Pela primeira vez após dois anos de pandemia, viajamos de férias para Aracaju. Dez dias de sol e mar, um sonho. Foi difícil despedir do paraíso. Com as malas prontas, tudo preparado para ir embora, baixou em mim o espírito de caranguejo, símbolo de Sergipe e do meu signo. Dei dois passos para fechar a conta do hotel, mas voltei um passo para trás. Precisava colocar os pés no mar, mais uma vez.
Com saudades antecipadas, marchei com a família em direção à praia de Atalaia. Demorou até passar protetor solar, botar a camisa antitérmica, localizar viseira e bonés. Já estava tarde, perto de meio-dia, mas daria tempo de dar um pulinho no mar. Sete pulos, na verdade.
Era uma questão importante. Precisava deixar as ondas levarem os últimos tuiuiús da alma, as esponjas do coração, as anêmonas do corpo. O mar tem esse poder misterioso de restaurar as energias positivas e a alegria.
Na busca pelo último mergulho de férias, porém, esquecemos da longa extensão da orla sergipana, onde o mar é bastante recuado em relação à praia. É preciso enfrentar um a dois quilômetros de caminhada até pisar na água.
Sob o sol de meio-dia, nossa expedição familiar sofreu. A cabeça e os braços estavam protegidos, mas os chinelos de borracha não eram suficientes para isolar o calor da areia fervendo. Era preciso pisar devagar, evitando levantar os grãos, que queimavam em contato com a pele.
Eu me senti como uma beduína perdida no deserto. Os montes de areia lembravam dunas. Aqui e ali havia uma vegetação rasteira. Olhei para o lado. Meu caçula parecia um xeique árabe com o seu chapéu de abas compridas, de cor marrom, cobrindo as orelhas.
O marido não dava uma palavra. O filho mais velho seguia o rumo, mudo. Se conseguisse falar, estaria xingando. Quem deu a ideia de vir para a praia uma hora dessas? Só me restaria concordar com ele. E de cabeça baixa, para não entrar areia no olho.
Em um raio de dois quilômetros, não havia uma única pessoa à vista. Ao longe, avistava-se um pontinho amarelo em alto-mar, provavelmente um surfista. Ou talvez uma miragem – não dava para saber ao certo. Ainda faltava um bom pedaço de chão para percorrer.
No meio do caminho, cogitei pedir arrego. Devemos voltar?, perguntei-me internamente. Com os olhos semicerrados, fiz o cálculo. A distância era a mesma. Faltavam uns 300 metros para voltar, com a sola dos pés fritando, a carne cozinhando por dentro.
Se seguisse em frente, seria preciso vencer uns 300 metros até chegar na água que, com sorte, traria uma corrente marítima fria. Havia a esperança de molhar os pés na bacia gigante de salmoura com iodo, curadora. Depois, viriam novos 300 metros do retorno.
Era largar ou pegar o último mergulho no mar. De repente, ouvi um passarinho cantando. Eu juro. O bem-te-vi pousou em uma espécie de sinaleira de madeira, fincada no alto da duna. Havia três setas. Em uma delas, aliás a única legível, estava escrito: FORÇA.
O universo escolheu por nós. Seguimos adiante. O banho de mar aliviou queimaduras e aflições. Na volta, uma nuvem encobriu o céu. Sem refletir os raios de sol, a areia ficou menos quente. Estava tudo certo.
O recado é claro. O que 2022 quer da gente é força.