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Inflação vai continuar em todos os países, pressionando alta dos juros

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Podem estar erradas as análises, inclusive as de autoridades monetárias do Brasil e do exterior, que alimentam a expectativa de reversão, a partir de junho ou julho, do atual processo inflacionário. Nos últimos dias, a aceleração dos preços de itens básicos, como combustíveis e alimentos, e a rápida transmissão desses aumentos para os demais setores da economia evidenciaram a universalidade e a complexidade do fenômeno.




 
Afinal, foi mais forte do que se pensava o choque de oferta provocado pelas paralisações de boa parte das atividades econômicas durante a pandemia da COVID-19. Além disso, o que agora se constata são os efeitos de um choque de demanda provocado por medidas anticíclicas adotadas para mitigar os efeitos da crise sanitária.
 
De um lado, os meios de produção, principalmente os industriais, foram e continuam sendo afetados pelo desarranjo das cadeias de suprimento (faltam matérias-primas e peças). A retomada do fornecimento desses itens não tem como ser mais rápida. Trata-se de uma miríade de fornecedores espalhados pelo mundo, dependentes de uma logística que também foi afetada.
 
De outro lado, o derrame de dinheiro feito pelos governos da maioria dos países, incluindo os auxílios emergenciais, combinado com as limitações impostas pelos prolongados lockdowns, estimulou o consumo (on-line) de bens, em lugar dos gastos com serviços e lazer. Finda a pandemia, é grande a disposição de parte dos consumidores de ir às compras, configurando, assim, um choque de demanda.




 
Esse desequilíbrio nos mercados já seria suficiente para provocar a alta dos preços, pelo menos enquanto durar a fase de saída da pandemia. Mas, como nada é tão ruim que não possa ficar pior, ocorreu em 24 de fevereiro a invasão da Ucrânia pela Rússia. Assim como no início da pandemia, havia a esperança de que esse conflito armado durasse apenas algumas semanas e que suas consequências não fossem além de poucos mortos e feridos e de algum dano à economia.
 
Não é o que ocorre. Já estamos perto de fechar a segunda quinzena de abril e o fim dos combates não parece próximo. A guerra agravou a conjuntura de escassez e aumentou as incertezas quanto à normalização da economia mundial, da qual a inflação e a política de juros do Brasil se tornaram reféns.

Inflação


Em nosso país, os primeiros efeitos negativos já puderam ser percebidos na inflação de março, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que subiu 1,62% em relação ao mês anterior. O aumento foi puxado pelos combustíveis e pelos alimentos que, juntos, responderam por 72% do índice do mês.




 
Com esse empurrão, a inflação oficial acumulada no ano já é de 3,20%, perto da meta de 3,50% estabelecida para todo o ano 2022. Nos 12 últimos meses, o índice acumula aumento de 11,30%.
Esse resultado deixa a taxa básica de juros (Selic) apenas 45 pontos-base acima da inflação durante os próximos 22 dias. Só depois disso é que o Banco Central (BC) projeta elevá-la para 12,75%.
 
É fato que a autoridade monetária brasileira tem estado à frente dos demais bancos centrais no endurecimento da política monetária, mantendo sua taxa básica acima da inflação doméstica. O que se discute hoje é se será possível interromper o ciclo de alta da Selic a partir de 4 de maio, como pretende o BC. Em outras palavras, a dúvida é se até lá a inflação já terá batido no teto, aqui e no resto do mundo.
 
No Reino Unido, a inflação de 0,8% em março empurrou o índice acumulado em 12 meses para 6,2%, ultrapassando em muito a meta de 2% prevista para 2022 pelo Banco da Inglaterra. Na Alemanha, país muito dependente do fornecimento de petróleo e gás natural da Rússia, a situação é ainda pior. A inflação de março cresceu 2,5% em relação a fevereiro, elevando para 7,3% o índice acumulado em 12 meses.




 

Recessão


Em toda a chamada Zona do Euro, a inflação puxada pelos combustíveis e por itens da alimentação básica varia entre 6% e 7%, conforme as necessidades de importação de cada país. A verdade é que a guerra envolve países que pesam no mercado de commodities. A Ucrânia é um dos maiores produtores de milho do mundo, além de ser grande exportador de trigo e de fertilizantes.
 
Belarus também tem peso no mercado mundial de trigo, ao lado da Rússia, que, além de exportar esse cereal e insumos para a produção de fertilizantes, é o terceiro maior produtor mundial de petróleo e gás natural.
 
A simples ausência desses três players do mercado mundial impacta negativamente a oferta e, em consequência, aumenta os preços e compromete contratos para os próximos meses. Do outro lado do Atlântico, os Estados Unidos, maior economia do mundo, enfrentam uma inesperada inflação que já beira os 8% ao ano.
 
Perdas de 6% a 8% sobre o poder de compra de moedas fortes como a libra, o euro e o dólar doem tanto ou mais do que as de dois dígitos sobre o nosso sofrido real. Sim, é preciso combater ou, pelo menos, mitigar os efeitos dessa corrida de preços. Mas, por falar em preço, se forem adotados juros mais altos, o que terá de ser pago, pode ser o de uma indesejada recessão. Os países ricos estariam dispostos a pagá-lo? Por enquanto, não.