Apesar do discurso liberal das primeiras horas do governo Bolsonaro, está ficando cada vez mais claro que só a ação de um Estado forte pode salvar as nações da ruína econômica e humana que acompanha a pandemia e, em seguida, recuperar o crescimento. Governos de todas as tendências estão deixando de lado os dogmas da teoria econômica tradicional e explorando todas as possibilidades do poder soberano do Estado, numa extensão jamais vista até hoje.
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Governos devem buscar consensos mínimos em tempos sombriosQuem vai decidir sobre o amanhã da economia quando a pandemia acabar?O Brasil nunca se deparou com tantos problemas Reeleição: confesso que erreiAlém desse consenso, é necessário um clima político de cooperação e confiança entre governo, Congresso e tribunais superiores, para que o Executivo receba os poderes econômicos extraordinários para executar um programa forte de investimentos em infraestrutura e um programa de grande escala de transferência de renda para os desempregados e os chamados invisíveis, num período de transição de dois a três anos. Consolidado o processo de recuperação e de controle dos danos sociais, podemos e devemos iniciar uma trajetória de eliminação paulatina dos excessos fiscais temporários.
Realisticamente, será que temos como alcançar essas duas condições? Não será fácil, mas na história dos homens muitas vezes o impossível foi ultrapassado. A iniciativa de formação de um novo pensamento majoritário sobre o papel, ainda que emergencial, do Estado, deve partir do governo e de sua equipe econômica. Acontece que a nossa equipe econômica foi predominantemente recrutada no mercado financeiro e seu traço comum é a fidelidade ao liberalismo e a desconfiança nas políticas públicas ativas. Em sua cultura, o Estado não pode ser uma solução, porque ele é o verdadeiro problema.
Dogmas e princípios dão conforto ao espírito, mas não resolvem os problemas reais. Nosso presidente foi eleito por motivos muito variados e por circunstâncias peculiares e não está preso a nenhum compromisso com políticas liberais na economia. Independentemente de seus eleitores, é dever de qualquer presidente zelar pela prosperidade de seu país e pela defesa da estabilidade social. Cabe ainda a ele determinar as linhas do governo e não se sujeitar à linha dos seus subordinados. Não é hora de resistências ideológicas, porque o que está em jogo é o próprio destino do país. Por isso, ou mudam-se as ideias ou devem se mudar os homens.
Quanto à cooperação entre os poderes e os diversos atores políticos, temos que reconhecer que o governo não tem ajudado neste propósito.É um governo irregular, liderado por um homem sem a necessária experiência intelectual ou política para comandar um país complexo numa hora tão extrema. No entanto, este é o governo que temos. Para o bem comum, ele deve ser preservado por todos os que colocam as instituições acima dos homens.
Até agora, o presidente tem apostado na divisão dos brasileiros e no incentivo aos extremos, o que o tornou minoritário na sociedade. No entanto, a questão mais crítica é seu relacionamento com o sistema político. A maioria dos políticos, no Congresso e nos partidos, tem grande desconfiança do presidente e receia apoiar medidas extraordinárias que tornariam seu governo um grande sucesso, apesar dele mesmo. O espectro da reeleição paira sobre tudo e o governo nada faz para exorcizá-lo. Com isso, caminhamos para a inércia ou o impasse.
Só o próprio presidente poderá desfazer este temor e esta desconfiança. Terá ele esta grandeza?
EX-MINISTRO DA PREVIDÊNCIA. ESCREVE QUINZENALMENTE ÀS SEGUNDAS -FEIRAS