O tal do Politicamente Correto adota termos amenos para situações dramáticas. Exemplo: favela agora é comunidade, como se um substantivo fosse capaz de mudar as condições degradantes de vida, de dezenas de milhões de brasileiros.
Caminho para completar 53 anos de vida. Nasci e cresci ouvindo a promessa de um país do futuro. Já adulto e sem ilusões, desenvolvi um senso crítico rígido e áspero em relação ao Brasil. Talvez movido pela frustração, talvez movido pela realidade, talvez movido pela admiração doentia que sinto por nações desenvolvidas.
Enquanto BH derrete sob águas torrenciais, zilhões de mosquitas (êêê saudade da Dilminha, hehe) depositam seus ovos por aí. Um surto de dengue, do tamanho das enchentes, pronuncia-se no horizonte. Mas nosso prefeito fala em colocar 5 milhões de foliões nas ruas, no Carnaval.
Em 2019, segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF), 5.332 pessoas perderam as vidas nas estradas federais. Apenas no recente feriado de Ano Novo, 863 mortes em acidentes rodoviários. Para ajudar, o presidente Bolsonaro ‘quer porque quer’ acabar com os radares de velocidade. Será que um dos negócios da família, além de chocolates, é funerária?
Tradicionalmente, janeiro é também o mês do cocô nas praias brasileiras. A estação chuvosa arrasta, sem dó nem piedade, o esgoto urbano não tratado para o mar. Resultado: mau cheiro e doenças associadas, além de praias interditadas e a consequente queda no turismo, no faturamento do setor e na arrecadação fiscal.
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Enchentes, desmoronamentos, destruição, mortes… A cada início de ano vivemos uma espécie de ‘looping’ temporal. É como no filme Feitiço do Tempo (Groundhog Day, 1993 - veja trailer abaixo), onde Phill, um arrogante apresentador de TV, interpretado pelo genial Bill Murray, acorda sempre no mesmo dia.
Só que Phill tem a companhia da ma-ra-vi-lho-sa Andie MacDowell. Já ‘nosotros acá’ temos a de William Bonner, com aquele olhar soturno e voz grave a anunciar nossas tragédias, nos lembrando impiedosamente do quão subdesenvolvidos (em desenvolvimento é o escambau!) nós, miseravelmente, somos.