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GEOPOLÍTICA

BRICS-PLUS: os desafios de um bloco que aspira crescer

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A multipolaridade da economia tão propagada nos anos de 1990 e que seria controlada pelas tradicionais potências capitalistas – EUA, União Europeia (UE) e Japão – não se fez como previsto. As crises que afetaram a UE e o Japão minaram as previsões tão alardeadas.





Naquela década, o domínio econômico foi praticamente controlado pela liderança americana, criando uma força quase unipolar de controle do poder, surfando, principalmente, nas ondas das altas tecnologias de informação e sem a pressão da corrida armamentista imposta pela Guerra Fria.

Nesse cenário, como prenúncio de uma nova aliança, em 1996, o então Ministro das Relações Exteriores da Rússia, Yevgeni Primakov, propõe um estreitamento das relações mais cordiais com a Índia e a China, em uma tentativa de frear ou contrapor a supremacia geopolítica do Ocidente, representada pela União Europeia (mesmo com crescimento abaixo das estimativas) e pelos Estados Unidos.

Tal aproximação enfrentaria dificuldades históricas devido às relações tensas entre os envolvidos, e se acumularam com o tempo, mas com as vantagens populacionais e territoriais muito atrativas. Vencer os obstáculos e criar elos mais sólidos poderiam gerar mais ganhos e mudar o cenário geopolítico em um futuro não tão distante.



Assim, quando o economista-chefe do banco Goldman Sachs, Jim O’Neill, propôs, em 2001, o termo BRIC em alusão às economias emergentes de alta representatividade no horizonte - Brasil, Rússia, Índia e China- ele profetiza uma nova concepção de liderança, já desejada, de um amanhã a raiar.

Após cinco anos da criação do termo BRIC, em 2006, os países deram o pontapé inicial em um diálogo de fortalecimento político, com o primeiro encontro dos respectivos ministros das Relações Exteriores, durante a 61ª Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU), para tratarem de assuntos de interesses comuns.

Ali se projetava um esforço conjunto que avançaria para um grupo informal, baseado na busca do fortalecimento das relações de interesses comuns. Como prova disso, a partir de 2009, os encontros anuais tornaram-se regulares, desde o primeiro encontro em Yekaterinburg, Rússia.



O BRIC nasce de uma brincadeira de palavras de O’Neill, para se transformar em um bloco que se expande, com a inserção da África do Sul, em 2011 e atrai cada vez mais a atenção de outros atores; aí se encontra uma das grandes indagações atuais: expandir ou não, em curto prazo?

Enquanto isso, aos poucos, assiste-se à criação de várias instituições do bloco, o que inclui o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), o Arranjo Contingente de Reservas (CRA, na sigla em inglês) e a grande possibilidade de criação de uma moeda comum (provisoriamente, chamado “projeto R5” – referente a cada uma das moedas das nações do bloco – real, rublo, rupia, renminbi e rand- , que começa com a letra “R”), algo inédito ao envolver países sem proximidade regional e sem a participação de países centrais.

Crescer economicamente, desenvolver e manter a soberania nacional são as principais prioridades sem, entretanto, definir compromissos legais comuns, em parte devido à “informalidade” do bloco. Há uma grande diversidade nos âmbitos político – econômicos entre os membros, e a obrigatoriedade legal de algumas ações poderia, muitas vezes, engessar os interesses individuais de cada nação. Há resistência a isso, especialmente, sob a ótica da China, que traça outras estratégias.

O maior peso do BRICS é representado pela China, o gigante humilhado do passado renasce após um apagamento no cenário mundial e, hoje, é a segunda economia do mundo, com um PIB estimado em 25 trilhões de dólares e, simultaneamente, percorre seus próprios caminhos, como o Belt and Road Initiative (BRI).



Nesse percurso, colide com Índia, um dos membros do grupo, principalmente, no que se refere aos trechos do BRI que envolvem o Paquistão, antigo rival indiano na disputa de fronteiras na região da Caxemira. Essa é uma das peculiaridades e são elementos que podem comprometer uma maior integração ao longo do tempo.

