Iniciamos o ano com a posse de Lula. Depois de muito protesto e temor sobre o que poderia ocorrer no dia da posse, pois temíamos represálias de bolsonaristas que desejavam a intervenção do Exército, ou seja, um golpe de Estado, pois esse é o nome que podemos dar quando o candidato eleito é impedido de tomar posse por forças militares.
De fato, o bolsonarismo brotou e cresceu, muito mais pelo antilulismo do que pelas virtudes do então presidente. Ele foi deselegante do início ao fim, e desde antes. Desligado do Exército, nunca prestou grandes serviços como deputado, disse que mulher feia não merece nem ser estuprada. Como presidente, atrasou a compra de vacinas durante a epidemia – o Brasil é um dos países com maior número de vítimas –, não manifestou empatia com familiares e vítimas da COVID alegando não ser coveiro, atitude repulsiva para um presidente.
E mais: perdeu apoio de grande parte da comunidade internacional por sua postura diante da crise ambientalista enfrentada no mundo. Restaram Trump, Putin... Negou que desmatamento e garimpo cresceram apoiados na omissão e retirada de investimentos no Ibama e fiscalização nas regiões atingidas, fortalecendo a contravenção. Retirou o olhar dos povos originários, criticou os nordestinos e declarou que a única coisa boa no Maranhão era o presídio de Pedrinhas.
Retirou verbas da educação até o final, quebrando as pernas das universidades federais, que ficaram sem dinheiro para pagar compromissos. Saiu do país sem um adeus, contrariando nosso hino, recusando-se a passar a faixa presidencial ao candidato vitorioso. Estou listando o que é público, informado pela mídia.
Não inventei uma só palavra no que aqui exponho. Foi deselegante e politicamente incorreto do início ao fim. Ponto. Só se elegeu porque a esquerda, enfraquecida, evidentemente por seus próprios erros de condução das relações internas, perdeu poder deixando espaço para “salvadores” com as promessas que queremos escutar.
Quem já leu o livro “Como morrem as democracias”, de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, pode verificar histórias dos golpes dados por tiranos que ficaram anos e ainda ficam no poder por gradativamente plantar distorções na democracia, sob a máscara de democratas, e se legalizaram, com o apoio deles.
Mas agora é hora de virar a página. Deixemos para trás o que não nos interessa e bola pra frente. O que importa é o que o novo tempo trará. O que será realizado, e que a democracia seja praticada pelos brasileiros que querem salvar o país, caso seja necessário.
Nosso laço deve ser com o futuro do povo brasileiro e não com a politicagem que no Brasil já é reconhecida pelo “toma lá dá cá ou pula fora”. Sabemos que é preciso obter apoios, mas que eles não sejam por concessões imorais.
Agora é hora de torcer por um Brasil melhor, mais elegante, mais solidário, menos violento e preconceituoso, onde brancos e negros, índios e mestiços, homo e héteros, mulheres e crianças, pobres e classe média sejam contemplados e respeitados. Que a sensibilidade e a subjetividade tenham espaço e o norte seja a mais estrita ética. É o que se deseja.
Um país desarmado, pacifista. Ou melhor, armado de livros, cultura, ecologicamente correto e, finalmente, mas não menos importante, de arte. Solidário e também amoroso.
E por falar em amor, deu o que falar o beijo do ano. Deixo pra vocês um trecho do primoroso artigo (não publicado) de Inez Lemos, autora de “Berro de Maria”, livro já contemplado aqui neste espaço. Uma bela escrita:
“Trepar é fácil, gozar com todo o corpo é para poucos, demanda abertura abissal. As entranhas participam do ato – a multidão de afetos vai junto, positivos ou negativos. Devemos lembrar que por trás do político há um ser e sua subjetividade – marcas identitárias, traumas, e nem todos tratam suas patologias, desvios psíquicos, ressentimentos. Pouco emerge do sujeito e seu subterrâneo.
Lula, ao beijar Janja ontem (em 1º de janeiro, no show realizado no dia da posse), beijou o Brasil, nos encheu de amor, carinho e tesão. Estávamos precisados. Estávamos nos tornando uma sociedade brochada, perdendo o orgulho de país das grandes emoções, de um povo cheio de bons sentimentos. Que esse beijo toque os corações de muitos e os transforme.”
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