No livro O Retrato de Dorian Gray, o autor Oscar Wilde nos dá um belíssimo exemplo sobre o insaciável desejo de se manter jovem para sempre e a qualquer custo, deixando de lado, muitas vezes, a necessária evolução espiritual. Dorian é alguém que se apaixona perdidamente por si mesmo e por seus atributos físicos, intelectuais e existenciais, não medindo esforços para alcançar tudo aquilo que deseja.
Neste processo de construção de si mesmo, o protagonista não envelhece, mas tão somente o quadro que contém o seu retrato, que deixa transparecer em suas tintas a falta de cores da existência de um Dorian que não busca nada além da satisfação sensorial.
Nossa modernidade líquida, na expressão de Bauman, nos convida todo o tempo a sermos jovens, aprazíveis e, para sempre consumíveis. Todos os aspectos ligados ao envelhecimento são tidos como menores, indesejáveis e dignos de serem camuflados ou até mesmo eliminados, como se a velhice fosse um mal a ser combatido pela Medicina.
A passagem do tempo passou a ser vista como algo que mortifica e nos conduz à dolorosa experiência do morrer contínuo. É como se, a partir de certa idade, nossa grande preocupação devesse ser a de mitigar os efeitos do tempo sobre nosso corpo e nosso espírito.
Somos compelidos a manter a infantil ilusão de que nascimento, envelhecimento e morte não são parte natural do processo humano, como os deuses da antiguidade, que já nasciam adultos e assim permaneciam para todo o sempre. Alimentamos a falsa impressão de que podemos alcançar a vitória contra o tempo; e, nesse afã, não é incomum que a melhor parte de nós mesmos seja ignorada durante o processo.
Envelhecer pode ser visto sob a ótica das perdas, que necessariamente acontecem, e não seríamos ingênuos de as negar; mas também pode nos convidar a navegar em um mar de incertezas, que, no dizer de Russel, nos colocam entre esperanças vivas e receios provocadores. Aprender a viver sem certezas – e não ser paralisado por elas - talvez seja um dos maiores desafios da velhice.
Aceitar a passagem do tempo – e os efeitos dela decorrentes - como algo natural é imperioso para a manutenção da qualidade de vida na velhice. Não recriminamos quem pinta os cabelos, aplica botox ou se preocupa de modo saudável com a aparência - ao contrário, incentivamos isto entre os pacientes que assim desejam fazê-lo. As vezes tais ações se mostram como indicativos de qualidade de vida para alguns pacientes. O que não é recomendável é fazer tais coisas porque a sociedade não aceita que estamos admitindo com coragem a nossa passagem pelo tempo.
Muitas vezes fazer um retiro de ioga, passar o final de semana junto à natureza ou viajar para um lugar desconhecido pode ser tão benéfico para a manutenção do viço da pele quanto uma tarde no dermatologista ou uma intervenção cirúrgica. As vezes o que nos falta não é mais juventude, mas compreensão sobre quem somos e aquilo que ainda desejamos ser: somos humanos e, enquanto tais, sujeitos ao tempo, tanto em suas vicissitudes quanto em suas benesses.
O que pode ser mais gostoso para os apreciadores do que um vinho safra antiga? O que dizer dos relacionamentos longos, cheios de cumplicidade e afeto? Isso para não dizer da alegria de partilharmos nosso tempo com nossos avós que, já repletos de sabedoria, podem nos aconselhar de modo muito mais amoroso que vinte amigos juntos.
É necessário que aprendamos o mais breve possível que belas não são apenas as formas físicas da juventude. Elas, sem dúvida são belas. Mas, em nossa opinião, há mais beleza em um rosto enrugado sábio do que em uma classe inteira do colegial. Não há nada mais belo que um rosto sábio!
A história que começamos a contar no início termina com o protagonista destruindo o quadro que lhe garantia a juventude eterna. Ele compreende que muitas das dores que havia sofrido eram decorrentes daquele presente que, ao final, se mostrou uma maldição. Manter a juventude a qualquer preço é maldição e não aceitarmos a passagem do tempo pode ser nossa ruína rumo à construção de nós mesmos.