Diante da difícil viabilização financeira dos regimes previdenciários de “repartição simples” que a maioria dos países tentou adotar, pois neles em algum momento o número de beneficiários passa a aumentar sistematicamente a taxas mais elevadas do que as relativas aos contribuintes, resulta o inexorável aumento dos respectivos déficits previdenciários, ao lado da expansão cada vez mais forte da fatia do item previdência nos orçamentos públicos. Daí à queda dos investimentos em infraestrutura e do crescimento do PIB é apenas um passo.
Diante disso, o setor público brasileiro tem aprovado reformas de regras, visando a reduzir os novos gastos, como a última sob a Emenda 103/19, que, inclusive, clareou, definitivamente, o significado da expressão “equacionamento previdenciário”, tarefa essa que passou a ser exigida desde a edição da Emenda 20/98, mas que, até ali, não tinha, infelizmente, recebido a devida atenção por parte das autoridades com responsabilidade sobre esse assunto.
Outra medida estabelecida pelas autoridades de Brasília foi o cálculo de uma alíquota extraordinária para zerar os déficits atuariais, a ser paga pelos entes respectivos envolvendo no máximo 35 anos. Para reduzir tal alíquota, podem ser aportados ativos diversos de propriedade dos entes à sua previdência. Caso, mesmo assim, ela fique muito alta, parte-se, como etapa final desse mesmo processo, para a capitalização da previdência dos novos entrantes.
Tipicamente, isso se faz inicialmente por meio de uma “segregação de massas”, separando os participantes em dois grupos: um deles contendo os mais antigos, que haviam ingressado até uma certa data de corte, e no outro, os que ingressassem a seguir. O primeiro é conhecido como “plano financeiro”, onde os benefícios são pagos, como até então, com base na arrecadação com eles relacionada ou se transformam em déficits a serem financiados pelo ente público respectivo. E o outro é mais referido como plano capitalizado.
Nesse último caso, evoluiu-se para um regime em que se capitalizariam as contribuições associadas aos que ingressassem no sistema a partir de um certo momento presente, para lastrear, com aquelas, o pagamento dos futuros benefícios que os novos membros perceberiam, mediante regras costumeiramente definidas, enquanto se decidiria o que fazer para cobrir as necessidades de financiamento dos gastos com os que tivessem ingressado antes dessa data de corte.
Foi dentro dessa última busca que surgiu algo que passou a ser chamado de “custo de transição” (isto é, da transição entre a antiga e a nova situação), que é dado pelo montante das contribuições associadas aos que ingressassem a partir da citada data de corte, que antes engrossariam as receitas do regime de repartição, mas que agora não mais poderão exercer esse papel, ao serem naturalmente direcionadas para os novos fundos previdenciários que sejam criados a partir dali.
Esse custo decorre, assim, de os benefícios devidos aos mais antigos não mais poderem ser pagos diretamente com a ajuda das contribuições dos mais novos, que agora serão exclusivamente voltadas para obter um certo rendimento no futuro, o que passou naturalmente a exigir a adoção de providências compensatórias.
Depois de muita discussão em torno do assunto (com destaque para as posições de Leonardo Rolim, como se pode ver pelos debates do Fórum Nacional em https://www.youtube.com/watchv?=O6CRqiP_KtM), surgiu a solução de se fazer uma “transferência dinâmica de vidas” (vidas, obviamente, de segurados) do fundo financeiro para o fundo previdenciário, contemplando parte da parcela mais envelhecida dos beneficiários do primeiro desses fundos, cujos benefícios seriam, assim, lastreados pelos recursos acumulados a partir das contribuições dos novos servidores atrelados ao fundo capitalizado.
Simultaneamente, e para fazer a devida compensação de fontes de financiamento, se escolheria uma nova fonte do ente público em causa (como, por exemplo, o Imposto de Renda Retido dos Servidores – IRRF, na dimensão correta), que seria “vinculada” via o instrumento legal cabível, à previdência do ente respectivo, e serviria de lastro para o pagamento dos benefícios dos servidores que ingressassem a partir da data de corte, no devido momento futuro.
Para encerrar, o estado do Piauí e a Prefeitura de São Paulo vem se preparando para adotar tais soluções, agora já em fase de materialização da perspectiva de aumentar os investimentos de forma expressiva, este o objetivo fundamental de tudo isso, em comparação com a hipótese de nada fazer em termos de ajuste de suas contas. Assim, em vez de assistir impávido ao aumento do seu déficit previdenciário de R$ 1,6 bilhão, em 2019, para R$ 1,8 bilhão, em 2022, e R$ 2,3 bilhões, em 2032, o Piauí reduziu esses números para apenas R$ 0,2 bilhão, em 2022, e R$ 0,7 bilhão, em 2032. Por conta disso, em vez de o Estado fechar seus investimentos em R$ 0,2 bilhão em 2022, e praticamente zerá-los em 2032, poderá obter R$ 2,1 bilhões de investimentos em 2022 e R$ 1,6 bilhão em 2032. Viva eles!