Jornal Estado de Minas

Haverá mais solidariedade e menos desigualdade pós COVID-19?

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Continuamos em tempos de solidão e isolamento sem abraçar nossos queridos, sem contatos com amigos e sem bares ou restaurantes onde possamos nos encontrar e conversar longamente, olhando nos olhos das pessoas que nos escutam e que escolhemos para compartilhar o tempo.




A saudade é grande e aumenta a cada dia e, embora possamos nos falar vencendo a distância e facilitados pelo contato virtual, mesmo assim, a consistência da presença de um corpo nos faz falta. Muita falta. E não sem motivos, muitos artistas estão se expressando através de lives que nos tocam e emocionam fazendo com que nos sintamos menos sós. Agradecemos.

Também somos gratos a poetas, que não se esqueceram de escrever lindos versos. Os psicanalistas trabalhando bastante e chegando até nós com contribuições inestimáveis de seu esforço, não apenas clínico on-line para aqueles que desejam continuar suas análises, principalmente neste momento sensível da humanidade.

Também tem nos oferecido sua preciosa contribuição política e nos agraciam com reflexões generosas sobre o isolamento, o capitalismo, o esgotamento do planeta e toda uma posição ética de nunca deixar de lado as subjetividades que atravessam juntos este momento.



E nos perguntamos todo dia o que, como psicanalistas, podemos fazer nesses momentos para contribuir com este tempo em que – sozinhos e sem distrações –  a reflexão pode evocar antigas e recentes angústias, ansiedades, depressão e coloca em risco a sanidade, a saúde psíquica e, especialmente, nos iguala a todos sob o mesmo risco.

Ela nos ajuda a lembrar que embora juntos com todo o mundo num mesmo intento de vencer um inimigo invisível e silencioso, quando os mortos se tornam estatística, números que crescem ou decrescem a cada dia, ainda existe em cada indivíduo um sujeito.

Sujeito único e singular que não pode ser esquecido. Um sujeito que se escutando pode encontrar em si motivação para produzir, criar, inventar um modo de se superar, apesar de tudo.

Vivemos um momento raro, embora não único. Outros momentos de sofrimento foram também vivenciados quando surgiu a Sida, ou Aids, quando não havia remédio nem explicação para aquele vírus que consumia as pessoas e que mais parecia um castigo divino tomado pelo viés da moralidade religiosa para acusar aqueles que ousaram assumir sua homossexualidade.



A peste bubônica, chamada peste negra, transmitida por ratos infectados e pulgas, assolou a antiga Eurásia, levando à morte mais de 100 milhões de pessoas. A varíola, chamada bexiga, durou 3 mil anos e só foi erradicada em 1980.  A cólera atingiu escala global em 1817, dizimando centenas de milhões de pessoas.  A gripe espanhola, em 1918, contaminou um quarto da população global. A gripe suína, H1N1, já no século 21, matou 16 mil no mundo.

Sobreviventes, estamos aqui e ainda para refazer trilhos, cursar outros caminhos, atravessar nuvens negras, olhar o céu azul e o outro como semelhante. Porém, embora muitos desejem uma mudança no mundo depois desta experiência dura e esperem mais solidariedade e respeito, menos desigualdade, mais fraternidade, nem todos acreditam que o mundo mudará depois desta pandemia, pois o capitalismo selvagem não escuta, não sente, não se condói senão de suas próprias perdas. Seus valores são contábeis, estatísticos, monetários e a mão invisível do mercado só se estende em direção a investimentos, insensível ao sofrimento humano.

Portanto, só podemos agora aguardar que o tempo cure nossos ares deste vírus, e devemos colaborar com o movimento mundial de isolamento, que é até agora o único meio de controle ao nosso alcance. Mas, como bem sabemos, os homens nem sempre escolhem o melhor. Embora saibam o que seria o melhor, fazem o que querem e não o que lhes convém. Como disse Cazuza, vitimado por uma das grandes pestes que abateram muitos homens e mulheres: “Vamos pedir piedade, senhor, piedade pra esta gente careta e covarde”.