Você já sentiu vergonha alheia? Esta expressão que corre por aí para explicar o constrangimento de quem presencia uma situação de vexame público. É isto. É isto que muitos de nós brasileiros e brasileiras – não todos – sentimos diante do insulto de extremo mau gosto dirigido contra a esposa do presidente da França, Emmanuel Macron, por um internauta, ao qual, por incrível que pareça, o presidente Bolsonaro respondeu com grande camaradagem.
Não é novidade para os brasileiros as declarações de péssimo tom vindas do nosso presidente desde quando ainda era deputado. E o curioso é que isto lhe trouxe uma grande notoriedade, nunca tida antes. O mais incrível de tudo, porém, é que ele foi escolhido democraticamente pela maioria dos brasileiros para representá-los. Que país é este?!
E, desde então, estamos lidando com suas declarações impensadas e politicamente equivocadas – para não dizer mal-educadas. E algumas subsequentes retratações. Mas desta vez bateu fundo.
O culto à juventude e beleza, à desejável mulher-objeto, ao corpo perfeito como única forma de fazer-se desejável é cruel. É machista e pobre. Exclui da mulher madura o direito de ser desejada. Homem que deseja uma mulher madura, linda como a esposa de Macron, segundo pensam alguns, deveria ficar humilhado frente a homens maduros com esposas jovens. Estes, sim, são machos!!
E quando esta mulher nova ficar velha será trocada como se troca um carro. Pois a jovem é símbolo de macheza. De um falo poderoso, ereto, que subirá para as abaixo de 30, não importa quanto Viagra tomar. Aleluia!!
E o homem quando não sabe o que fazer com seu penduricalho – assim Jacques Lacan chamou o órgão sexual masculino, referindo-se à dificuldade de os homens se casarem com seu próprio falo, única condição da potência viril –, pode comprar um carro novo ou mulher nova para assim se sentir mais vigoroso ao exibir-se aos outros como macho alfa.
Esta atitude de muitos homens leva as mulheres a se submeterem à cruel exigência de ser sempre jovem, isto visto na comparação entre a primeira-dama brasileira e a francesa, considerada motivo de humilhação para seu companheiro.
No Brasil, é pagode, axé e funk. Nada contra. A gente balança quando escuta porque o ritmo é forte. Mas a música acabou: agora temos sexo explícito no barulho brega.
Evidente que todo o mundo se voltou para a Amazônia. Incêndios de grande proporção e o governo demorando a adotar ações efetivas, que só vieram depois que o mundo desabou sobre nós. Um dos maiores biomas do mundo não poderia queimar diante de nossos olhos sem que o mundo todo chorasse. Feridas na soberania?
Oras, temos suportado muitas. Já estamos habituadas às feridas sofridas à soberania. De nossas mulheres. Espancadas. Mortas e assassinadas pelos machistas que não confiam no seu penduricalho e não sabem mais o que fazer sem elas.
Está ainda impune o assassino de Marielle Franco. E outros, de tantas mulheres. As lindas, as feias, as gordas, as magras, as jovens, as maduras, as pobres e as ricas. As mulheres do Brasil estão ardendo. Nossos rostos queimam de vergonha. E os de nossos homens, os bons, também. Só podemos agora pedir ao mundo todo que também gritem por nossas mulheres.