Já é quase certa a aprovação da reforma da Previdência na Câmara antes do recesso parlamentar que começa em 18 de julho. Esse “quase” fica por conta da indisposição de alguns parlamentares que, embora não sejam filiados a partidos de esquerda, como o PT, o PSOL e o PC do B (sempre prontos a fazer muito barulho por nada), ainda temem ser mal-entendidos por parte do eleitorado.
Mesmo alterada, a reforma que tende a resultar dos embates parlamentares pode ajudar a destravar a economia. Afinal, neste país acostumado a se contentar com pouco, alguma coisa é sempre melhor do que nada. Mas, se uma solução quase boa pode ter resultados positivos, o que nos traria uma reforma ótima, com uma economia de mais de R$ 1 trilhão em 10 anos?
Temos, então, um segundo “quase” e esse vai para a conta de uma falha da democracia brasileira chamada Centrão. Assim é conhecido um grupo de políticos que não se dizem de esquerda nem de direita, nem contra nem a favor de coisa alguma. Mas tem tamanho e peso suficientes para influir nas votações do Congresso e impor seus interesses nem sempre confessáveis.
O Centrão tem agido para obrigar o governo a voltar à velha prática do loteamento de cargos em troca da aprovação de projetos do Executivo. Pouco importa que eles sejam urgentes e de indiscutível interesse do país. Pelo contrário, isso os tornam ainda mais valiosos em negociações como as que rolavam nos últimos anos e que, agora, o governo se nega a fazer.
A proposta de reforma está no Congresso desde fevereiro e já teria sido aprovada com folga se o governo tivesse aberto a porteira dos ministérios e empresas estatais ao Centrão.
Está aí, então, um impasse político: de um lado, as urnas de outubro exigiram que o governo patrocine reformas estruturais; de outro, essas mudanças têm de ser aprovadas pelo Congresso, que é controlado pelo Centrão, grupo que não se conforma em votar algo que não lhe renderá o que estava acostumado a receber.
projeto MUTILADo
Ainda assim, a reforma será aprovada, pois é tão evidente a sua necessidade e a sua urgência que só os mais empedernidos oposicionistas votarão contra. Os políticos do Centrão não querem ser acusados de ter impedido o país de sair da crise. Temem ser confundidos com aqueles que, em última análise, provocaram essa situação quando estiveram no governo.
Mas essa não é a única preocupação desses políticos. Eles entendem que a reforma, tal como proposta pelo governo, teria potência fiscal para reanimar a economia numa rapidez perigosa para seus interesses eleitorais. Sabem que há muito dinheiro no mundo à procura de pouso confiável. E, pelo seu tamanho e sua potencialidade, o Brasil interessa aos investidores. Basta que o país demonstre ser capaz de voltar à racionalidade fiscal.
Em outras palavras, o Centrão deve fechar um acordo para aprovar a reforma, mantendo alguns de seus pontos fundamentais, como a fixação da idade de mínima de 65 anos para homens e 62 para mulheres, mas com mutilações que reduzem muito seu impacto fiscal.
CARA FEIA
Quanto mais demorada for a tramitação, mais sujeito a mutilações fica o texto original da reforma. E mutilação é o que não falta. Além da retirada já esperada dos capítulos da aposentadoria rural e dos Benefícios de Prestação Continuada (BPC), já caíram a extensão da reforma aos governos estaduais, o gatilho que permite a atualização da idade mínima por lei ordinária, e a futura introdução do regime previdenciário por capitalização. Até aí, a economia prevista ficaria pouco abaixo de R$ 1 trilhão.
Mas, como se temia, políticos do Centrão e de partidos de esquerda não resistiram às tentações da chamada velha política: cederam à pressão de corporações de funcionários públicos, principalmente dos que já estão entre os mais privilegiados, alongando seus prazos de convergência rumo à idade mínima de 65 anos. Essa medida representa redução na economia buscada pela reforma que pode chegar a R$ 100 bilhões. Em seguida, garantiram os votos dos professores, dando-lhes idade mínima de aposentadoria menor do que o dos demais trabalhadores.
Com essas intervenções, não é seguro afirmar que a economia a ser obtida com a reforma chegue aos R$ 800 bilhões. Ainda há tempo de se rever pelo menos parte dessas tesouradas, mas não dá para confiar.
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