O Brasil já foi exemplo mundial quando o tema era controle de doenças por meio de vacinação pública, gratuita e eficiente. Tínhamos um modelo descentralizado, capilarizado, estimulado pelos médicos e pelo poder público, que atingia grande parcela da população, em todas as idades. No entanto, temos assistido nos últimos tempos, uma acentuada diminuição da quantidade de pessoas que se vacinam. Muitas delas, inspiradas por um discurso anticientífico, passaram a acreditar que as vacinas são perigosas e representam um risco para a humanidade. Nada poderia ser mais inverídico.
Há descritos de que os orientais que viviam cerca de mil anos antes de Cristo perfuravam a pele de uma pessoa sã com uma agulha impregnada de secreção de ferimentos de um paciente acometido pela varíola. No século X há o relato de outra experiência, desta vez praticada por chineses, que retiravam as cascas das feridas ocasionadas pela varíola, as transformavam em pó e o davam para que as pessoas aspirassem, em um método conhecido como variolação.
O embasamento da imunização a partir de vacinas surgiu em maio de 1796, quando o médico britânico Edward Jenner, decidiu inocular em uma criança de oito anos o pus extraído das bolhas das mãos de uma leiteira que havia adquirido varíola bovina. A decisão decorreu do fato de o pesquisador ter observado que os bois também eram vítimas da varíola, todavia, em uma versão mais branda, e que as pessoas que trabalhavam na ordenha não contraiam a doença. O menino teve um pouco de febre, mas não a doença e assim foi descoberta a vacina.
Com o advento das vacinas houve uma importante modificação nas causas de morte, onde as doenças causadas por microrganismos foram paulatinamente sendo substituídas pelas doenças crônicas e degenerativas, que somadas à redução da taxa de natalidade, permitiram o aumento substancial da expectativa de vida e modificações na pirâmide etária da população.
Cada vez mais a população envelhece, com aumento dos idosos e diminuição proporcional do número de jovens. Assim, inegável que a vacinação se constituiu numa das maiores vitórias de medicina nos últimos séculos. Não há que se falar em nenhuma atitude médica que proteja mais a saúde de uma população que a adequada cobertura vacinal.
Foi Pasteur o responsável pela propagação do termo vacina, assim denominando a injeção imunizadora para prevenir doenças. O cientista havia descoberto que era possível produzir vacinas a partir de microrganismos, como vírus e bactéria. O que Pasteur e os demais cientistas descobriram era algo relativamente simples, mas que foi responsável pela nossa sobrevivência: administrar uma forma atenuada do agente infeccioso conduzia o organismo a produzir defesas naturais contra esse mesmo agente.
Assim, o que assistimos no século passado foi uma vertiginosa diminuição na quantidade de pessoas afetadas por estas doenças, muitas delas, antes letais, agora passaram a ser evitadas por meio da imunização em massa. Muitas doenças, como a poliomielite, foram erradicadas, tudo em razão das eficientes campanhas de vacinação. Segundo um estudo publicado no jornal The Lancet, a vacinação reduziu em 45% as mortes causadas por doenças infecciosas.
Conforme anteriormente citado, o século XX assistiu a um vertiginoso aumento no número de vacinas, as quais utilizam vírus atenuados ou inativos. Assim, descobertas de vacinas para febre amarela, sarampo, caxumba, rubéola, rotavírus ou poliomielite diminuíram a incidência de tais doenças no mundo. A partir da década de 80, com o avanço das tecnologias sobre DNA, foram descobertas vacinas como a Hepatite B, a Papilovírus humano e a influenza, além da tão comemorada vacina contra o Coronavírus, vacina esta que impediu a disseminação do vírus, ao custo de milhões de vidas em todo o planeta.
Somente em nosso país foram ceifadas mais de 670.000 vidas em função deste agente etiológico e este número seria muito maior caso a vacina não tivesse sido administrada na população. Sem sombra de dúvidas esta vacina limitou a devastação sofrida pela humanidade nos últimos dois anos.
Interessante ressaltar que estas formulações vacinais, como a vacina da Pfizer, não têm em sua os vírus e sim porções do seu código genético, sendo muito seguras, conforme exaustivamente comprovado pela ciência mundial. Algumas reações adversas, efeitos colaterais e complicações podem ocorrer em um número ínfimo de pessoas, como em qualquer tratamento médico, seja preventivo ou curativo. O risco de complicações pelas complicações da infecção do vírus SARS-Cov 19 superam, em muito, qualquer inconveniente ocasionado pela vacina.
No entanto, parece que as pessoas do século XXI se esqueceram do passado, quando uma infinidade de doenças ceifava a vida de milhares pessoas ao redor do mundo. Um discurso enviesado e ideológico ameaça o que anos de políticas públicas em saúde fizeram pelo controle das doenças infecciosas.
Além de um caso de suspeita de Poliomielite noticiado no Estado do Pará nesse ano, a volta de doenças como o Sarampo, erradicado no Brasil em 2016, mostra o tamanho do problema que estamos enfrentando. Jovens mães estão deliberadamente deixando de vacinar seus filhos com medo de que efeitos colaterais não esperados possam fazer mal a seus bebês. Efeitos colaterais estes que nem de longe se mostram na realidade, mas tão-somente na fértil imaginação daqueles que deixaram de lado a ciência em nome da fé cega em discursos ideológicos.
Ressalte-se que vacinação é importante em todas as idades e o calendário vacinal abrange pessoas de todas as faixas etárias, sendo muito importante aos mais idosos a atenção às doenças em que as vacinas são utilizadas em todas as idades e naquelas em que a população madura tenha indicação, como as vacinas contra Gripe (Influenza), Pneumonias bacterianas, Herpes Zoster (indicada acima de 50 anos). Atentar para um calendário vacinal em dia indubitavelmente previne doenças e suas complicações.
Importante esclarecer, no caso da vacinação antigripal que ela previne as complicações da infecção pelo vírus da Influenza e não os resfriados comuns. É uma vacina segura, mundialmente reconhecida como efetiva e que deve ser estimulada para todos os gerontes. Como o vírus sofre mutações frequentes, a mesma deverá ser repetida anualmente, conforme são coletadas partículas virais em todo o planeta e uma nova vacina é desenvolvida, anualmente, com objetivo de aprimorar a proteção dos usuários.
Assim, fica evidente que esta grande conquista da medicina deve ser oferecida e utilizada por todos. Esta grande conquista da saúde pública brasileira não pode ser perdida, com risco de recrudescência de várias doenças até então erradicadas. Esta grande conquista da humanidade não pode ser prejudicada por campanhas difamatórias e sem qualquer fundamentação científica.
As vacinas são, indubitavelmente, a melhor proteção que podemos nos utilizar para mantermos a saúde individual e coletiva em melhores patamares. A vacinação pública deve voltar aos seus patamares anteriores com boa cobertura vacinal. Este tópico elevou o Brasil à condição de modelo de imunização. Importante que nosso país não perca este posto, afinal, vacinação é vida.