Ciro Gomes vem se consolidando há algum tempo na terceira posição de intenções nas pesquisas de voto para 2022 e na presença consistente nas redes sociais, onde está em plena campanha.
Quase sempre distante da turma de menos de 5% das intenções, o terreno remoto onde habitam os bonitinhos do chamado centro civilizado: João Dória, Henrique Mandetta e Sérgio Moro.
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Apesar disso, o grosso da análise política que tenta antecipar os resultados das eleições, a partir das pesquisas, o embola no meio dos nanicos do sub-5%, a chamada terceira-via que as premonições para 2022 já determinaram que não existe.
Ainda que sempre tenha existido nos candidatos à espera da maturação natural da campanha. Em que é tão precipitado falar da inviabilidade de crescimento de Doria, Leite, Mandetta, Simone Tebet ou sobretudo Ciro, quanto para cravar a inexorabilidade do palanque Bolsonaro versus Lula.
É um tipo de fatalidade meio astrológica, a que interponho outras:
- Ciro chega à campanha real com índices em torno de 18 a 20% e pode tomar o lugar de Bolsonaro. Porque não tem chances no mercado eleitoral de Lula, a não ser que ele desista, e tem apoio da direita que gosta de seu nacionalismo e não leva a sério seu esquerdismo.
- Bolsonaro chega forte, porque não há clima que não melhore em ano de eleição. Vão esquecer o que fez no verão passado e pesar o ódio a seu adversário. Mas, como no caso de Trump que chegou bem apesar de tudo, é difícil que a sociedade lhe dê uma segunda chance para machucar por mais quatro anos um país já muito machucado.
- Lula pode se esvaziar porque seus números estão inflados. Decorrem hoje do recall ao primeiro nome mais visível e viável, à nostalgia dos bons tempos do seu governo e da ideia de tábua de salvação ante o desastre colocado. Mas não vai ser fácil mantê-los na campanha sangrenta em cima de todas as denúncias que terá dificuldade de contestar.
- Não é absolutamente certo que Lula vença Bolsonaro e vice-versa, dada a altíssima rejeição de ambos. Nem que Ciro, mais limpinho mas altamente agressivo, vença qualquer dos dois numa campanha em que a sociedade deve procurar paz e alguém menos belicoso.
- Na hipótese de tomar o lugar de Bolsonaro, ele terá argumentos de sobra para usar sua verborragia luminosa de frases exuberantes contra os desmandos da era Lula, sobre os quais vem teorizando com brilhantismo em entrevistas. Na mais remota, de tomar o lugar de Lula, idem sobre os desastres da era Bolsonaro.
- Mas a agressividade que controla mal pode bater de frente, desfavoravelmente, com um adversário que sabe usá-la a seu favor, sob controle e só quando preciso, Lula. Ou esquentar o clima de guerra, de novo desfavorável, contra um candidato que controla seus impulsos menos que ele, Bolsonaro.
- Lula só tem a perder, mesmo vencendo. Vai enfrentar uma campanha sangrenta com todas as denúncias que certamente gostaria que fossem esquecidas. E, se eleito, um país inadministrável que requer alianças espúrias, reformas dramáticas e arranjos contrários a tudo o que pregará até as urnas. Se pudesse, acredito que desistiria, sairia a vice como Cristina Kirchner na Argentina e iria cuidar da velhice tirando foto com a Janja nas praias do nordeste.
Ciro é presença inevitável nesse cenário de fatalismos tão consistentes quanto resultados de pesquisas, mas continua embolado na invisibilidade meio forçada da terceira via.
Ele desaparece em meio a uma polarização sadia, que divide dois mundos de forte empatia com seus candidatos. Mas também tóxica, que contrapõe projetos e personalidades bem distintos, nas ideias e pessoas de Bolsonaro e Lula, com interesses claros de manipulação.
De forma inconsciente ou não, de boa ou má fé, ao modo Odorico Paraguassu de dar um torcicolo no pescoço da verdade.
Tão astrológico quanto conveniente, esse fatalismo já estabeleceu, por exemplo, que Lula era a única alternativa democrática ao chamado fascismo de Bolsonaro, com todo tipo de ataque e patrulhamento que se segue a esse tipo de cisão aparentemente lógica.
Mesmo que a comparação não seja favorável a nenhum dos dois, na medida em que são muito parecidos nas tentações de controle da imprensa, do Judiciário e do Congresso, por diferentes meios, com mais ou menos competência.
E também contrapôs como diferentes os seus projetos de Estado, um mais intervencionista em oposição a um neoliberal, quando se sabe que ambos operaram o mesmo tipo de capitalismo estatal que favorece seletivamente os amigos do rei, sacrificando, aparelhando e moldando a máquina pública a ele.
A se ser honesto com as alternativas, há que se considerar que Ciro Gomes é tão intervencionista quanto Lula e tão anti-liberal quanto Bolsonaro, novesfora o fato de que tem condições de enfrentar ambos.
É tão certo incluí-lo como fatalidade metafísica entre os dois, quanto errado dizer que não tem um projeto claro à direita ou à esquerda. Como qualquer outro candidato do baixo escalão da terceira via.
O Brasil só tem candidatos desse diapasão. O único que vocalizou como nunca as demandas de uma centro direita liberal, sem clientelismo e sem corrupção, foi Bolsonaro. Mas, como se veio a saber, estava mentindo.
Ciro é o que mais se parece com os dois primeiros. Um nacionalismo cartorial montado nas tetas do Estado, acenando para a esquerda, o funcionalismo e os pobres com diferentes tipos de esmola.
E não é custoso especular que seja mais democrata que ambos. Ele é da geração pré-Lula, que ainda jogava o jogo da alternância democrática. Não apostava na tomada do poder ad aeternum pelo aparelhamento da máquina em pontos estratégicos, como ficou comum depois.
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