Mudanças só ocorrem na margem, em pequenos saltos cumulativos que não perturbam o equilíbrio existente, seja ele justo ou injusto, progressista ou retrógrado.
Tudo isto ajuda a explicar o estranho clima que dominou as últimas eleições. Cada uma das duas candidaturas que chegaram ao fim do processo conseguiu convencer a metade dos brasileiros que lhes entregaria um Brasil muito diferente do Brasil que realmente existe. A esperança deste Brasil imaginário, que surgiria do nada, acabou dando aos que não venceram um sentimento de perda existencial, difícil de suportar, além do medo de que o vencedor iria virar o país de cabeça para baixo, conforme o sentimento que lhes foi transmitido durante a luta eleitoral.
Em compensação, a esperança do outro Brasil imaginário que acalentou a alma dos que se viram vencedores, enfrenta já agora as decepções do encontro com a realidade. Embora a luta pela Presidência da República pareça sempre uma luta de vida ou morte, os poderes do presidente são muito menores e mais limitados do que comumente se imagina.
Passado um breve período de graça, o novo presidente já tem que se haver com as estruturas de poder instalados no Congresso, nos partidos, na imprensa e nos mercados. Este é um mundo de baixa rotatividade, habitado por gente profissional, experimentada e com vastas conexões. É um mundo que tem aversão à mudança e às alterações no equilíbrio de poder. Principalmente ao crescimento e à emergência de novos vencedores na economia.
Logo de início, o novo governo compreendeu que só a Presidência da República vai mudar, todas as outras estruturas de poder permanecerão, como tem ocorrido nas últimas sucessões. A Câmara e o Senado são o que sempre foram e, apesar de renovados pelas eleições, manterão a mesma direção, porque, ao contrário das aparências e do choro dos vencidos, pouca coisa mudou realmente.