Rápidos no gatilho, os defensores mais inteligentes da candidatura Lula sacam a ideia de "falsa simetria" para repelir qualquer tentativa de comparação dele com Bolsonaro entre os que rejeitam os dois.
Usam o parâmetro de "vocação democrática" para assinalar a diferença em favor de Lula, numa jogada esperta para evitar a comparação em outra área em que são assimétricos, a da corrupção.
Em esperteza semelhante, sem capacidade para a mesma elaboração intelectual, Bolsonaro sugere uma falsa simetria no quesito "corrupção", que seria mais desconfortável para seu adversário.
Não aceita que os desvios recentes de seu governo, relacionado mais a tráfico de influência do que a dinheiro vivo transportado em carros fortes, possam ser comparados ao modus operandi anterior.
Até pelo tempo e as ramificações espalhadas vertical e horizontalmente, em toda a máquina pública nos 13 anos dos governos petistas, a corrupção bolsonarista ainda estaria longe do nível de linha de montagem desbravado pela Lava Jato.
Sempre que pode, ele e sua tropa afiada nas redes sociais relacionam eventual volta do petista à retomada do modelo corrupto que degradou toda a classe política.
— Querem voltar à cena do crime — disse há dias, repetindo uma frase de Geraldo Alckmin dos tempos em que ele não andava de braços dados com seu opositor.
Problema é que está a cada dia mais sem condições de assacar a assimetria e atraindo tantas referências a corrupção quanto Lula, apuradas em pesquisas.
A corrupção do seu governo, que começa a aflorar na distribuição de verbas pelo Centrão e o clientelismo rastaquera do MEC, tem a mesma genética dos governos de cooptação do PT e de fato está longe de poder ser equiparada sem alguma injustiça.
Mas, como na velha máxima de "quem faz um cesto faz um cento", emulam a mesma impressão de degradação moral e parâmetro de desonestidade. Se Bolsonaro é capaz de fazer vista grossa para um, faz para 100.
Está muito além das denúncias de "rachadinha", para os quais até pouco tempo seu eleitorado também fazia vista grossa, com base na mesma contestação de parâmetros.
A ideia principal que aflora, simétrica com a dos governos petistas, é de conluio do Palácio com a parte mais baixa do Congresso para assaltar a máquina pública por interesses pessoais e eleitorais. Em desvios de verbas, superfaturamentos e propinas, de que o noticiário já está cheio.
Tudo indica que Bolsonaro contava com a perspectiva de julgar a culpa no Congresso. Pisar na lama e permanecer limpinho, como pretendeu Lula ao mandar o ministro chefe da Casa Civil José Dirceu abrir as pernas para o Centrão.
Como Bolsonaro, que manda hoje Ciro Nogueira, no mesmo cargo, repetir a simetria em parceria com o presidente da Câmara, Arthur Lira.
— Eu não sabia de nada — parece ter pensado em dizer no dia em que se descobrisse que algum pastor encaminhado por ele ao MEC tomaria dinheiro de prefeituras ou que prefeitos aliados do presidente da Câmara comeriam 79% das verbas do FNDE em kits de robótica superfaturados.
A essa altura, está difícil para Bolsonaro falar em corrupção nos governos petistas sem ter que explicar as próprias. Não adianta falar em tamanho, volume, carros fortes. Quem faz um cesto faz um cento.
É uma discussão cada vez mais desconfortável para ambos, que deve ir sumindo do debate eleitoral, por conveniência recíproca. Da mesma forma que as denúncias de caixa dois nas campanhas mais sub contabilizadas da história, as de Dilma Rousseff e Aécio Neves, em 2014, foram sumindo dos últimos programas eleitorais.
Não vão me fazer falta. Não acho que seja o mais determinante entre os dois, simétricos na mesma tentação totalitária de aparelhamento da máquina para tomada do poder e seu uso para corromper as eleições e conspirar contra o revezamento democrático.
Não vejo diferença entre ambos. Tendo até a achar Bolsonaro, um boquirroto de ideias obtusas a respeito de segurança contra comunistas que vê debaixo da cama, menos nocivo ao sistema democrático, até por transparência auto incriminatória e falta de tempo.
A esquerda que ama Lula comanda uma bem sucedida guerra cultural de efeitos muito mais duradouros. Vem dos anos 60 e está na raiz da ideia de tomada subterrânea do poder pela infiltração nas instituições culturais — universidade, imprensa, indústria cultural — e no estamento burocrático, com a exclusão dos diferentes.
Bolsonaro é apenas um capitão simplório, de forte intuição política e marketing eleitoral, o animal político, mas um pato longe dessa sofisticação.
Donde que "corrupção" já não é um bom parâmetro para diferenciá-los, mas "democracia" também não.
O parâmetro que talvez os iguale com mais consistência perante o eleitorado, sem maiores controvérsias, é o de caráter. É quase certo que o eleitorado que não os quer de forma alguma os ache, com boa dose de razão, que são grandes enganadores.