriquecem muito nossas existências, nos ensinam muito, inclusive a sermos mais humanos com os humanos. Mas não, não quero mais tê-los aos moldes que eu tive. 
 
Decidi que agora meus bichanos serão todos os que vivem no meu jardim. Para os calangos, ajeitamos tantas pedras que aqui mais parece uma criatório de répteis que casa de gente. Para os esquilos, plantamos 15 coqueiros licuri e agora não conseguimos mais esticar um pouco o sono algumas manhãs, tamanha a barulheira que fazem abrindo os coquinhos com os dentes. Há pássaros de todo tipo e tamanho que fazem coro mesmo antes de o sol despertador de vez. 
 
Amo muito estar no meio deles e mais ainda a certeza de que não precisam de mim para nada. Desde que não tentemos interferir na dinâmica deles, estarão sempre por aqui, assim como tudo do que precisam para viver e morrer. Alguns podem dizer que, ao contrário dos pets, com eles não há interação e muito menos trocas afetivas. Sem dúvida, temos uma relação muito diferente se compararmos com a que se tem com cães e gatos. Mas a vida selvagem está aqui para nos lembrar também de que não podemos depositar nossa atenção apenas nos que somos capazes de manipular e dirigir como bem entendemos e desejamos, mudando a natureza de sua vida como temos muitas vezes feito com os pets ao tentar transformá-los em seres humanos. 

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