Há um argumento convincente de que o poder das nações é organizado em termos de quem conta com mais conexões. Mais do que isso, há ainda mais poder e responsabilidade em quem controla essas conexões. Governar tem a ver com as ferramentas de ligação, direcionamento e escoamento.
Quando Putin decidiu usar mais uma vez a violência para afirmar a supremacia russa perto de sua fronteira, fica exposta sua fragilidade como Estado no mundo atual.
Mostrou também a fragilidade de como um gigante de 45 milhões de habitantes como a Ucrânia está às expensas da agressão de um país maior e com superior poderio militar.
Afinal, a Rússia é gigante, mas como tem muito poucas conexões e está relativamente exposta a conexões que não controla vive a angústia de ser um gigante obsoleto. A Rússia pode sobreviver isolada, mas seria um experimento atroz para a população russa e os nervos de seus vizinhos.
Em última análise, a força é dos EUA porque conseguem articular uma visão mais inclusiva, livre, respeitosa e cooperativa de ordem mundial. Agem a partir do seu sistema de alianças, mantendo melhores conexões com clara preocupação democrática. Por isso mesmo, cuidado, não se combate autoritarismo com autoritarismo.
Nem é prudente se misturar um confronto de violência real - Rússia contra Ucrânia - com outros desconfortos a fim de se resolver de uma vez por todas "tudo que está errado no mundo". A democracia pode mesmo sair mais forte desse imbróglio desde que não passe da conta.
Na guerra atual, os EUA estão aprendendo o que querem sobre o funcionamento do mundo enquanto os demais países aprendem o que podem.
O mundo hiperconectado padece da falta de conversa inundado de falatório demais em Twitter e afins e parco em diálogos como se o mundo estivesse ficando mais burro.
Uma das mais alvissareiras notícias da semana é a de que altos encarregados de assuntos estratégicos da China e dos EUA se encontraram longamente em Roma. E dias depois, na sexta-feira, ocorreu uma conversa, à distância, entre Biden e Xi.
A conversa de Roma dá mais perspectiva nesse imbróglio. Conta a história que, a partir de Roma, exércitos liderados por líderes de ímpeto expansionista formaram um império que se expandiu até a Grã-Bretanha. Eventualmente, foram empurrados de volta por vários povos "bárbaros" que estavam ou insatisfeitos com a invasão de suas terras ou com suas próprias índoles expansionistas afloradas. Roma viu também a fragilidade de ditadores e desavenças que resultam em cismas.
Enquanto a Rússia busca conseguir o que quer com violência, há um teste por parte dos EUA sobre o que é possível ser alcançado, em termos de mudança de regime e de comportamento, com sanções e punições "não-violentas". De toda forma há uma continuidade, gradações, em direção a ações mais violentas.
Apesar de a lógica ser antiga e se manifestar na estratégia dos EUA de manterem um balanço favorável de aliados militares, além da vasta superioridade militar que o país possui, é uma demonstração de como todas as conexões digitais e financeiras podem ser usadas como alavanca para parar um adversário.
A Ucrânia resiste também porque tem uma rede de apoio internacional que cresce à medida que a opinião pública se inflama com notícias da desumanidade da guerra. Mas o conflito, desnecessário e destruidor, não precisa de mais envolvidos.
A China apesar de ser extremamente conectada com o mundo em termos de negócios não é um país que baseia suas relações em alianças militares. Especula-se sobre a extensão de seu acordo com Moscou, mas não parece razoável se tentar "enquadrar" Pequim.
Afinal, no limite, a China também pode sobreviver isolada. Mas, por várias razões, não parece ser inteligente forçar tal situação. É, na verdade, uma oportunidade para EUA e China trabalharem juntos para resolver um problema. O problema são as barreiras à compreensão mútua.
Quando os países se entendem, ferramentas funcionam, a escassez diminui e o bem-estar aumenta. Quando a falta de entendimento impera, há um redirecionamento de recursos em direção a conflitos. (Com Henrique Delgado)