Mineiro já é desconfiado de natureza. Agora, imagina, mineiro e torcedor americano? Aí, rapaz, é só mesmo vendo para crer. E não deu outra. Foi somente quando vi e ouvi o nome do América no sorteio oficial como time da Libertadores sendo citado no evento da Conmebol que a ficha caiu.
É verdade. É verdade. É verdade. O adversário é o Guaraní do Paraguai e a data provável é dia 23 de fevereiro, uma quarta-feira (dia que é a cara da Liberta), e desta vez posso dizer de peito aberto: o Independência vai ficar pequeno! Foi só saber que a cabeça foi longe.
Chegou o dia. Você vai acordar bem cedo e, antes de escovar dente, tomar café ou até mesmo se vestir, vai olhar as redes sociais e o que os jornais estão falando sobre a estreia. De repente, em um breve flash de sensação, vai pensar: chegou o dia pelo qual o América esperou a vida toda.
No trabalho, durante a manhã, sua mente já estará enxergando os caminhos que levam à Rua Pitangui. A escolha pela camisa ideal também passará pela sua cabeça inúmeras vezes. Ir de preto e verde? De verde e branco? Com a camisa da organizada? Vou com a vermelha da edição especial? Uso aquela que meu pai me deu? Coloco a camisa de quando era adolescente, mesmo estando espremida e desbotada?
Não importa. Mil opções passarão pela sua cabeça e este será só o começo. Acaba o expediente e nada mais faz sentido a não ser tomar o caminho do Horto. Você vai a pé, de carro, de ônibus, de qualquer jeito. Você vai sair da cidade onde mora e estará lá.
Dia de estádio cheio e sabemos como é. Bem antes da Silviano Brandão você verá torcedores do América. Gente que você nunca viu, mas sente uma ligação profunda. Como se, parte de uma seita só, vocês estivessem esperado juntos, mesmo que em vidas distintas, por este momento. E ele chegou.
Perto do estádio, você vai ver crianças com a camisa do América e vai se lembrar de quando era pequeno. Você não imaginaria que iria para a Libertadores. Eles já estão sabendo o que é isso. Enrolado numa bandeira antiga, você vê um velhinho que teve inúmeras chances de ter desistido de tanto sofrimento. Ele está ali. Ele sabe que valeu a pena. Sozinho, com dificuldade de andar, o olho dele brilha. O seu, chora. E eu também choro enquanto escrevo.
A lágrima vira suor e fumaça com os fogos e o resultado do churrasco nos arredores. Perto do Bar da Sandrinha, você pede um tropeiro. O bolinho de feijão já acabou. Quantas vezes você fez isso antes de um jogo de Campeonato Mineiro com poucos torcedores? Não é o caso. Você subiu de patamar. O América não é mais o mesmo.
Duas ou três cervejas mais tarde e uma rua de fogo verde, chega a hora de entrar. Você se belisca, mas já é tarde. Nenhum sonho duraria tanto, com tantos detalhes. O barulho dos tambores das organizadas te mostra que, se fosse um sonho, você já teria acordado.
Você passa pela catraca, um filme também passa na sua cabeça. Você se vê garoto entrando no Mineirão, dando a mão para o seu pai. Naquela época, a torcida grande era do adversário. Não hoje. Talvez um dia você tenha se questionado por que estava com a minoria. Hoje, não.
Você entra e vê a maior festa da sua vida. O resultado do jogo fica em segundo plano, mas a vitória continua sendo seu objetivo. Você faz a sua parte, grita, canta. Você esteve ali tantas vezes, em “vão”. Hoje, não. O juiz apita, a fé transborda. Depois de tudo que passou, você apenas pensa: não duvidem do meu Coelho, enquanto serei a resistência.