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ECONOMIA

Piauí dá o exemplo no equacionamento da previdência - primeira parte

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A previdência é a maior despesa da União e de todos os Estados. Muitos municípios enfrentam o mesmo problema. E como há limites mínimos para os gastos em várias áreas igualmente importantes, e que também já têm um grande peso no total, são os gastos discricionários quem paga a conta, especialmente os investimentos em infraestrutura, prestes a zerar (daí à queda do crescimento do PIB é só um passo).  Para piorar, a nossa previdência foi concebida no modelo de repartição simples, em que as contribuições dos ativos bancam as despesas dos aposentados e pensionistas. No princípio, sobram receitas, pois o número de aposentados e pensionistas é bem menor do que o de contribuintes, e os gestores ficam eufóricos com a folga de caixa. Só que, uma hora, o sistema envelhece e os déficits financeiros e atuariais (ou de longo prazo) explodem. Para piorar, o Brasil está envelhecendo mais rapidamente que o resto do mundo, e isso só agrava o difícil quadro anterior. Sem atentar devidamente para isso, os formuladores do “arcabouço fiscal” vão acabar disparando suas baterias basicamente para os ganhos de arrecadação, o que dificilmente resolverá o problema fiscal brasileiro.




 
Só com a Emenda 20, no final de 1998, e a Lei 9.717, foi que se começou a organizar de verdade a previdência dos servidores públicos do Brasil, principal foco desta análise. Passamos ali a ter na própria Constituição a obrigação do equilíbrio financeiro e atuarial dos regimes próprios. E a saída básica para isso é implantar a sua capitalização. Com a Emenda 103/19, deixou-se mais claro o que é equilíbrio financeiro e atuarial, e, assim, não há mais margem para manipulação de números e de fugir do debate certo. Em grande parte dos municípios foram criados regimes próprios na década de 1990, e, assim, não se acumulou, nesse último grupo, um período muito grande sem capitalização.
 
Como dito, o modelo ideal é uma capitalização integral, como parte dos municípios fizeram. Pelas regras em vigor, faz-se um “plano de amortização” que se destina a cobrir, dentro de no máximo 35 anos, todo o déficit atuarial do regime em causa, mediante uma alíquota suplementar ou aportes financeiros periódicos. Só que, para um regime muito antigo, quando o déficit é muito grande, essa alíquota extraordinária fica muito elevada, como já se viu em certos casos concretos.
 
Uma segunda possibilidade, que foi a que a maior parte que tentou equacionar o déficit levou a cabo, foi a chamada “segregação de massas” em que se dividem os servidores em dois grupos, um fundo em repartição simples, e um fundo capitalizado, este um fundo que já nasce com equilíbrio financeiro e atuarial garantido e que vai continuar existindo no futuro. Já o outro é um fundo financeiro, em extinção, onde não entra nem um novo servidor, e que vai ser extinto quando não houver mais qualquer participante nele, sendo o déficit desse fundo coberto pelo Tesouro do ente respectivo.




 
Qual a vantagem desse modelo relativamente ao anterior, do plano de amortização? É que vai ter um equacionamento ao longo de um período de tempo mais longo, algo entre 80 a 90 anos, período em que ainda vai haver pessoas dentro daquele fundo em extinção. É talvez a saída mais adequada para estados como o meu Piauí, em função de o déficit ser ainda elevado, apesar das inúmeras reformas que já fez. Cabe destacar que, muito antes da Emenda 103, o Piauí já estava fazendo diversas reformas ao longo de 2015 e 2016, não tanto na parte de benefícios, pois na época isso não seria possível (já que a regra era única e nacional), mas em relação ao custeio do sistema, em que o Piauí aportou imóveis ao seu regime previdenciário, com o intuito de reduzir o déficit, além de ter tomado outras medidas. Com efeito, no momento em que foi a aprovada a Emenda 103, que deu autonomia aos Estados para aprovarem suas reformas, o Piauí foi um dos primeiros a aprovar a sua, e a que fez foi uma das mais amplas dentre todos os estados brasileiros. Ou seja, fez o dever de casa dentro do possível tanto do lado do custeio (como no caso do aporte de ativos à previdência), como do lado do ajuste de benefícios. Só que, nada obstante a redução substancial do déficit previdenciário, ainda resta um déficit expressivo a equacionar.
 
O grande drama da segregação de massas é que, durante décadas o fundo financeiro vai tendo cada vez mais servidores aposentados e não está entrando mais ninguém novo lá, ou seja, cada vez mais despesa e cada vez menos contribuições. Enquanto isso, no fundo capitalizado, durante décadas não vai ter quase nenhuma despesa, pois só vai ter servidores jovens, a não ser um caso ou outro de pensão por morte, ou de aposentadoria por invalidez, o que leva à acumulação de muitos recursos, recursos esses que, quando se tinha um fundo único, ajudavam a pagar os benefícios dos aposentados – agora não mais. Esse, aliás, é o grande custo de transição que se tem quando se faz a segregação apenas por data de ingresso. E, assim, o que se vai ver é durante 3, 4 décadas só crescendo o déficit do fundo financeiro, enquanto o fundo capitalizado, por mais que esteja equilibrado atuarialmente, do ponto de vista de recursos financeiros, ele vai acumulando um volume cada vez maior. (Em minha próxima coluna daqui a 15 dias concluirei a análise da questão previdenciária piauiense).