Jornal Estado de Minas

VITALidade

O aumento da contaminação pelo HIV na população idosa

Ao contrário do que muita gente imagina, o carnaval não tem sua origem na África. Ele veio desembarcado diretamente da Europa para as ruas brasileiras no século XVII, mas ganhou corpo mesmo a partir do século XX, quando os escravos, em sua maioria, ocupavam as ruas com os rostos pintados, jogando bolinhas de farinha nas pessoas que passavam, tocando seus tambores e relembrando os tempos de alegrias vivenciados em sua terra natal.



Inicialmente a festa era tipicamente popular e não contava com a participação das classes mais abastadas, que viam na brincadeira de jogar bolinhas algo ofensivo. 

Com o passar do tempo a festa se tornou mais democrática, com as marchinhas de carnaval dominando as paradas musicais e maior participação de outras classes sociais, contagiando várias esferas da sociedade com a sua alegria. O que dizer dos bailes do início do século passado no Rio de Janeiro? Eram verdadeiros eventos culturais a reunir a elite carioca para comemorar os dias de folia. Rapidamente nosso país sucumbiu à alegria da festa. 

O certo é que o carnaval chegou e muitos de nós comemoram a data com alegria, disposição e entusiasmo. Afinal, é um período em que, geralmente, estamos mais abertos para os deleites sensoriais. Não é incomum que o carnaval esteja associado à uma festa da carne, relacionada aos prazeres, talvez por ser este um período que antecede uma época de penitência cristã, que é a quaresma.

A etimologia da palavra também a liga à noção de prazer, pois oriunda de carnis valles, que significa, literalmente, prazeres da carne.  

O prazer é algo que deve ser vivido e desfrutado pelas pessoas maduras, e isto sem culpa. Tendo em vista que os novos idosos de hoje têm uma qualidade de vida muito superior que seus antepassados e que medicamentos para disfunção erétil tornaram a vida sexual dos idosos mais ativa, um fenômeno vem sendo percebido pelos profissionais de saúde, que é o aumento dos casos de HIV na população acima dos cinquenta anos.





A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida, surgida na década de 80, ataca o sistema imunológico, notadamente as células responsáveis pela defesa do organismo e pode acarretar uma série de infecções oportunistas e doenças. O vírus é transmitido por meio de contato com fluidos corporais, tais como sêmen, secreções vaginais e leite materno.

Uma questão de suma importância é diferenciar o portador do HIV, daquele que já desenvolveu a doença. Enquanto o primeiro é apenas portador da doença (soropositivo), o segundo já desenvolveu o quadro associado a AIDS, com suas doenças oportunistas, pois seu sistema de defesa imunológico já se encontra muito debilitado.

Nos primeiros cinco anos de existência do vírus foram registrados apenas quatro casos de HIV em pessoas idosas, no entanto, o aumento no número de casos na população cinquenta mais aumentou consideravelmente nos últimos anos. Em 2000 as pessoas com mais de cinquenta anos diagnosticadas com HIV eram de 8,64%, nos anos 2010 esse percentual pulou para vertiginosos 17,23%.



Dados do Boletim HIV/Aids de 2018 mostraram que houve um incremento de 21,2% entre os anos de 2007 e 2017 nos casos de contágio de mulheres acima dos 60 anos.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde, se os casos continuarem no atual patamar de crescimento, em 2030, 70% da população mundial com sessenta anos ou mais será portadora do vírus.

Quando o assunto é HIV, não é incomum vermos publicidade, principalmente nessa época de carnaval, voltada para os jovens, contudo, pouco ou nada é dito sobre o risco da doença na população idosa. No livro Sexo e Aids depois dos 50, o autor afirma que os idosos acreditam que as vítimas do HIV são apenas os jovens e que, de alguma forma, estariam protegidos do contágio, o que demonstra a necessidade de que políticas públicas de esclarecimento sejam adotadas em relação a esta população. 

Mas não bastam apenas políticas de orientação é também preciso que as pessoas maduras façam adesão aos métodos de proteção, como os preservativos. Estudos demonstram que as mulheres se sentem constrangidas em pedir a seus parceiros mais velhos o uso do preservativo, já que muitos são refratários ao seu uso. Tal situação, tão comum, não deveria ser, principalmente para uma geração que viu o nascimento do HIV e as consequências físicas e emocionais da contaminação. 





Como dito, as políticas públicas são bem-vindas, mas o maior esforço deve ser feito pelas pessoas maduras, que precisam compreender sua responsabilidade em evitar a propagação do vírus que, na população idosa, tem desdobramentos ainda mais cruéis que nas pessoas mais jovens. 

Além de todas as consequências universalmente conhecidas do HIV, inúmeras pesquisas demonstram que a presença do vírus acelera o processo de envelhecimento e que doenças comuns apenas em idades mais avançadas, podem se apresentar mais cedo para o portador do HIV.

Inevitavelmente o processo de envelhecer diminui as reservas fisiológicas, mas quando este envelhecimento é acompanhado da infecção pelo HIV, a susceptibilidade de desenvolver várias doenças aumenta exponencialmente.

A contaminação pelo vírus HIV, a despeito da presença de medicamentos capazes de mitigar suas consequências imediatas, deve ser evitada e, para tanto, os novos idosos, sexualmente ativos, precisam se conscientizar sobre a importância do uso de preservativos e do diagnóstico precoce. Aproveitemos o carnaval com responsabilidade e autocuidado.