Comecei esta coluna pensando em citar o livro “Cem Anos de Solidão”, de Gabriel Garcia Marquez, até que o PhD em Cultura Geral (desde que bem consultado), o Dr. Google me salvou do vexame: “é Cem Anos de Solidão, sua besta ao quadrado”. Pois é. Ignorante tentando posar de culto é uma desgraça.
Pô, mas quantos anos, afinal? Livro ou filme? Bem, meu oráculo estava lá outra vez para me responder: “filme, seu burro. Doze anos de Escravidão, de 2013, dirigido por Steve McQueen”. Sério, o que seria da vida dos ruminantes (como eu), comedores de alfafa, sem a internet e o Google? Chupa, ChatGPT, que nem te ligo, hahaha.
CHEGA DE ENROLAÇÃO
Indo ao que importa, declaro alforria aos clubes de futebol do Brasil, desde que interessados no fim da servidão à dupla Flamengo e Corinthians. Não são 12 nem 100, mas pelo menos uns 20 ou 25 anos de subserviência explícita - afora as chibatadas, sob a forma de “erro”, estocadas pelos homens do apito.
Aliás, o VAR é uma espécie de Google do futebol, se é que entendem a comparação. Veio para me socorrer da tirania da CBF - mas já estou me desviando novamente do assunto. Seguinte: liga de U é OLA! Sei que a maioria me entendeu. Traduzindo: liga uma ova! Ou parafraseando Jerry Maguire: “show me the money”.
CADÊ O DINHEIRO?
A Diretoria Executiva e o Conselho Deliberativo do Atlético convocaram seus conselheiros para uma reunião no início de abril, a fim de deliberar acerca da possível participação do Galo em um liga esportiva (Forte Futebol do Brasil), cujo objetivo principal, dentre outros, é buscar a melhor remuneração para o Clube no campeonato brasileiro.
Hoje, posto como está e tudo mais constante, o Atlético recebe uma fração do dinheiro que recebem, por exemplo, Flamengo, Corinthians, Palmeiras, São Paulo… O futebol brasileiro foi e segue organizado como se organizou a nossa sociedade, em que uma tremenda desigualdade de renda afasta, ano a ano, os ricos dos pobres.
LIGA OU DESLIGA
Hoje, há dois modelos em negociação com os clubes das três divisões do Brasil. O da Liga Forte Futebol do Brasil, onde estão Atlético, Fluminense, Internacional, Athletico Paranaense e mais outros vinte e tantos clubes (com a possibilidade de atingir um grupo expressivo com 40 equipes distribuídas nas três séries).
ONDE O BICHO PEGA?
Na Libra, como era esperado, Flamengo e Corinthians dominam e repartem a maior fatia do bolo. Além disso, adjudicaram para si vantagens exclusivas, como garantia mínima de receita durante 5 anos, chova ou faça sol. Quem bancará a festa? Os demais clubes, ora. Parece ou não a nossa relação com os políticos de Brasília?
Além disso, e não apenas os dois (Flamengo e Corinthians), a distribuição do dinheiro arrecadado obedece a um padrão mais concentrador de renda, favorecendo não os clubes com maior engajamento de torcida - como o Galo -, mas com maiores torcidas segundo as pesquisas. Quais pesquisas? Bem, a que eles encomendam, ora bolas.
ME ENGANA QUE EU GOSTO
A Libra calcula arrecadar cerca de 4.8 bilhões de reais, número bem semelhante ao da Liga Forte, onde o Galão da Massa hoje está embarcado. Atenção: estes valores preveem a participação dos principais 40 clubes do País, e obviamente será proporcional na eventual não adesão, de um ou de outro clube, ou mesmo de separação em dois blocos.
Se o Atlético optasse pela Libra, receberia algo como 215 milhões de reais de luvas, mas teria de suportar uma diferença de receita gigantesca em relação a Flamengo e Corinthians, e ao longo dos próximos 50 anos (tempo do contrato) nos tornaríamos paupérrimos frente aos dois. Pior. Seríamos um timeco regional, de joelhos, diante de clubes globais.
NÚMEROS MENTEM, SIM
Uma rápida comparação entre o prêmio inicial que receberíamos de uma ou de outra liga poderá induzir o torcedor menos atento a erro. Os valores são muito próximos, sim (R$ 215 milhões), mas a distribuição ao longo dos anos, que é o que importa, se mostra catastrófica, de um lado, o da Libra, e benéfica, de outro, o da LFF (Forte Futebol) ao Atlético.
Enquanto no modelo da Libra a divisão do bolo chega a uma diferença de até 4.7 vezes na distribuição do dinheiro arrecadado, anualmente, pela liga ao clube mais afortunado em relação ao mais desfavorecido, no modelo da LFF isso desaba para cerca de 3.5 vezes. Galera, isso significa até 35% a cada ano. Multiplique por 50 anos e me fale em 2083.
A GRAMA DO VIZINHO
Eu não sei quanto a vocês, mas eu era daqueles trouxas que morrem de inveja do carrão importado do cunhado mala, ou da casa de praia do colega de trabalho. Ao longo dos anos - já passei dos 50 -, percebi que mais vale um Golzinho 1.0 seminovo, pago, na garagem, que o Corolla do ano, dividido em 200 prestações, com juros de 3% ao mês.
NOSSOS RIVAIS E EX-RIVAIS
Se vocês me perguntarem por que Flamengo e Corinthians - hoje, ao lado do Palmeiras, nossos grandes rivais nos gramados - estão juntos, de um lado, e o Galo, do outro, a resposta é óbvia: querem continuar explorando os clubes. Tem quem goste ser “mulher de malandro”, e o CSA-MG, outrora Cruzeiro, ex-rival, parece que gosta.
Venham cá: vocês topariam participar de uma liga em que o voto de um clube (qualquer clube) impediria qualquer decisão relevante? Pois assim encontra-se, hoje, estruturada a Libra. Flamengo, Corinthians e mesmo o Cruzeiro poderiam, com um voto apenas, definir a vida do Galo. Já na LFF, a decisão se dá por quórum qualificado.
COMO É NO MUNDO
Lembram da distribuição de grana entre o maior e menor recebedor que citei acima? Vejam que coisa: atualmente, no campeonato brasileiro, a diferença entre o primeiro e o último é de 5.7 vezes. Sabem quanto é na Premier League (Inglaterra), a mais forte e valiosa do planeta? 1.5 vezes. E na Bundesliga (Alemanha)? 3.2 vezes. Sacaram?
Quanto menos desigualdade, ou seja, maior a proximidade de receita entre o mais rico e o mais pobre dos clubes, melhor e mais valiosa será a liga. Lembrando que a Libra propõe 5.7 vezes e a LFF, 2.8 vezes. Não é difícil, portanto, descobrir quem está certo, né? Por isso, em princípio, caminho como conselheiro no sentido da LFF.