A população mundial continua a crescer, com uma tendência em dobrar seu número a cada 35 anos. À medida que aumenta o número de habitantes no planeta, expande também a competição pelo controle dos seus recursos naturais. Mesmo que seja encorajador o progresso experimentado pela humanidade nas últimas décadas, essa realidade é muito preocupante.
Atualmente, no mundo, uma mulher dá à luz 2,5 filhos, em média. Isso corresponde à metade do número de filhos no início dos anos 1950. Mundialmente, em 40% dos países, a taxa de fertilidade - o número de filhos nascidos vivos durante a vida de uma mulher - é menor ou igual à taxa de “substituição” de 2,1 filhos por mulher, na qual os filhos, simplesmente, substituem seus pais.%u2029
Entretanto, esse padrão é alterado na África. No continente africano, as mulheres dão à luz a 4,7 filhos cada uma, em média. Esses indicadores apontam que a população africana está crescendo quase três vezes mais rápido que o correspondente mundial.
A taxa de fertilidade permanece alta em quase todos os 54 países africanos, com exceção do Níger, o único país do mundo onde o indicador de fertilidade ultrapassa 6 (é de 6,6). Em seguida, vêm Mali, República Democrática do Congo (RDC), Angola, Chade, Nigéria, Burundi, Burkina Faso e Gâmbia, todos com pelo menos 5 filhos por mulher.
Tradicionalmente, os africanos sempre foram caracterizados por grupos familiares grandes. Isso é explicado por vários fatores, tais como: manter elevado o status social; possuir mão de obra familiar capaz de trabalhar a terra; contrabalançar as altas taxas de mortalidade entre crianças pequenas, entre outros.
No entanto, felizmente, os bebês estão sobrevivendo e se tornando pais, demonstrando uma condição de vida um pouco melhor que no passado. Se é um júbilo a queda da mortalidade infantil, há uma preocupação com os índices de crescimento populacional e os meios de atender à demanda que isso implica: educação, saúde e empregos.
Hoje, mais da metade do 1,2 bilhão de pessoas que habitam este continente é composto por crianças ou adolescentes, o que pode levar a um ritmo de expansão que a humanidade nunca conheceu. Até o final do Século XXI, segundo projeções de demógrafos, o número de habitantes da África terá triplicado ou quadruplicado.%u2029
Os dois bilhões de habitantes, que sempre foram estimados para a África, em 2100, estão sendo revistos. Todos os modelos demográficos acreditavam que a taxa de fertilidade no continente cairia. Não há mais expectativas quanto a isso em curto-médio prazo. Os dados da Organização das Nações Unidas (ONU) indicam que a África terá entre 3 a 6 bilhões de pessoas, em oito décadas. Os números saltam aos olhos e impressionam a todos.
A ONU revisa, frequentemente, para cima, a projeção média para a população mundial em 2100: de 9,1 bilhões em 2004, para 11,2 bilhões, hoje. Parte significativa desse aumento inesperado vem da África.%u2029
Os demógrafos temem que esse rápido crescimento comprometa o desenvolvimento e a estabilidade do continente. É de conhecimento comum que as terras africanas não possuem solos de muita fertilidade e a disponibilidade hídrica é irregular, além de sistemas políticos marcados por forte instabilidade, herdada, em parte, de um processo colonial europeu nefasto.
Os ideais Malthusianos voltam a assombrar, pois esse cenário pode implicar o aumento da competição por alimentos, empregos ou a busca pela sobrevivência. Como consequência, os conflitos poderiam se espalhar por todas as regiões do continente, lançar os jovens, sem grandes expectativas e desesperançosos, nos braços dos grupos terroristas e intensificar a migração. Sabe-se que 37% dos jovens adultos na África Subsaariana desejam emigrar para outro país. A principal causa é a falta de empregos.%u2029
Se o mundo quer uma política para desacelerar o crescimento populacional, preservar a paz e a segurança, melhorar o desenvolvimento econômico e trabalhar para um meio ambiente sustentável, é necessário dedicar uma atenção especial à África.
Para isso, uma das estratégias que podem apresentar bons resultados é integrar programas de planejamento aos serviços de saúde, junto à emissão de declarações e até medidas governamentais dizendo que "quanto menor, melhor" em termos de tamanho da família, mesmo que isso seja considerado culturalmente indelicado e politicamente controverso.
Nessa busca por um crescimento demográfico mais ritmado e menos acelerado, é fundamental o papel representado pelas mulheres. É urgente que elas adquiram direitos mais consolidados e tenham maior poder de decisão individual. Educar as meninas e mulheres garantindo um status social e legal semelhante ao dos homens.
As mulheres africanas não têm muito poder de decisão. Muitas decisões, que deveriam ser pessoais, são delas suprimidas, como escolher a própria contracepção, dar à luz em boas condições, ter acesso à educação sexual, fugir do estupro ou da mutilação genital (comum na Somália, país do Chifre da África, onde a maioria esmagadora das meninas são submetidas a essa prática primitiva). Alguns países avançaram nesse aspecto, mas ainda é incipiente para resultados mais efetivos, se desejam uma mudança de panorama.
O que se vê na África de hoje já e inquietante. O progresso econômico, os avanços democráticos políticos e sociais são lentos, ao contrário dos altos níveis de pobreza e desnutrição. Tudo pode se agravar com uma população em crescimento desordenado e tornar o horizonte mais nebuloso.
As dificuldades devem piorar. Seria difícil para a África garantir boas condições de vida para uma população de dois bilhões de pessoas, quanto mais para seis bilhões! A história não oferece muitas pistas.
No planeta somente a Ásia superou 4 bilhões de pessoas, em 2007, mas, comparada à África, é 50% maior em área e tem níveis significativamente mais altos de desenvolvimento econômico. Ainda assim, com esses pontos fortes, grandes áreas do continente asiático enfrentam problemas com as terras agrícolas empobrecidas, os níveis de água em declínio, a insegurança alimentar e alta poluição do ar.
Para piorar, todas as previsões indicam que as cidades africanas devem crescer. A taxa de urbanização cresce rapidamente e metrópoles gigantes devem proliferar por vários países africanos e, com elas, todos os desafios de um crescimento urbano acelerado e desordenado.
A África pode ser vítima de sua demografia galopante. Se não controlar esse ritmo desenfreado, seu status, às vezes alardeado como o futuro paraíso econômico do planeta, permanecerá muito hipotético.
Reduzir o crescimento demográfico é fundamental para equilibrar as condições socioeconômicas e a estabilidade política regional. Alguns governantes africanos estão empenhados em buscar soluções e isso passa, obrigatoriamente, pelo planejamento familiar, que exige uma participação ativa das mulheres nesse processo.
Nenhum país alcançou plenamente a igualdade de gênero. No continente africano, esse desnível é ainda mais acentuado. O sucesso das propostas governamentais depende da maior liberdade feminina e severa punição à misoginia. Educar as meninas e inserir as mulheres no mercado de trabalho são ações fundamentais. Sem isso, podem cair no vazio todas as iniciativas.
Quanto mais lenta for a transição para a fertilidade controlada, mais longos serão os desafios a serem enfrentados. A África tem pressa.