Patrícia Espírito Santo
Ouvi com muita tristeza um casal contar sobre o dia em que internaram o filho único em uma clínica de reabilitação de dependentes químicos. O rapaz acabara de completar 16 anos e estava viciado em um medicamento usado para o tratamento de TDAH – transtorno de déficit de atenção com hiperatividade. Tudo começou quando começou a fumar maconha com "a turma", época em que foi também diagnosticado como sendo muito ansioso. De uma dose pequena receitada pelo médico, por conta própria ele sextuplicou a dosagem por comprimido, até que, pouco antes de ser internado, ingeria 20 cápsulas por dia.
Remédio tarja preta, claro, mas facilmente comprado on-line por quem sabe navegar e procurar na web. Ele recebia em casa com a rapidez e a facilidade de quem compra pizza, hambúrguer, sabão em pó ou um simples lápis de cor. Tentando acompanhar o filho, seus pais observaram apreensivos a evolução do vício, acreditando que seria possível reverter o quadro sozinhos, sem recorrer à ajuda de profissionais especializados.
Reconhecer a dependência não é tarefa fácil porque exige encarar uma realidade que desestrutura e abala, assim como assumir que a solução está muito longe de atitudes simples e corriqueiras como rezar, esperar e torcer para amanhã tudo amanhecer modificado.
Eu me lembrei da mãe, às vezes severa, que fui. Eu e meu marido aprendemos que na dúvida era melhor dizer não. Não vai. Não pode. Não deixamos. Por quê? Porque não e quem manda aqui é papai e mamãe. Abrimos nossa casa para todos os amigos, os que vinham só para um lanche, pra dormir ou passar dias.
Enquanto preparava o cachorro-quente eu ouvia as histórias. Não me metia, mas observava e analisava. Levávamos e buscávamos nas festas os meus filhos, assim como os meninos cujos pais não podiam ir. Acabávamos sabendo quem bebia demais, quem fumava, quem sacaneava com os garotos e as garotas, quem as defendia. Não prendemos nossos filhos; pelo contrário, os deixamos ganhar o mundo antes mesmo de atingirem a maioridade, mas com a segurança de que eles saberiam se virar sozinhos longe de nossas asas.
Privar o filho da liberdade, submetendo-o à internação compulsória, doeu muito ao casal. Despedir-se dele através de uma grade aos moldes das penitenciárias é uma imagem que os atormenta, apesar de saberem que fizeram o que tinham de melhor a fazer.
As drogas compradas em farmácias estão tomando as festas, as escolas, os rolês. Inicialmente, causam bem-estar e ajudam a manter os jovens acesos e ativos durante as maratonas que muitas vezes viram o dia e a noite. E cabe aos pais vigiar e aconselhar, limitar e acompanhar, mesmo que tenham que tomar atitudes drásticas muito além daquilo que sonharam e planejaram para os filhos.