No próximo encontro (22 a 24 de agosto), na África do Sul, os temas discutidos
deverão colocar em evidência a expansão do bloco (o BRICS-PLUS) e o fortalecimento da proposta de uma moeda comum, algo cada vez mais próximo da realidade do BRICS, uma vez que grande parte dos acordos comerciais entre a China e a Rússia, por exemplo, estão sendo conduzidos em suas respectivas moedas, e o Brasil caminha para o mesmo contexto. Um passo para à frente formalizar a criação de uma moeda própria.

Não há nenhum documento que obrigue o uso do dólar como moeda internacional. O uso recorrente da moeda americana como principal sistema de troca global deve-se mais à hegemonia militar e econômica dos EUA do que à obrigatoriedade. A




desdolarização não ocorrerá da noite para o dia, mas pode vir com o tempo. Moedas são referência, até que deixam de ser.

Quanto ao alargamento do bloco ou o BRIC-PLUS, talvez não seja o momento. Os ganhos podem não ser não expressivos como se espera. Há questões internas claramente conflitantes que podem se agravar como a chegada de novos membros.

Evidentemente, é um motivo de júbilo perceber que há tantos países interessados em um bloco visto, inicialmente, com ceticismo pelo Ocidente. Todavia, enquanto não houver certeza de aonde se quer e como chegar, a cautela deve ser a base.

Para ser grande, nem sempre o tamanho é o principal. Ajustar as metas reais e
possíveis talvez seja mais sensato que simplesmente números inflados. O BRICS
mostrou maturidade em momentos de crise, como aquela de 2008, gerada pelas
forças dominantes que as próprias potências criadoras não tiveram condições de
evitar. Este amadurecimento deve ser o ponto norteador da adesão de novos
integrantes.



Se este alargamento é visto com relutância por parte dos membros originais, é sinal de que algo está fora do lugar. Para a China isso pode significar a aceleração do BRI e a sua maior participação na governança global, mas como ainda há muitas incertezas envolvendo os mecanismos que serão utilizados pelos adversários para evitar a tomada do poder pelo Oriente, ir um pouco mais devagar, fortalecer os laços com os grandes parceiros atuais para na sequência ampliar os passos talvez seja mais recomendado.

Com uma população de mais de 3 bilhões de pessoas, que corresponde a 43% da população mundial e com gigantescas áreas territoriais (três dos cinco maiores países existentes estão no bloco), o BRICS enfrenta grandes desafios internos comuns, como o combate à pobreza e às desigualdades, a redução da poluição, o enfrentamento das mudanças climáticas, os investimentos em inovação e novas tecnologias.

Resolver ou minimizar estes problemas fortalece a imagem externa. O crescimento numérico do bloco com estas desordens pode reduzir o poder geopolítico que se almeja alcançar.

Não se pode desconsiderar também as tensões internas que com regularidade voltam à tona, como as questões fronteiriças entre a China e a Índia e a possibilidade de governos hostis, como ocorreu com a extrema-direita no poder brasileiro nos últimos quatro anos, que se aliou aos EUA e dificultou a integração regional com a China e divergiu com a Rússia em relação à Venezuela, por exemplo.



Outro ponto sensível do BRICS está associado a uma remodelação da Organização das Nações Unidas (ONU), que dê à ONU mais poder de atuação nas decisões globais. 

China e Rússia, membros permanentes, com poder de veto no Conselho de Segurança (CS), expressaram apoio às aspirações do Brasil e da Índia em desempenhar um papel maior na ONU, sem mencionar, entretanto, o apoio formal de ambos à entrada dos parceiros como membros permanentes do CS, o que pode ser interpretado como um descrédito aos aliados.

O bloco possui uma presença transcontinental de alto valor estratégico e de peso econômico global significativo, que pode ser afetado com a adesão de novos membros, com realidades socioeconômicas muito desiguais. Evidentemente, a China, uma das defensoras da ampliação, deve ter em mente os imbróglios que isso pode gerar.

Mas que não se esqueça do que dizia Sun Tzu, na “Arte da Guerra”: nunca se deve atacar com pressa e cólera, mas com a prudência e firmeza de um pequeno número de pessoas se pode chegar a cansar e dominar até grandes exércitos. Talvez seja por aí.