Jornal Estado de Minas

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A Ciência do Empreendedorismo


Muita gente nem imagina que aquelas teorias, livros e cursos que empreendedores de sucesso constroem a partir de suas histórias de sucesso tem um grande contraponto a partir de uma estratégia científica que ganha cada vez mais força.





Estou falando do "Effectuation", algo que se propõe a ser uma ciência do empreendedorismo e pode ser definido como um tipo de raciocínio eficaz, aliado a um conjunto de atitudes para solucionar problemas importantes no mundo dos negócios.

Essa teoria foi desenvolvida a partir de uma pesquisa baseada no comportamento de 27 fundadores de grandes empresas. Algumas de suas premissas são (1) considerar o futuro fundamentalmente imprevisível, mas controlável por meio da ação humana; (2) o ambiente é modelável por escolhas que são feitas no decorrer dos processos; e (3) as metas são pontos negociados constantemente com os stakeholders e não preferências engessadas pré-definidas.

"Effectuation" é uma lógica advinda da habilidade empreendedora, partindo da premissa de que grandes empreendedores não o são por traços genéticos ou de personalidade, aptidão ao risco, ambição ou visão. A pesquisa desenvolvida pela professa Saras Sarasvathy, descobriu que existe uma "ciência" para o empreendedorismo e que grandes empreendedores em todos os setores, países e épocas usam uma lógica comum, ou processo de pensamento, para resolver problemas empresariais. 





E essa lógica pode ser ensinada e utilizada tanto por empreendedores novatos quanto pelos mais experientes na fase inicial altamente imprevisível de um empreendimento, para ampliar possibilidades de sucesso, mas também para reduzir os custos de fracasso, que é uma visão poucas vezes construída por quem empreende.

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O foco principal da pesquisa acadêmica deu-se a partir da contestação de dois caminhos (1) que o empreendedorismo é um traço de personalidade genética ou adquirida ou uma condição psicológica (assunção de risco) e (2) que os empreendedores aproveitam as oportunidades criadas por forças de mercado ineficientes, regulação precária e descobertas científicas aplicadas. Mesmo que a ciência tivesse apoiado essas teorias, em relação ao empreendedorismo si, os autores do estudo reputavam que elas não tinham utilidade prática para o empreendedor que estava iniciando seu negócio, pelo simples fato de tais trajetórias se basearem experiências únicas e individuais, mas sem amparo científico, ou impossíveis de serem universalmente aplicáveis.

A professora Sarasvathy chamou de "lógica eficaz" o oposto dessa "lógica causal" ensinada aos gestores e empreendedores em circunstâncias mais certas (ou previsíveis). Segundo ela, empreendedores especialistas que são a base do "effectuation" acreditam que o futuro é moldado por pessoas e que se puderem fazer o futuro acontecer, não precisam se preocupar em prevê-lo.





Usando o raciocínio causal, o "causation", esse amplamente ensinado por empresários de sucesso em seus cursos e livros, começa-se com um objetivo específico e utiliza-se um determinado conjunto de meios para alcançá-lo. O foco, nesse caso, está em alcançar um objetivo desejado por meio de um conjunto específico de meios dados. O "causation" invoca a busca e a seleção de táticas e é a base da maioria das boas teorias de gestão. Os pensadores causais acreditam que "se posso prever o futuro, posso controlá-lo".

Usando o raciocínio eficaz, base do "effectuation"começa-se apenas com um conjunto de meios e, no processo de operá-los e implantá-los, os objetivos, novos e diferentes, surgem gradualmente. 

Uma boa analogia que a professora Saravasthy utiliza é o ato de cozinhar algo. Se você primeiro escolhe o prato para em seguida providenciar os ingredientes e equipamentos necessários, você está adotando a lógica "causation". Já se você vê o que tem disponível na sua cozinha e usa a criatividade para pensar no que dá pra fazer, você está utilizando a lógica "effectuation". 

Com base na mesma analogia, se você não entende nada de cozinha, qualquer que seja o raciocínio, sua chance de sair algo bom será mais baixa. Vale a mesma conclusão para abrir uma empresa ou lançar um produto.





Os 5 princípios que norteiam a lógica "effectuation"

"Bird in Hand" - Comece com os meios disponíveis e não espere a oportunidade perfeita. Comece a agir, com base no que você tem prontamente disponível: quem você é, o que você sabe e quem você conhece.

"Lemonade" - Alavanque contingências e problemas a seu favor. Abrace as surpresas que surgem de situações incertas, permanecendo flexível em vez de amarrado a metas existentes.

Perda Acessível - Defina a perda acessível pra seu caso e avalie as oportunidades com base na aceitação da desvantagem, em vez da atratividade dos ganhos previstos.

"Crazy-Quilt" - Forme alianças com pessoas e organizações dispostas a assumir um compromisso real de criar conjuntamente o futuro - produto, empresa, mercado - com você. Não se preocupe tanto com análises competitivas e planejamento estratégico.





Os princípios acima tem como base a filosofia de se controlar o controlável e representam diferentes maneiras pelas quais os empreendedores interagem com o ambiente para moldá-lo. É claro que nem tudo pode ser moldado ou controlado, mas o "effectuation" o encoraja, como piloto de seu empreendimento, a se concentrar nos aspectos do ambiente que estão, pelo menos até certo ponto, sob seu controle.

Concluindo, esse não é um processo estático e único, mas algo que deve ser usado à medida que a empresa se desenvolve, desde sua de fase de crescimento inicial, para conquistar clientes iniciais e parceiros comprometidos que, então, criam novos meios e novos objetivos à medida que recursos e pontos de vista são adicionados ao empreendimento.

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