O “x” da questão nas discussões de campanha deste ano deveria ser como o país vai recuperar o fôlego para crescer minimamente. Na última década, a variação média do PIB acabou ficando ao redor da frustrante taxa negativa de -0,6%, depois de duas décadas em que, primeiro, se patinou à média de 2,6% e, segundo, claudicou-se a 3,9% a.a. Cheirou a “voo de galinha”...
Minha tese é de que, no coração do desempenho medíocre do PIB, está a forte escalada ascendente dos gastos previdenciários em todas as esferas de governo, desde 2006, sem tratamento adequado dos crescentes déficits que foram se acumulando, em que pese as reformas aprovadas recentemente, e em conjunto com a desabada dos investimentos públicos em infraestrutura, que virou uma mera consequência daquele problema central. Não há, obviamente, como fazer que itens de valor elevado como o desses dois caibam em um único e limitado espaço. Cabe aos responsáveis pela condução da política econômica explicar que soluções têm em mente para sair desse imbróglio.
Investimento é o item mais flexível dos orçamentos públicos, e, ao mesmo tempo, é o que tem a trajetória mais fortemente correlacionada com a do PIB. Em um país em que o investimento privado em infraestrutura, ao contrário dos sonhos oficiais, mal dá as caras, e os governos estejam proibidos eles próprios de se endividar para investir, quando uma variável crítica como o gasto previdenciário sobe, dificilmente a outra (investimento, e, portanto, o PIB) deixará de cair. Se não se fizer algo, uma hora os investimentos (e o crescimento do PIB) simplesmente zeram.
Trazendo o caso concreto do estado do Rio à tona, entre 2006 e 2021, enquanto os gastos previdenciários cresciam 78,3% acima da inflação, os investimentos caíam 58,6%, também em termos reais. Chocante, não é? Como reverter isso? E não é exatamente o Rio que, agora, vive uma fase super-favorável diante da forte subida dos royalties do Petróleo e da elevada arrecadação também com a venda de empresas, como a expressiva Cedae, e tendo ainda o reforço de algum aporte relevante de ativos à vista como a arrecadação do Imposto de Renda na Fonte dos servidores, que no Rio já está em fase de regulamentação? Aqui, o problema é que, uma hora, o preço do barril volta à não tão alta (como está hoje) linha de tendência de médio prazo, e o dinheiro da Cedae é gasto e se vai...
A saída, na verdade, é atacar, de frente, o problema número 1, o previdenciário, ou seja, promover o equacionamento dos déficits financeiros e atuariais dos regimes próprios de previdência, o que implica zerá-los, mediante um roteiro que é razoavelmente conhecido, mas que pode obviamente ser aperfeiçoado onde sua implantação apenas tenha começado.
Seguindo o ritual vigente, o estado do Rio já fez uma “segregação das massas” dos servidores, por enquanto incipiente, mediante a abertura de dois fundos em uma data recente: o primeiro seria um fundo previdenciário ou capitalizado, inicialmente formado pelas contribuições patronais e dos servidores que ingressassem a partir daquela data, que já deveria nascer equilibrado financeira e atuarialmente por definição, onde os recursos seriam aplicados nos mercados financeiros. Hoje esse fundo já existe e tem um superávit atuarial de R$ 1,7 bilhão, com resultados financeiros positivos todos os anos (em 2021, R$ 0,4 bilhão), por ainda ser um fundo jovem que tem 20 mil participantes e apenas 202 que recebem benefícios. Paralelamente, a idade média de seus participantes ativos é em torno de 40 anos, significando que a grande maioria vai ainda levar muito tempo para se aposentar. Já o segundo seria um fundo puramente financeiro, ou seja, um fundo convencional em repartição simples, onde estão localizados os que haviam ingressado antes de setembro de 2013.
O fundo financeiro contém 106 mil servidores ativos e 198 mil aposentados e pensionistas, quase o dobro, sendo de 52 anos a idade média dos ativos, de forma tal, que a maioria está próxima de se aposentar. Sem considerar as receitas não convencionais que hoje estão carimbadas para a previdência, esse fundo teve um déficit financeiro de R$ 9,2 bilhões em 2021, que aumentaria para R$ 14,5 bilhões, se adicionássemos o déficit dos militares, atualmente administrados à parte.
Quase por construção, o fundo capitalizado teria de estar equilibrado financeira e atuarialmente, estando sujeito a uma avaliação atuarial periódica tal que, se indicasse déficits, geraria um plano de equacionamento em cima do laço para eliminá-lo. Já em relação ao segundo, a saída seria encontrada de forma indireta, ou seja, pelo aporte de novos ativos reais no fundo previdenciário, e pela transferência simultânea de “vidas” (servidores) do plano financeiro para ele, a serem recepcionadas, para sustentação, pelos novos ativos aportados. Dessa forma, o plano puramente financeiro iria gradativamente encolhendo e se transformando em um plano capitalizado e, portanto, equilibrado, até existir apenas um fundo. Ao fim e ao cabo a previdência se tornaria equilibrada.