Jornal Estado de Minas

GEOPOLÍTICA

O coronavírus e a globalização econômica


No outono chinês de 2019, na cidade de Wuhan, epicentro da pandemia, surgiram as primeiras evidências da COVID-19, originada do vírus SARS-CoV2. De origem ainda incerta, segundo o relatório divulgado, em março de 2021 pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o vírus faz parte da família do coronavírus, que provoca doenças simples como resfriados até as síndromes respiratórias agudas graves.





À medida que a enfermidade se espalhava, o mundo assombrado via os dois pilares da globalização: a livre circulação de pessoas e mercadorias sendo afetadas com a rápida propagação da doença. As viagens domésticas e internacionais e a circulação de mercadorias foram muito alteradas, principalmente nos primeiros meses da pandemia, e, até hoje, não houve uma retomada da normalidade. 

No caso dos brasileiros, o contexto é ainda mais desolador. Fomos, praticamente, transformados em párias do mundo com a forma como a pandemia foi e está sendo conduzida no país. O negacionismo reinante no alto escalão do poder, as mentiras difundidas como verdades absolutas, a disputa de egos e a ausência de ação coletiva tiveram, como consequência, o nosso isolamento pela quase totalidade dos demais países e suas fronteiras foram fechadas à nossa presença. 

Obviamente, não há dúvida de que a circulação de pessoas está por trás da difusão global da doença, fazendo o movimento de pessoas a causa e a vítima da COVID-19. A variante brasileira é temida externamente, explicando, em parte, a resistência em nos receber. 





Nesse cenário, a globalização da economia entrou, de certa forma, em julgamento. A pandemia, inegavelmente, servirá de base para questionar crenças que estavam profundamente arraigadas no conceito de ver o mundo. 

Esse processo, que muitos acreditam, tenha se iniciado com as Grandes Navegações encontra defensores que afirmam que, em cada momento da história humana, com os recursos disponíveis, o homem vivenciou um sistema globalizado, desde a Antiguidade. O avanço dos meios de transportes e telecomunicações, a partir dos anos 70 do Século XX, permitiu a humanidade atingir o padrão atual de intensa interdependência entre a nações. 

A princípio, acreditava-se que a abertura dos mercados nos anos 90, com o esfacelamento da União Soviética e os novos padrões econômicos recomendados pelos “papas da economia dos países do Norte”, os quais articularam os princípios do Consenso de Washington, geraria uma onda de prosperidade entre as nações nunca alcançada, rompendo as limitações das décadas anteriores impostas pela bipolaridade econômica. Era a Nova Ordem Mundial. 





Pensava-se em um mundo mais coeso e mais próspero. Entretanto, o que se percebeu, décadas depois, é que a globalização de fato se restringiu basicamente na busca pela desregulamentação financeira e localização industrial com custos salariais baixos. 

Quando o vírus da COVID-19 começou a se disseminar pela costa leste da China, no final de 2019 (até alcançar todos dos demais continentes), impondo à OMS o reconhecimento da primeira pandemia do século XXI, em 2020, ficou clara a fragilidade das relações econômicas estabelecidas pela chamada Nova Ordem.

A pandemia expôs, entre outras coisas, que não existe uma comunidade internacional verdadeira, capaz de atuar em cenários como os impostos pelo Sars-CoV2. Bill Gates já havia alertado para esse fato em 2017, após a última crise promovida pela epidemia do Ebola, no continente africano, que o mundo não estava preparado para uma pandemia. 




 
Percebeu-se, com a pandemia deflagrada em 2020, que não havia nenhum sistema multilateral (G20, OMC, ONU, OMS etc.) capaz de agir de forma operacional conjunta para uma atuação ampla, global e imediata no controle do maior desafio enfrentado por todos os Estados há décadas. 

O mundo sem tragédias não foi projetado pela globalização. Quando o contrário se instalou não havia uma logística de como lidar de forma eficiente e cirúrgica. A globalização não se preparou e, provavelmente, não considerou esse cenário.
 
Talvez seja o momento de repensar a dependência do Ocidente da China. Não questionar a China! Ela age dentro dos princípios defendidos pelo modelo adotado no planeta. É um momento de questionar nossa postura frente a essa dependência. Não existe mais uma globalização feliz e isso está, como nunca, mais evidente. Seria ingenuidade não considerar outras formas de atuar e de agir. 





A ocasião é agora! É o momento de buscar corrigir as falhas, os erros cometidos até o presente momento.  É, talvez, chegada a hora de criar um sistema operacional global de cooperação sólida entre os governantes para alertar, organizar medidas preventivas e tratamentos diante a possibilidade de novas pandemias. A Iniciativa Covax Facility, criada pela OMS, pode evoluir para um projeto mais amplo e eficiente no futuro. 

Há, também, a necessidade de “esverdear” ainda mais os setores produtivos no campo e na cidade, reciclar mais, desperdiçar menos, desenvolver meios de transporte mais eficientes e “descarbonatar” os setores energéticos. 

Práticas essas que têm que ser generalizadas.  Não pode um adotar e o outro não.  A coletividade das ações resultará em um mundo melhor. No momento, há que se buscar parar a pandemia e os meios para evitar um colapso da economia e do social. Na sequência, orquestrar um novo mundo. 

É um momento histórico.

audima