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A pombinha (II)

"Jamais poderia vencer o meu oponente, dotado de enormes vantagens em relação aos seres humanos. Era livre e podia voar"


07/08/2022 04:00

Na última coluna Mais Leve, recebi comentários de leitores que disseram ter se sentido alvo de um comportamento mais agressivo da parte dos pássaros urbanos. Será que as pombas da paz declararam guerra aos humanos? Estaria em curso uma revolta alada? O filme Os Pássaros, de Hitchcock, seria na verdade uma premonição do futuro?
 
É claro que, se a gente abrir a gaiola da imaginação, os pensamentos voam longe. Outro dia, por exemplo, tive a nítida impressão de que havia um bem-te-vi me encarando no jardim da casa. É sério. Com seu colarinho preto e peito amarelo, estufado, ele ficou um tempão estacado na minha frente, sem arredar os pés.
 
Ingênua, cheguei a achar bonitinho ter um contato imediato com a natureza, logo pela manhã. Ensaiei dar um passo à frente, mas o bem-te-vi psicopata continuou onde estava, obstruindo o caminho. 
 
Em outros tempos, teria voado para longe, a um mínimo movimento meu. Esse aqui não. Tornou a me encarar com aqueles olhos de jabuticaba, sem pupila, fixos em mim. Permaneceu parado na minha frente, intimidador. Só faltou soltar o grito de guerra: Bem-tevi, bem te vi, bem te vi! Lembrou-me o corvo sombrio de Edgar Alan Poe, que repetia infinitamente o refrão perturbador: Nunca mais, nunca mais, nunca mais...
 
Acuada, decidi me recolher para dentro de casa, sob a proteção da porta de vidro. Jamais
poderia vencer o meu oponente, dotado de enormes vantagens em relação aos seres
humanos. Era livre e podia voar.
 
Na crônica passada, contei a estranha história da pombinha, que se jogou na frente do carro, me obrigando a parar. Eu dirigia por uma rua deserta, sem nenhum outro veículo por perto. De repente, a ave desceu do céu num voo rasante e aterrissou a meio metro de mim. Por sorte, consegui frear a tempo. Nem assim ela foi embora. Tive de dar ré.
 
Não é de hoje que alguns pássaros vêm apresentando esse comportamento ostensivo, contou um leitor da coluna. Ele disse já ter levado umas boas bicadas de uma passarinha, sem motivo aparente, na porta de casa. Observador de pássaros, o homem garante que não havia um ninho por perto, o que em tese justificaria a atitude da mãe, saindo em defesa dos filhotes.
 
Eu julgava que o fenômeno fosse algo mais recente, da pandemia para cá, quando algumas
espécies de animais colocaram as asinhas de fora, invadindo o terreno dos homens. Ou
melhor, retomando as áreas que antes lhes pertenciam por usucapião.
 
Com as ruas praticamente inabitadas, nossos colegas da Terra se sentiram mais à vontade para saírem da toca. Os miquinhos desfilaram, aos montes, pelos cabos da rede elétrica, jacarés se multiplicaram na Lagoa da Pampulha e os sapos interditaram um laguinho do Parque dos Mangabeiras, entre outros.
 
Já tive encontros mais amigáveis com os seres alados que moram no jardim. Houve o caso do beija-flor estacionário, que recolheu o seu helicóptero de asas e ficou empoleirado num vaso de flores, sem pressa para ir embora. Veio fazer uma visitinha e se esqueceu da vida (dizem que os colibris simbolizam a visita de nossos antepassados).
 
Já fiz amizade com uma borboleta nas cores laranja, azul e preta, que trazia um par de “olhos” desenhados nas asas. Ela ficou bailando à minha volta, às vezes descendo para se alimentar do pólen do canteiro de margaridinhas amarelas. Ficamos íntimas.
 
Como costuma dizer minha mãe, não sei dizer nada sobre isso. Faltam elementos para
explicar o significado dos últimos acontecimentos. Serão apenas coincidências? Estou
finalmente vivendo o momento presente? Consegui me colocar na condição de observadora
da vida? Seja o que for, agradeço.

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