Faltando três semanas para o primeiro turno das eleições, deixando um pouco de lado a dança das pesquisas, podemos perceber que mudanças políticas importantes estão tomando corpo na nossa realidade política. Embora a disputa, como quase sempre ocorre, esteja polarizada entre personalidades, é muito difícil compreender o que estamos vivendo se nos ativermos apenas aos perfis dos personagens. Estas eleições transcendem, e muito, a estreiteza dos dois candidatos principais.
As manifestações do dia 7 de setembro foram impressionantes em termos de espontaneidade e mobilização. Não me lembro de ter visto antes tanta gente na Esplanada em Brasília. Em São Paulo, na Avenida Paulista, a quantidade de gente reunida foi tão grande quanto a dos maiores eventos políticos já realizados. No Rio de Janeiro foi a mesma coisa. Podemos discutir indefinidamente se os eventos foram apropriados para a data, mas o fato político, que não se pode questionar honestamente, é que Bolsonaro é capaz de mobilizar mais gente do que qualquer outro político brasileiro neste momento atual.
As nossas eleições, para dizer a verdade, foram sempre um pouco frias em termos de participação popular. Nunca testemunhei grandes concentrações espontâneas ou comícios que chamassem a atenção. Na verdade, nunca conhecemos eleições duramente polarizadas em que vencer era uma questão existencial, a ponto de cada eleitor se tornar um ativista ou um militante.
Os atos de 7 de setembro revelam a emergência de um sólido movimento conservador, organizado e militante, de abrangência nacional, que se apoia na figura de Bolsonaro, mas não se resume a ele e certamente poderá sobreviver a ele. O que isto tem de importância para o futuro do país é que este movimento não pode ser simplesmente derrotado porque ele reflete realidades humanas e sociais que não se apagam com uma derrota, ou com uma vitória eleitoral. A pluralidade democrática determina que este movimento, suas aspirações e interesses, sejam assimilados e reconhecidos nas políticas de Estado e de governo, sob pena de nos tornarmos uma sociedade dividida e um país paralisado.
Em contraposição à emergência conservadora, é difícil não admitir que as chamadas forças progressistas perderam muito de sua força e do apelo que tiveram no passado. O próprio PT é hoje muito menor do que o Lula. A levar em conta as pesquisas de opinião, o PT está encolhendo em todo o país e está presente nas eleições para governador em pouquíssimos estados, na maioria deles relegado a segundo plano.
Até onde se pode ver, a candidatura favorita de Lula, apesar da vantagem clara nas pesquisas, não tem grande poder de mobilização popular, parecendo encarnar hoje uma espécie de maioria silenciosa, exatamente o contrário do que sempre foi. Em grande medida, ele é o único recurso para derrotar o Bolsonaro, um instrumento de defesa, não um projeto de futuro.
Se este quadro é verdadeiro, o que temos pela frente é um grande desafio. Está ficando claro que o sistema partidário ruiu inteiramente e já não realiza minimamente a mediação política entre a sociedade e o Estado. Um sistema político numa sociedade complexa e cheia de carências não pode se apoiar apenas em personalidades que, por natureza, são efêmeras. Os movimentos, por sua vez, não são substitutos perfeitos dos partidos políticos, porque carecem da organização e da estrutura que são necessárias para a ação política permanente. E as maiorias silenciosas não tem estrutura ou comando para assegurar seu protagonismo.
Continuo convencido de que estamos diante de duas escolhas insatisfatórias. Nenhuma delas reúne as condições para liderar nosso país para a mudança e o progresso. A política está dividida hoje em lados que não se reconhecem e que, portanto, não podem cooperar entre si.
Nada disto, no entanto, é destino. A história é contingente e tudo pode mudar. Este é o Brasil que temos. Antes de mudá-lo, precisamos reconhecê-lo e aceitá-lo como ele é. Este sempre será o primeiro passo se quisermos transformá-lo.
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Os atos de 7 de setembro revelam a emergência de um sólido movimento conservador, organizado e militante, de abrangência nacional, que se apoia na figura de Bolsonaro, mas não se resume a ele e certamente poderá sobreviver a ele. O que isto tem de importância para o futuro do país é que este movimento não pode ser simplesmente derrotado porque ele reflete realidades humanas e sociais que não se apagam com uma derrota, ou com uma vitória eleitoral. A pluralidade democrática determina que este movimento, suas aspirações e interesses, sejam assimilados e reconhecidos nas políticas de Estado e de governo, sob pena de nos tornarmos uma sociedade dividida e um país paralisado.
Em contraposição à emergência conservadora, é difícil não admitir que as chamadas forças progressistas perderam muito de sua força e do apelo que tiveram no passado. O próprio PT é hoje muito menor do que o Lula. A levar em conta as pesquisas de opinião, o PT está encolhendo em todo o país e está presente nas eleições para governador em pouquíssimos estados, na maioria deles relegado a segundo plano.
Até onde se pode ver, a candidatura favorita de Lula, apesar da vantagem clara nas pesquisas, não tem grande poder de mobilização popular, parecendo encarnar hoje uma espécie de maioria silenciosa, exatamente o contrário do que sempre foi. Em grande medida, ele é o único recurso para derrotar o Bolsonaro, um instrumento de defesa, não um projeto de futuro.
Se este quadro é verdadeiro, o que temos pela frente é um grande desafio. Está ficando claro que o sistema partidário ruiu inteiramente e já não realiza minimamente a mediação política entre a sociedade e o Estado. Um sistema político numa sociedade complexa e cheia de carências não pode se apoiar apenas em personalidades que, por natureza, são efêmeras. Os movimentos, por sua vez, não são substitutos perfeitos dos partidos políticos, porque carecem da organização e da estrutura que são necessárias para a ação política permanente. E as maiorias silenciosas não tem estrutura ou comando para assegurar seu protagonismo.
Continuo convencido de que estamos diante de duas escolhas insatisfatórias. Nenhuma delas reúne as condições para liderar nosso país para a mudança e o progresso. A política está dividida hoje em lados que não se reconhecem e que, portanto, não podem cooperar entre si.
Nada disto, no entanto, é destino. A história é contingente e tudo pode mudar. Este é o Brasil que temos. Antes de mudá-lo, precisamos reconhecê-lo e aceitá-lo como ele é. Este sempre será o primeiro passo se quisermos transformá-lo.