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Estado de Minas GEOPOLÍTICA

Submersível, inelegibilidade e as cortinas de fumaça da geopolítica global

Semear cortinas de fumaça são práticas recorrentes para tirar o foco de pontos importantes, mas que interessam a poucos


03/07/2023 06:00 - atualizado 01/07/2023 18:53
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Imagem feita de um helicóptero de um barco lotado de imigrantes no mar
Poucos dias antes do sumiço do Titan, uma embarcação com imigrantes ilegais havia naufragado, com mais de 600 vítimas estimadas, entre elas dezenas de crianças (foto: Guarda Costeira Helênica/Divulgação)
O desaparecimento do submersível Titan ocorreu há 15 dias. Durante 4 dias o mundo praticamente parou e se envolveu na busca pelos cinco integrantes bilionários que estavam na embarcação. Entretanto hoje é sabido que a Marinha dos EUA tinha conhecimento de que o barulho da explosão, que se seguiu menos de duas horas após o mergulho, indicava que o pior havia ocorrido. Mas o cenário de comoção para encontrar vivos os integrantes permaneceu por longos três dias.

Claro que não foi em vão todo o aparato que foi criado ao longo das buscas, amplamente divulgadas pela grande mídia. Havia interesses na manutenção do rastreamento (quase sempre escusos) e que isso poderia beneficiar um seleto grupo de pessoas e instituições muito poderosas.

Na política, na guerra, assim como no dia a dia é muito comum criar uma cortina de fumaça para tirar o foco de situações que não são de interesse de alguns. 

Segundo o filósofo Harry Frankfurt, no seu livro “Sobre falar merda”, as cortinas de fumaça são afirmações feitas para persuadir os outros, sem qualquer preocupação com a verdade. Algo que é visto reiteradamente na atualidade.

O mundo assiste a esses mecanismos há tempos, mas tornaram-se mais recorrentes com o avanço da internet e com as redes sociais. No Brasil, principalmente durante os últimos quatro anos, o ex-presidente fez uso rotineiro de pronunciamentos que alardeavam besteiras, com o intuito proposital de desfocar do que realmente importava.

Foi por uma dessas falas, de cunho duvidoso, ostentadas em um encontro com os embaixadores em 2022, quando sem provas, questionou a segurança do sistema eleitoral brasileiro, o ex-líder foi julgado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Como resultado da propagação da desinformação, aquele que se dizia “imbrochável” e “imorrível”, na última sexta-feira se tornou também inelegível por um período de oito anos. A decisão foi considerada por muitos a expressão de um grande dia.

Externamente, a Guerra da Ucrânia pode exemplificar uma situação mais recente em que uma cortina de fumaça é adotada de acordo com muitos analistas. Esse conflito serve como pano de fundo estratégico para os governos aumentarem os gastos em armamentos. Em nome da defesa e da paz, bilhões de euros estão sendo utilizados para a aquisição de novos arsenais bélicos.

Os líderes europeus poderiam buscar meios de garantirem uma maior autonomia energética para seus países, altamente dependentes dos combustíveis fósseis provenientes do território da Rússia, um país que julgam como inimigo, mas os indícios não levam a isso.

Da mesma forma, o foco na busca pelas cinco pessoas que estavam no Titan, reduzia a chance de os jornais destacarem uma “ferida” que não se cura nas águas do Mar Mediterrâneo: as constantes mortes de pessoas migrantes pobres, que não têm a mesma importância para o mundo.

Poucos dias antes do sumiço do Titan, uma embarcação com imigrantes ilegais havia naufragado, com mais de 600 vítimas estimadas, entre elas dezenas de crianças. Mas evidenciar essa tragédia implicaria exigir soluções para esse grave problema e ninguém quer ser pressionado para solucionar ou minimizar esse cenário. 

Todavia há outro agravante envolvendo o submersível. Um relatório divulgado pelo Wall Street Journal indicava que um sistema ultrassecreto de detecção acústica da Marinha dos EUA, projetado para detectar submarinos inimigos, havia escutado pela primeira vez um barulho que indicava a implosão do Titan apenas algumas horas depois que o equipamento iniciou sua missão no domingo, dia 17 de junho. 

O governo dos EUA foi informado do fato, mas aparentemente fez vista grossa para esse fato. Joe Biden, provavelmente, sabia que ao tentar visitar os destroços do Titanic, o navio mais famoso do mundo, o submersível havia sofrido uma implosão catastrófica, com a morte instantânea de todos os ocupantes, esmagados pela pressão a que foram submetidos. 

