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Falta de crédito atira pequenas empresas no buraco negro da sobrevivência

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Jofre me abordou, desesperado, com um problema que também afeta João, Adriano, Mauro, Letícia, Mariza e, seguramente, mais de 1 milhão de micro, pequenas e médias empresas (MPMEs). É o sufoco do crédito bancário. São empresários e empresárias com negócio bem-estabelecido e que prezam por sua reputação de bons pagadores. Mas, todos, com uma doença em comum: sofrem de embolia creditícia. Não conseguem mais ventilação suficiente para oxigenar seus negócios.

O capital de giro secou por completo. Rolam o mês atrasando contas de fornecedores e deixando de pagar em dia os impostos devidos. A grande maioria já cruzou o Rubicão da solvência financeira ao buscar, como recurso extremo, a desgraça do cheque especial.
Estão com mortes anunciadas para seus negócios.

Jofre tem 19 empregados. São 19 carteiras assinadas e serão 17 desempregados a mais caso o negócio de Jofre afunde. Antes que o pior aconteça, Jofre tentará renegociar seus créditos que, por sorte, estão num único banco, embora provenientes de linhas repassadas de diversos programas oficiais que embalaram a esperança de uma economia a pleno vapor no período dilmista.

Os bancos têm ótimas assessorias de previsão econômica: anteviram a crise e retraíram seus créditos. Desde então, a retração corresponde a uma queda percentual do PIB de cerca de 5 pontos, ou seja, o crédito às empresas de qualquer tamanho ou negócio recuou de cerca de 25% do PIB para apenas 20%. Em reais, foi um recuo gigantesco, de cerca de R$ 350 bilhões em cinco anos.

Nesse meio tempo, o juro básico, aquele que o próprio governo paga para rolar suas dívidas, despencou para um nível nunca antes experimentado. Era para ter beneficiado Jofre e as MPMEs lá na ponta final da irrigação creditícia.
Só que não aconteceu. O novo governo, do alto de sua crença liberal, achava que os bancos privados iriam suprir o corte da principal linha de crédito de giro do BNDES, o conhecido BNDES Giro. Ao eliminar essa linha por completo, o novo governo detonou as chances de uma rápida retomada da economia.

Confiou numa substituição automática de créditos públicos por privados, sem perceber que o BNDES Giro já fazia exatamente isso: suprir o mercado por meio do sistema bancário comercial. O recuo do crédito é alarmante: em 12 meses até agosto, 1,2% do PIB, ou R$ 84 bilhões, desapareceu da disponibilidade das empresas, sendo que o setor público colaborou com um corte monstruoso de 1,6% do PIB para tal recuo, enquanto os bancos privados o ampliavam em apenas 0,4%.

A parcela preponderante desse corte geral de créditos aconteceu em cima dos pequenos negócios, por óbvio. Não há Jofre nem João que resista a um ritmo bizarro de eliminação de créditos da ordem de 7 bilhões de reais por mês!

Certas situações econômicas simplesmente não se resolvem com contemplação e espera. A equipe de governo precisa agir, e rápido, antes que a embolia de crédito vire uma multiplicação de óbitos empresariais e de empregos.

Os bancos públicos precisam continuar fazendo seu papel.
O setor bancário privado também precisa ser reformado para poder melhor cumprir a missão de expansão do crédito esperada pelos liberais do governo. Até que a reforma financeira reduza recolhimentos compulsórios dos bancos e aumente a competição em mercado pelas instituições financeiras – o que leva algum tempo – o crédito às empresas precisa ser destravado de algum modo.

A situação é tão grave que lembra a proposta do candidato Ciro Gomes (a proposta “Nome Limpo”), na última campanha presidencial, na época desdenhada pela maioria, entre risos de desconfiança.

As linhas de capital de giro precisam ser renegociadas num sistema mais amplo, como já feito algumas vezes no passado, mediante recompra de créditos aos bancos que não se disponham a participar do resgate da pequena empresa endividada, mas viável. Embolia pulmonar não espera por médicos hesitantes. E embolia creditícia também pode matar boas reputações de gestores públicos inertes.
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