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Nossa casa ganhou um novo morador, que atende pelo nome de Pudim. Ou ainda vai atender, quando se entender por cachorro. Por enquanto, é apenas uma bolinha de pelo marrom, de um mês e meio, da raça shih tzu. Parece um bichinho de pelúcia, manso e bom de apertar, menos na hora de dormir. Late sem parar.




 
Os filhotes choram igual a bebês quando colocados no berço. É assim mesmo, informam dezenas de páginas da internet, duas veterinárias, a moça do canil, a dona do pet shop e alguns amigos com experiência em cães. Sinceramente, não esperava revisitar o drama de consciência vivido pela primeira vez há 17 anos, e depois há 12 anos, com meus filhos.
 
O que se deve fazer? Acudir o neném ou deixá-lo chorar até dormir? É bom pensar rápido, pois, nesse exato momento, Pudim está latindo loucamente. Dói imaginar aquele pequeno ser sofrendo, sozinho no quarto dos fundos, recém-separado da mãe e do restante da ninhada. Se dependesse de mim, já tinha ido lá socorrer aquela coisa fofa.
 
No entanto, a decisão cabe aos meus filhos humanos, oficialmente designados como pais do Pudim. Para minha surpresa, os dois demonstram ter mais sangue-frio do que eu. “Mamãe, deixa o Pudim dentro do cercadinho. Ele precisa ficar lá. É para o bem dele”, argumentam os jovens, já voltando para o videogame.




 
Seja por dó ou desconforto, aumentam o som do joguinho para abafar os latidos. Fecho a porta do escritório para isolar o barulho, tentando me concentrar neste texto. A língua coça para acusá-los de ser insensíveis e disparar que ‘queria ver se eu tivesse feito isso com vocês quando eram pequenos’. Seria uma fala absurda, total inversão de papéis. Consigo me controlar a tempo, mas tento me posicionar como adulta. Aposto que ninguém pensou na parte prática. Deram comida?
Trocaram a água da tigela? Deixaram a janela entreaberta para refrescar? E se tivesse algo errado com o cachorrinho?
 
Os dois tinham razão. Não havia nada de estranho com o Pudim. Era só a manha. Em menos de 5 minutos, ele para de latir. O bairro inteiro entra em estado de paz e a família já pode ir para cama. Sucesso total. 
 
O bichinho dá sossego entre as 21h30 e as 6h. Só acorda com o nascer do Sol, superando a marca dos meus filhos quando bebês.
 
Como boa canceriana, vejo um filme mexicano passando na mente. Julgo a mim mesma no papel de mãe. Superprotetora, exagerada, dramática. Agora, o jeito é aguentar o sorrisinho irônico dos meninos, o olhar de dó dirigido a mim: ‘Coitada dela, tão boazinha!’
 
Ainda é cedo para comemorar. A primeira noite foi sorte de principiante. Nas madrugadas seguintes, o chororô continua. É só fechar a porta do cômodo para iniciar o festival de aus aus insistentes, infinitos. Confesso que, na noite passada, eu sucumbi. Pudim já estava latindo há uns 40 minutos. Que dó! Fui lá tentar acalmar o bichinho.
 
Acendo a luz e verifico as condições do recinto. Tudo normal. Será fome? Ofereço alguns gramas extras de ração para que ele pare de latir. Ignoro a regra do reforço positivo, que ensina a dar comida apenas quando o animal para de latir, como recompensa. Se você der o prêmio quando ele está latindo, ele vai latir cada vez mais.




 
Faz sentido, mas não agora, em plena madrugada. Feliz da vida, Pudim come tudo. Quando acaba a ração, porém, volta à estaca zero. Tento adotar a tática da indiferença. Sento no chão e fico apenas olhando para ele, sem mexer um músculo. Ele late ainda mais.
 
Tento distraí-lo com um brinquedinho canino, carrego no colo, canto uma música de ninar.
Nada. No desespero, busco a playlist de músicas para acalmar cachorros do YouTube, indicada pela minha irmã. Deu certo com a Lunna, mas não funciona com o Pudim. Exausta, não sei mais o que fazer. Sem opções, só me resta tentar uma coisa. Fecho a porta do quarto e deixo o cachorrinho latir até pegar no sono. Boa-noite, Pudim.