Mas essas informações não foram divulgadas e as buscas foram mantidas, com grande repercussão mundial. O “circo” estava montado. Os adversários começaram a propagar notícias de que essa estratégia adotada pelo
presidente tinha como intuito proteger o filho, Hunter Biden, da exposição da mídia em torno do julgamento que o envolve e o depoimento de uma testemunha chave que ocorreria naquela semana e que o incriminaria pela evasão fiscal, um dos crimes pelo qual é investigado.

O rebento famoso é envolvido com falcatruas há longo tempo. Evitar as manchetes que destacam o lado profano de Hunter era primordial para diminuir os reflexos diretos sobre a campanha política presidencial já em andamento para 2024 e reduzir as chances de prisão.

Nenhum americano comum receberia tal tratamento, mas o nome em questão
envolve o segundo filho do presidente da nação mais poderosa do mundo. Há
hipocrisia no ato? Claro que sim, mas não é o objeto imediato de discussão.

Há uma outra situação em questão que envolve uma das mais poderosas estruturas financeiras do mundo: o banco norte-americano JPMorgan e o envolvimento com o caso de tráfico e estupro de mulheres, muitas delas menores de idade, cometidos por Jeffrey Epstein (que suicidou na prisão, em 2019), o bilionário cliente do banco desde 1998 até 2013.

Por essa postura, o banco responde a uma série de processos ao tê-lo mantido como cliente, mesmo após 2006, quando se declarou culpado pelo crime de prostituição. A atitude do banco contrariava normas financeiras legais dos EUA. Afinal bilhões eram movimentados pelo abusador, além dos outros clientes que trazia para a instituição. O acusado tinha como alguns amigos fiéis os ex-presidentes dos EUA Donald Trump e Bill Clinton, além do príncipe Andrew (Coroa Britânica). 

Eles eram frequentadores do rancho de Epstein, em um lugar ermo do estado do Novo México. O rancho escondia as barbáries cometidas pelos estúpidos homens ricos e brancos que o acompanhavam. Esses poderosos foram acusados de participar de orgias sexuais intermediadas por Jeffrey. Todos negam as acusações. 

Era comum Jeffrey confidenciar a muitos cientistas interessados no seu farto dinheiro que o rancho seria o local utilizado para semear seu DNA. Segundo o New York Times, essa visão de Epstein refletia seu fascínio, de longa data, pelo que ficou conhecido como trusumanismo: a ciência de melhorar a população humana por meio de tecnologias como engenharia genética e inteligência artificial. Os críticos comparam o trusumanismo a uma versão moderna de eugenia, o campo desacreditado na Ciência, de melhorar a raça humana por meio de uma reprodução controlada.

O banco sabia dessas informações e, apesar disso, manteve o rico financista como um cliente mesmo estando envolvido em processos milionários. O preço por essa decisão custou muito caro: mais de 290 milhões de dólares de indenização às vítimas, valores que foram divulgados no último dia 12 de junho. Há processos ainda em julgamento que podem elevar substancialmente essas cifras. Mas o que uma coisa tem com a outra? 

Bem, no dia 22 de junho poucos jornais anunciaram que uma multa de 4 milhões de dólares foi aplicada à instituição financeira, pelo fato de o banco acidentalmente deletar 47 milhões de e-mails de clientes em 2019. Isso pode ser interpretado como provas deletadas. A princípio, o banco afirma que o erro é responsabilidade de uma empresa terceirizada, se eximindo de qualquer culpa pela perda dos dados.

Segundo analistas, a multa corresponde a um valor irrisório perante novas
condenações, devido ao envolvimento com parceiro inescrupuloso. Os e-mails
perdidos continham as evidências que poderiam ser usadas como provas nas
investigações contra a instituição perante outros processos, incluindo um movido pelas Ilhas Virgens Americanas, onde Epstein tinha residência.

A informação quase não repercutiu nas mídias internacionais. O foco era outro. O mundo olhava para aquele lugar do Atlântico Norte, enquanto a “boiada passava”. Assim, quem controla o poder, define o que causa comoção e o que deve ser mantido na invisibilidade. O mundo dança a coreografia que a classe dominante estabelece.

Como dizia Rubens Ricupero, o ex-ministro da Fazenda do governo de Itamar Franco, lá pelos idos de 1994: “Eu não tenho escrúpulos, o que é bom a gente fatura, o que é o ruim a gente esconde”.

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