Uma das coisas mais admiráveis que o ser humano pode alcançar é a capacidade de realizar seus desejos.
De chegar onde quer, por ter objetivos claros e que se banque, se julgue à altura de ser digno desta satisfação.
Falo isso porque nas nossas experiências clínicas encontramos muitas pessoas, senão a maioria, com dificuldades no caminho. As dificuldades são de diversas naturezas, por um sentimento de culpa difuso que não conseguem eliminar, por terem sido desde muito cedo colocadas pelas mãos dos outros em lugares de apoio, de completar o outro, de servir a pais narcisistas, mais preocupados consigo próprios do que com a prole e muitas outras situações.
Situações estas que nem conseguiríamos descrever, mesmo que quiséssemos, porque são inumeráveis e inenarráveis as multiplicidades de cada família, de cada educador, de cada criança que vem ao mundo.
Nunca serão totalmente reveladas as verdades que restam da intimidade de cada núcleo familiar e as consequências para cada um de nós que nascemos nas mãos do outro.
A vida é sinuosa e nos leva para lugares nem sempre tão bons se somos indeterminados, se nada sabemos sobre o que desejamos, se ficamos por conta do acaso, ou quando nada sabemos sobre o que é a nossa verdade mais íntima e andamos às cegas pela vida.
Dotados que somos de um inconsciente sobre o qual nada ou quase nada sabemos, detectar o desejo torna-se difícil, tateamos, andamos em círculos, repetimos situações que trazem sofrimento. Sem sair de uma fantasia fixa que traz à tona nossos maiores medos.
Ai daqueles que assim passam a vida, sem experimentar a alegria que nos acomete quando pequenos desejos são alcançados e maior ainda é a satisfação quando nos apropriamos do que queremos, da vida que desejamos, da maneira de passar os dias, fazendo o que queremos e que nos traz conforto.
É que desejos são o maior motivo da vida. Para alguns, um grande problema, pois frequentemente não queremos o que desejamos de fato. Por exemplo, ninguém escolhe porque o desejo se estabelece à revelia da vontade. Como dizemos popularmente, ninguém manda no coração.
Seria este o caso de alguns homossexuais que não podem admitir sua condição de homo. E, portanto, não podem lidar com o verdadeiro desejo, que é invertido, e então a vida fica bastante complicada, pois depende da manutenção de uma grande força de negação. E geralmente são, eles próprios, homofóbicos.
Porém, o desejo é a mola da vida, sem ele a vida não tem sentido. E sem desejo deprimimos. O desejo nos faz andar para frente. Ele provém do vazio. Nós desejamos o que não temos. Ele nos torna criativos, brota em nós como sementes. Trazê-lo à consciência, mesmo parcialmente, tem efeitos significativos na vida.
Segundo Platão, em seu livro “O banquete”, vários filósofos se reúnem para falar sobre o amor, o que ao final os levou do amor ao desejo. Eros, o Deus do amor e desencadeador do desejo humano com suas flechadas, nasceu do encontro entre Pênia, a pobreza, e Poros, a riqueza.
Entende-se com isso que o desejo nasce da falta, pois desejamos o que não temos. Mas também vem da riqueza proporcionada no bom encontro do sujeito com seu próprio desejo, dando sentido ao seu mundo, levando-o à realização capaz de trazer alegria e contentamento.