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Estado de Minas MÍDIA E PODER

Lulismo sofistica discurso para evitar 'falsa simetria'

Para amainar a sanha do petismo que alimenta a polarização que não interessa com Bolsonaro, lulismo evoca diferenças de caráter mas não de atuação dos dois


27/05/2021 06:00 - atualizado 27/05/2021 07:31

"Grande parte do ódio a Lula é culpa do petista de rede social" (foto: hafteh7/Pixabay )


Grande parte do ódio a Bolsonaro é culpa do bolsonarista de rede social. Aquela pessoa de quem você lê um post virulento batendo abaixo da cintura, lastreado na desqualificação até da aparência física do adversário, e pensa:

— Ah, não. Não dá para votar em Bolsonaro. Essa gente não pode voltar ao poder.

Assim como grande parte do ódio a Lula é culpa do petista de rede social. Aquela pessoa de quem você lia um post virulento batendo um pouco acima da cintura, lastreado em acusações de fascismo ao adversário, e pensava:

— Ah, não. Não dá para votar em Lula. Essa gente não pode voltar ao poder.
 
Quando Lula recuperou seus direitos políticos, na anulação de suas sentenças na Lava-Jato, aquele petista mais renitente de faca nos dentes voltou ao baile como em domingo de carnaval depois de uma pandemia.

Queria, como sempre, restabelecer a sua verdade de que Lula é inocente no seu modo muito próprio de chamar a plateia de idiota. Quando não de fascista, a serviço de Bolsonaro.

Acabou dando inegável contribuição por colocar Lula como o polo oposto e único alternativo a Bolsonaro. E, com isso, reforçar a velha impressão de que se trata apenas do outro lado da mesma moeda, com a mesma tentação para o ódio.

Suscitando do outro lado do teclado:

— Ah, não. Não dá para votar em Lula. Essa gente não pode voltar ao poder.
Coube aos mais inteligentes perceber o estrago e começar um processo de panos quentes virtuais. Num discurso mais elaborado de que não se pode equiparar as duas personalidades.

Como de fato, não. Empático, caloroso, negociador de berço, feroz mas quase sempre no campo das ideias, está longe de qualquer traço de caráter de Jair Bolsonaro. É impensável que fizesse uma live nacional desqualificando adversários pelo peso ou alguma deficiência física.

— O comunista gordo, o ladrão de nove dedos — como definiu Bolsonaro na semana passada, como se estivesse num boteco de bêbados e não sentado na primeira cadeira do país.

A ideia de polarização de dois iguais, embora diferentes em caráter, levou Lula e os mesmos mais inteligentes das redes a empreender uma cruzada para colocá-lo como a alternativa de centro que a direita democrática não está conseguindo construir. 

Um moderado que negocia com todo mundo, sempre teve boas relações com os empresários, os militares, os políticos e a imprensa, como ele bem pautou os militantes na coletiva palanque depois da sua libertação pelo STF. 


Como a ideia de equiparação persistia, muito também por contribuição dos principais interessados nela — Bolsonaro e os candidatos à terceira via —, o discurso evoluiu para uma sofisticação de que comparar os dois é fazer uma "falsa simetria".

Começou com o argumento de uma "criminalização da política" pela Lava-Jato — puxado com sofisticação por Reinaldo Azevedo, o novo guru de grande parte da esquerda — como uma das explicações para a deterioração do ambiente político que resultou em Bolsonaro.

Nas palavras do cientista político e professor da FGV, Cláudio Couto, numa live da semana passada no canal TV247, do site de esquerda Brasil247:

— Esse emburrecimento do debate político que coloca a corrupção como o mal de todos os males, esse debate burro que resultou nessa antipolítica que teve na Lava-Jato seu grande motor, mas não o único, (...) levou à eleição de um oportunista, de um aventureiro, de um marginal da política extremista.

E à ideia, enfim, "da simetria das coisas que não são simétricas", como ele diz na mesma live, para contrapor o que seria uma esquerda democrática ao que seria uma extrema direita — como diria um petista — fascista.

Quanto porém Bolsonaro e Lula não são ou não foram simétricos? A esquerda seria de fato democrática?

Fora as diferenças de caráter, há boas razões para acreditar que Bolsonaro repetiu Lula no principal, no exercício da Presidência. 

Tentou controlar o Judiciário, comprou o Congresso, pagou militância jornalística virtual para afrontar a imprensa, desqualificar adversários e distribuir ódio. Tem a mesma tentação de atacar para defender e alimentar milícias satélites, como foi o MST de Lula, posto na janela para assustar "a zelite" sempre que passava aperto.

Tanto não foi democrática a esquerda de Lula no poder, que despejou do PT e do governo muitos homens de esquerda sofisticados, sobretudo depois do escândalo do Mensalão. Tanto quanto se criminalizou a política, desde quando Lula dizia que havia 300 picaretas no Congresso.

Admito porém que Lula não tem tentações golpistas, como parece muito claro em Bolsonaro. Articula bem num sistema democrático e há boas razões para acreditar também que tenha mudado de fato, muito, mais ainda, em direção ao centro. 


Se ganhar, vai fazer o mesmo governo de viés social-democrata que se seguiu ao de seu novo fiador, num mundo em que não dá mais para defender liberalismo e extrema direita. Distribuirá gorjetas sociais à esquerda e subsídios à direita, no nosso eterno modelo de economia, esse sim, fascista.

Não se sabe se mudou no que precisa ser a principal plataforma de qualquer candidato em 2022: distender e não acirrar o ambiente político, reduzir a zero o clima de ódio, que também não nasceu com Bolsonaro.

Problema, como se sabe, são os petistas. Vai que a gente cruza com um post chamando a ele de Deus e a gente de fascista. Vamos ter que pensar:

— Ah, não. Não dá para votar em Lula. Essa gente não pode voltar ao poder. 

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