Por ter sido indicado por Jair Bolsonaro e por algumas de suas decisões controversas por beneficiarem o Planalto, o ministro Nunes Marques ganhou a fama não de todo injusta de bolsonarista.
Em nome disso, está apanhando de forma também injusta por ter derrubado monocraticamente a decisão colegiada do TSE que cassou o deputado do Paraná, Fernando Francishini, por ter postado um vídeo no dia da eleição de 2018 sobre fraudes nas urnas.
Mas a decisão que vem sendo tomada como crime de lesa-pátria mesmo por veículos de comunicação e comentaristas sérios, tem pelo menos quatro bases fortes, que a maioria do noticiário político sonega:
1. A decisão foi retroativa, adotando jurisprudência nova, de 2021, para punir o candidato por entendimento que não existia em 2018 a respeito de redes sociais como conceito de órgão de comunicação, fake news (que aliás é expressão não contemplada na legislação brasileira) e redistribuição da contagem de votos em caso de cassação.
— É claramente desproporcional e inadequado, com a devida vênia, por uma simples analogia judicial — aliás com eficácia retroativa —, equiparar a internet aos demais meios de comunicação. Ninguém poderia prever, naquela eleição, quais seriam as condutas que seriam vedadas na internet, porque não havia qualquer norma ou julgado a respeito.
2. Os ministros do TSE contabilizaram os 105 mil comentários, 400 mil compartilhamentos e 6 milhões de visualizações do vídeo como benefício ao deputado que teria deturpado o pleito. Mas a contabilidade só foi atingida mais de um mês depois da eleição sobre uma peça que havia sido veiculada a 20 minutos do fechamento das urnas. Não há nenhuma prova de que o número pudesse tê-lo beneficiado. Nem havia tempo útil.
— Ora, em que medida a live, realizada nos vinte minutos restantes destinados à votação, teve o condão de produzir resultado concreto em benefício do candidato, de modo que se permitisse aquilatar a gravidade dos fatos?
3. Ao cassar os 427.749 votos do deputado, o TSE cassou outros três que nada tinham a ver com isso, puxados por ele na legenda do PSL para as cadeiras da Assembleia Legislativa. Até 2018, o entendimento era de que, em caso de cassação ou afastamento, os votos permaneciam na legenda. Eles sequer eram parte do processo.
— Trata-se de inequívoco marco normativo que não só estabelecia as regras do jogo como também garantia a cidadãos, candidatos, partidos e coligações a ciência do que esperar quanto à contabilização dos votos. Desse modo, a aplicação retroativa fere de morte as garantias fundamentais relativas à proteção da confiança do jurisdicionado e à segurança jurídica do processo eleitoral.
4. Não é verdade que ministro do STF não possa derrubar monocraticamente uma decisão do TSE, a principal acusação que lhe fazem. Em 2018, Gilmar Mendes deu liminar em situação igual, devolvendo o mandato a Marcelo Miranda, do Tocantins. Em 2020, Ricardo Lewandovski cassou outra decisão que estabelecia proporcionalidade do uso do fundo eleitoral entre candidatos brancos e negros.
A pancadaria no caso Francischini foi ainda ampliada pela decisão do ministro, no mesmo dia, de devolver o mandato de deputado federal a Valdevan Noventa, do PL de Sergipe e também bolsonarista, que comprovadamente comprou votos na eleição de 2020.
Mas, ainda assim, o ministro se baseou no fato singelo de que o deputado não teve direito de defesa, na medida em que o acórdão do TSE sequer foi publicado.
— Trata-se de flagrante cerceamento de defesa, a violar a inafastável garantia fundamental do devido processo legal. Não é razoável que o requerente seja penalizado pela execução da decisão colegiada sem que se lhe oportunize o instrumento recursal constitucionalmente assegurado.
No resumo da ópera, ministros bolsonaristas ou petistas, que também os há, não dariam decisões tão contraditórios e provocariam maiores danos ao devido processo, se os ministros das supremas cortes não estivessem escorregando feio desde que resolveram atuar jacobinamente, não só fora dos autos.
Não é difícil e nem ilegítimo contestar decisões do TSE e do famigerado inquérito das fake news, tocado por Alexandre de Moraes, que mandam prender e retirar o financiamento de internautas que não são candidatos, por delitos difíceis de serem configurados como crime, até que tenham pelo menos direito de defesa. O que não tem havido.
Alexandre de Moraes acabou de mandar bloquear todas as contas do Partido da Causa Operária, de extrema esquerda, antes de initimá-lo, por ataques ao STF que, com boa vontade de interpretação, não deveriam passar do entendimento de opinião.
O presidente Rui Pimenta disse algo forte e inútil, bem no seu proselitismo agressivo e irresponsável, típico de extrema da extrema esquerda, mas sem qualquer sinal de ação concreta que possa colocar em perigo o Supremo e seus ministros. Com boa vontade, pode ser enquadrado no tipo de proposta que volta e meia circula dentro do Congresso.
— Em sanha por ditadura, skinhead de toga retalha o direito de expressão, e prepara um novo golpe nas eleições. A repressão aos direitos sempre se voltará contra os trabalhadores! Dissolução do STF. É preciso adotar uma política concreta contra a ditadura do STF. Lutar pela dissolução total do tribunal e pela eleição dos juízes com mandato revogável.
Tomara que alguém apresente um pedido de liminar e outros ministros do STF, bolsonaristas ou petistas, tenham a coragem que teve Nunes Marques de cassar a decisão. Que pessoas como Francischini, Noventa ou Pimenta, como eu e você, tenham pelo menos direito de defesa antes de cassados ou bloqueados.