Em minha última coluna, destaquei alguns pontos relevantes que devem estar em nossas mentes ao buscar solução eficiente para um importante gargalo da atualidade, a dramática crise financeira subnacional. O primeiro foi a recente explosão dos déficits previdenciários locais, e, junto com eles, a consequente disparada dos déficits orçamentários globais de cada ente.
O segundo é a extrema rigidez dos demais itens do orçamento corrente, dificultando a sua contribuição para o esforço de ajuste. Essa rigidez decorre de esses itens terem se tornado os “queridinhos” da ação pública, algo que foi longe demais e precisa ser revisto. (Revisão essa que é, talvez, o que o ministro Paulo Guedes chama de “desvinculação”.) O terceiro ponto que enfatizei foi a resultante e nova escalada da queda dos investimentos, levando, em conjunto com o viés ante privado que predomina, à atual situação de terra arrasada na infraestrutura, tradicional pagador de boa parte dessa conta.
Sem avançar no tratamento desses pontos, a péssima notícia que se adiciona a esse quadro é o surgimento de atrasados orçamentários vultosos, punindo vários segmentos no outro lado do balcão, e contrariando, sem penalidade alguma, leis básicas como a de Responsabilidade Fiscal, que proíbe a transferência de atrasados para outros mandatos.
Assim, ou se reveem as prioridades nacionais conforme estas se revelam nos orçamentos públicos (eliminando também o viés ante privado), ou se muda radicalmente a Previdência, reduzindo seus déficits, para tirar o país do atoleiro.
Bem que as diligentes autoridades previdenciárias federais vêm tentando solucionar o problema junto aos entes subnacionais com os instrumentos de que dispõem, no caso mediante a imposição de uma alíquota extraordinária bancada pelo Tesouro local, calculada com o objetivo de zerar o seu passivo atuarial. Isso revelaria por outro caminho (ou seja, pelo tamanho da alíquota extraordinária média requerida) a dimensão do problema e, portanto, do sacrifício imposto ao orçamento. E estimularia os entes a estruturar e depois aportar ativos para reduzir a necessidade de recursos públicos convencionais, introduzindo um novo e importante elemento no kit de soluções – o aporte de ativos.
Onde essa alíquota coubesse sem maiores estragos, o problema estaria resolvido. Onde isso não fosse possível – infelizmente, a maioria dos casos –, os entes menos preparados tenderiam a recorrer à Justiça para não implementá-la. E tome mais e mais atrasados.
Outra saída tem sido a adoção da “segregação de massas”, uma forma gradual de capitalizar a Previdência, aceita pelas autoridades, que estimula (mas não garante) o desejável aporte de ativos nos fundos para ajudar a equacionar o buraco previdenciário.
Pela segregação de massas, o comum é destacar, num fundo capitalizado, a massa de servidores ativos que ingressarem a partir de uma certa data, que passaria a receber as contribuições de ambas as partes. Uma boa segregação é aquela que induz os entes a aportar ativos nos fundos, a fim de lastrear a “transferência de vidas” ou dos aposentados mais velhos dos fundos financeiros para os capitalizados, diminuindo a pressão sobre os respectivos orçamentos.
Um inconveniente da segregação é estimular novos administradores a torrar os recursos acumulados por seus antecessores, aprovando leis que permitam aos do momento usar recursos poupados anteriormente na cobertura de déficits correntes. Foi o que fizeram lá atrás vários estados em todos os rincões do país.
Diante da elevada dimensão do problema, temos, então, dois caminhos básicos a trilhar simultaneamente para adequar as despesas aos recursos disponíveis nas previdências subnacionais. Um é o aporte e a posterior monetização de ativos. O outro, cuja importância é mais visível, é a velha reforma das regras da Previdência.
Nesse sentido, é difícil entender por que um certo grupo de dirigentes estaduais se mobilizaram contra a inclusão de suas administrações nos segmentos atingidos pela recente votação na Câmara dos Deputados.
Reformas, como se sabe, não são fáceis de aprovar, nem é fácil aparecerem seus efeitos benéficos sobre os orçamentos públicos, pois estes normalmente demoram a acontecer. Sem firme apoio financeiro da União no curtíssimo prazo, a pouca dedicação de alguns dirigentes subnacionais à sua aprovação costuma ser explicada com o argumento de que o desgaste político junto às comunidades locais (onde predominam grupos bem-organizados de servidores) é muito alto em relação aos escassos benefícios que elas proporcionam no curtíssimo prazo. Dessa forma, a União e as demais esferas devem se sentar novamente à mesa e negociar uma solução que atenda minimamente a todos, pelo bem maior do país.